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Da habitação e alimentação fornecidas aos empregados rurais e suas naturezas

Um dos pedidos habitualmente constantes das reclamatórias trabalhistas propostas por empregados rurais, diz respeito à consideração como salário “in natura” da habitação e da alimentação fornecidas pelas empresas rurais a seus empregados.

3/2/2004

 

Da habitação e alimentação fornecidas aos empregados rurais e suas naturezas

 

Ligia Maria Barata Silva Brasil*

 

Um dos pedidos habitualmente constantes das reclamatórias trabalhistas propostas por empregados rurais, diz respeito à consideração como salário “in natura” da habitação e da alimentação fornecidas pelas empresas rurais a seus empregados.

 

Pela própria natureza da atividade exercida (agropecuária) é natural que as empresas sejam obrigadas a fornecerem habitação e alimentação a seus empregados.

 

Isto é facilmente constatado, visto que empresas que atuam no setor primário, mais especificamente aquelas cujas as atividades estão relacionadas com agricultura e pecuária, se localizam em áreas rurais, longe dos grandes centros urbanos, sendo necessário para a prestação do labor o fornecimento de moradia e alimentação.

 

Ocorre que até pouco tempo, muitos dos julgadores entendiam possuírem tais parcelas caráter salarial, configurando desta forma salário “in natura” refletindo, conseqüentemente, nas demais parcelas percebidas pelo obreiro durante a contratualidade.

 

Atualmente, com o avanço das relações de trabalho e do próprio poder Judiciário Trabalhista, esta Justiça Especializada consagrou o entendimento de que aquelas parcelas fornecidas pelo empregador, no caso rural, necessárias para a realização da atividade laboral por parte do empregado, não se configuram parcelas salariais, não restando enquadradas na previsão contida no artigo 458 da CLT. É o chamado Princípio da Instrumentalidade, ou seja, as parcelas fornecidas para o trabalhador rural, necessárias ao seu trabalho como instrumento deste, não se tratam de parcelas salariais. Necessário fazer a diferenciação entre as parcelas fornecidas pelo empregador para o trabalho do obreiro, que é o caso da habitação e da alimentação fornecidas para o empregado rural, daquelas pagas pelo trabalho prestado. Estas sim possuem natureza salarial.

 

Segundo clássica lição de Martins Catharino, em tese poder-se-á aplicar a seguinte regra para se descobrir quando a utilidade é salário: toda vez que seja meio necessária e indispensável para determinada prestação de trabalho subordinado a resposta será negativa; será afirmativa quando a utilidade é fornecida pelo serviço prestado, típica contraprestação( in Tratado Jurídico do salário, LTR, ed fac-similada , pág171).

 

O Colendo Tribunal Superior do Trabalho, através de sua Seção de Dissídios Individuais I, editou a Orientação Jurisprudencial de nº 131, pacificando o entendimento exposto acima. Diz tal Orientação Jurisprudencial: “a habitação e a energia elétrica fornecidas pelo empregador ao empregado, quando indispensáveis para realização do trabalho, não têm natureza salarial”.

 

Finalmente, vale esclarecer que cabe ao empregado quando em litígio provar não serem as parcelas habitação e alimentação necessárias à prestação laboral. Neste sentido, vale aqui transcrever parte de sentença prolatada pelo renomado Julgador Dr. Ricardo Gehling (Proc. 00982.721/97-8 da M.M Vara do Trabalho de Cachoeira do Sul), Juiz Titular da Vara de Cachoeira do Sul e hoje atuando no Egrégio TRT da 4ª Região , quando diz: “Controvertido o direito à postulação epigrafada, a prova oral confortou o articulado na contestação. Não se desincumbindo o reclamante de seu ônus probatório, é sucumbente na respectiva pretensão. Ineludivelmente, referendaram as testemunhas que não havia outra forma de os empregados se alimentarem a não ser na própria fazenda. Por outro lado, confessou expressamente o Reclamante que as propriedades distavam cerca de 50 Km da cidade (depoimento da fl. 165).

 

Ademais, o fato de ter recebido alimentação e habitação, conforme confessado pela ré, enquanto trabalhou afastado de sua moradia, não caracteriza salário “ in natura”, porquanto a utilidade fornecida ao trabalhador rural constitui, até prova em contrário (que não houve no presente caso), condição para o exercício do trabalho e não salário in natura – contraprestação pelo serviço.”

 

Assim, resta inequívoco que a habitação e a alimentação fornecidas gratuitamente aos trabalhadores rurais, diante de seu aspecto meramente instrumental, não possuem natureza salarial.

 

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* Advoogada do escritório Siqueira Castro Advogados

 

 

 

 

 

 

 

 

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