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Poder diretivo do empregador: autorizada a exigência de comprovante de vacinação e a dispensa do trabalhador

A exigência de vacinação não é equiparável às práticas discriminatórias em razão do sexo, origem, raça etc., como fez a portaria, uma vez que se volta à proteção da saúde e da vida dos demais empregados e do público em geral.

23/11/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Na última sexta-feira, dia 12 de novembro de 2021, como era esperado, o STF suspendeu liminarmente dispositivos da Portaria MTP 620/21 que proibia ao empregador exigir do trabalhador qualquer documento discriminatório e, em especial, comprovante de vacinação, considerando como prática discriminatória a obrigatoriedade de apresentação de certificado de vacinação, assim como a demissão por justa causa de empregado em razão da sua recusa.

A decisão ocorreu em sede de 4 (quatro) arguições de descumprimento de preceito fundamental ("ADPFs") ajuizadas pela Rede de Sustentabilidade, pelo Partido Socialista Brasileiro, pelo Partido dos Trabalhadores e pelo Partido Novo.

Em seu voto, o ministro Roberto Barroso afirmou que a exigência de vacinação não é equiparável às práticas discriminatórias em razão do sexo, origem, raça etc., como fez a portaria, uma vez que se volta à proteção da saúde e da vida dos demais empregados e do público em geral.

Lembrou que o STF já havia considerado legítima a vacinação compulsória, não pela sua aplicação forçada, mas pela adoção de medidas de coerção indiretas.

Ressaltou, também, que é da natureza das relações de trabalho o poder de direção do empregador e a subordinação jurídica do empregado, sendo que o descumprimento, por parte do empregado, de determinação legítima do empregador configura justa causa para a rescisão do contrato de trabalho, enfatizando que constitui direito dos empregados e dever do empregador a garantia de um ambiente de trabalho seguro e saudável.

Nesse contexto, o ministro entendeu que ato infralegal, como é o caso da portaria, não é instrumento apto a inovar na ordem jurídica, criando direitos e obrigações trabalhistas, tampouco podendo limitar o sentido e o alcance de normas constitucionais.

De forma semelhante, logo após a publicação da portaria, o ministério Público do Trabalho já havia divulgado nota técnica instando aos empregadores, em geral, e à administração pública que procedessem à exigência da comprovação de vacinação de seus trabalhadores e trabalhadores (observado o esquema vacinal aplicável e o cronograma vigente) e de quaisquer outras pessoas (como prestadores de serviços, estagiários etc.) como condição para ingresso no meio ambiente laboral.

De fato, como havíamos mencionado em publicação anterior, inegável que a portaria viola o poder diretivo do empregador e prestigia o interesse individual em detrimento do interesse coletivo, chocando-se, na sua literalidade, com o texto da Constituição Federal ("CF"), ultrapassando ainda os limites da própria lei em ofensa ao princípio da reserva legal.

Ademais, as pesquisas realizadas indicam e demonstram que a vacinação é medida essencial para reduzir o contágio por covid-19, a fim de minimizar a carga viral e assegurar maior resiliência aos infectados, como bem lembrou o ministro Barroso em seu voto.

Portanto, com o pronunciamento do STF sobre o tema, ainda que em sede liminar, aliado às diretrizes emanadas pelo MPT, restabelece-se a segurança jurídica nas relações de trabalho, prestigiando-se a saúde e o interesse da coletividade.

Assim, empregadores poderão garantir um meio ambiente laboral seguro e sadio, mediante incentivo à vacinação, conscientizando seus empregados da importância da vacina.

Recomenda-se, outrossim, que o poder de rescindir o contrato de trabalho pelo empregador seja exercido com moderação, razoabilidade e proporcionalidade, valendo lembrar da ressalva quanto às que têm expressa contraindicação médica em relação à vacina para as quais deve ser admitida a testagem periódica como alternativa.

Paula Corina Santone
Sócia da área trabalhista do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados.

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