O Conselho Nacional de Justiça regulamentou a resolução de conflitos através da Resolução n. 125, de 29 nov. 2010, criando vários meios e mecanismos para implementação nas justiças da União e dos Estados.
Deve-se sempre resguardar o acesso à justiça, pois:
“[...] o respeito aos direitos e garantias fundamentais é a base de sustentação do ordenamento jurídico-constitucional, condição primordial para a existência do Estado Democrático de Direito, daí porque é possível considera-los o oxigênio das Constituições Democráticas” (ORSINI, 2018, p. 125)
A Constituição Federal, em seu artigo 98, inciso I, já previa a criação, pela União e Estados dos:
“[...] juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo , permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau” (BRASIL, 1988)
Por sua vez, a emenda 45/2004, também denominada “Reforma do Judiciário”, foi inserida no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal: “[...] a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 1988).
Nesta vertente, o artigo 4º do Código de Processo Civil: “[...] Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa” (BRASIL, 2015).
Não se pode olvidar do artigo 3º, §§ 2º e 3º:
“[...] § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (BRASIL, 2015)
Neste vértice, a demora judicial para a solução de um feito, acaba por desvelar uma dificuldade em se realizar justiça, trazendo inefetividade ao meio processual adequado para resolver as celeumas da vida cotidiana. Deveras:
“[...] O reconhecimento de um direito subjetivo a um processo célere – ou com duração razoável – impõe ao Poder Público em geral e ao Poder Judiciário, em particular, a adoção de medidas destinadas a realizar esse objetivo. Nesse cenário, abre-se um campo destinado ao planejamento, controle e fiscalização de políticas públicas de prestação jurisdicional que dizem respeito à própria legitimidade de intervenções estatais que importem, ao menos potencialmente, lesão ou ameaça a direitos fundamentais” (MENDES, 2015, p. 405)
Tanto é que: “[...] o Código de Processo Civil/2015 que consagra, em seu artigo 4º, o direito à razoável duração do processo, além de apresentar, em diversos dispositivos, disciplina para a utilização de meios eletrônicos e a prática eletrônica de atos processuais (artigos 193 a 199)” (MASSON, 2020, p. 374). Não sem motivo que:
“[...] O direito fundamental à duração razoável do processo constitui princípio redigido como cláusula geral. Ele impõe um estado de coisas que deve ser promovido pelo Estado – a duração razoável do processo. Ele prevê no seu suporte fático termo indeterminado – duração razoável –, e não comina consequências jurídicas ao seu não atendimento... O que a Constituição determina é a eliminação do tempo patológico – a desproporcionalidade entre duração do processo e a complexidade do debate da causa que nele tem lugar. Nesse sentido, a expressão processo sem dilações indevidas, utilizada pela Constituição espanhola (art. 24, segunda parte), é assaz expressiva. O direito ao processo justo implica sua duração em tempo justo” (SARLET, 2020, p. 897-898).
Deve existir, portanto, proporcionalidade entre o tempo para julgamento, e a própria complexidade do feito, sob pena de se causar injustiça, seja pela rapidez indevida num processo que demandaria tempo para seu entendimento completo; seja pela demora de um processo extremamente simples para julgamento.
Vieram, então, para o nosso direito pátrio, os meios alternativos de solução de conflito, tanto pelo CEJUSC, quanto pelas serventias extrajudiciais, para fins de mitigar as mazelas de um sistema processual que, em regra, é demorado e de alto custo ao cidadão.
Na mediação judicial há um regramento específico que a difere, e muito, da modalidade extrajudicial. As disposições do Código de Processo Civil, por exemplo, regulamentam quase que exclusivamente este tipo de procedimento nos feitos cíveis.
Sob a sistemática desta mediação, o mediador ao invés de ser um terceiro eleito pelas partes oponentes, é na verdade um auxiliar do juízo, conforme art. 149 do Código de Processo Civil.
Neste tipo de procedimento, caso as partes tenham interesse na realização da mediação, elas deverão informar ao juiz sua intenção, o qual, por sua vez, as remeterá para o Centro de Solução de Conflito do Tribunal de Justiça em que tramita o litígio.
No CEJUSC as partes deverão ser assistidas por um mediador cadastrado perante o Tribunal de Justiça a ser designado por mecanismo interno de sorteio. Portanto, uma das primeiras diferenças na mediação judicial para a extrajudicial é que as partes possuem menor ingerência acerca da escolha do mediador que lhes irá auxiliar. Importante mencionar:
“[...] Entre os métodos que podem ser escolhidos pelo cidadão, encontra-se a mediação de conflitos, que pode ser definida como um processo em que um terceiro imparcial e independente coordena reuniões separadas ou conjuntas com as pessoas envolvidas em conflitos, sejam elas físicas ou jurídicas, com o objetivo de promover uma reflexão sobre a inter-relação existente, a fim de alcançar uma solução, que atenda a todos os envolvidos. E como solução quase sempre resulta no cumprimento espontâneo das obrigações nela assumidas” (SALLES, 2020, p. 149)
Além disso, na mediação judicial é obrigatório que ambas as partes estejam assistidas, quer seja por advogado ou defensor público – os quais assistirão aqueles que devidamente comprovarem sua falta de recursos. A lei estabelece que a mediação judicial tenha duração de 60 (sessenta) dias, podendo as partes requerer a prorrogação deste prazo.
De outro giro, para o exercício da função de mediador judicial tem de ser graduado há pelo menos dois anos em curso de ensino superior de instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e que tenha obtido capacitação em escola ou instituição de formação de mediadores, reconhecida pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – Enfam ou pelos tribunais, observados os requisitos mínimos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça.
Por fim, caso o conflito seja solucionado por mediação antes da citação do réu, não serão devidas custas judiciais finais.
Já a mediação extrajudicial, por óbvio, ocorre antes da instauração de um processo judicial ou até mesmo incidentalmente a um processo arbitral previamente instalado. Neste tipo de mediação poderá atuar como mediador qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja capacitada para fazer mediação, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação, ou nele inscrever-se.
Assim, percebe-se que não há impedimento para que funcionário público, por exemplo, atue como mediador extrajudicial. Nesta modalidade de mediação as partes poderão ser assistidas por advogado ou defensor público, contudo, é imperioso ressaltar que caso nem todas as partes estejam assistidas por advogado ou defensor, deverá o mediador eleito suspender o procedimento, até que todas estejam devidamente assistidas.
Dada a capilaridade de tais atividades, as serventias notariais e registrais deverão, também, adotar as técnicas de conciliação e mediação em todos os seus afazeres, como rotina básica de seus trabalhos, trazendo maior efetividade aos cidadãos.
De outro giro, o Sistema Multiportas é uma forma de aplicar os meios alternativos de resolução de conflitos entre as partes em conflito, sendo que elas têm à sua disposição variadas formas de estabelecerem acordos autonomamente, ou com a intervenção direta e decisiva de um terceiro, ou seja, mediação, conciliação e arbitragem. Esta é uma importante ferramenta para o poder judiciário brasileiro, bem como um sistema que auxilia todos em sua busca pela prestação eficiente da paz social. Imperioso ressaltar que na justiça multiportas:
“[...] Nesta nova justiça, a solução judicial deixa de ter a primazia nos litígios que permitem a autocomposição e passa a ser ultima ratio, extrema ratio. Assim, do acesso à justiça dos tribunais passamos ao acesso aos direitos pela via adequada de composição, da mesma forma que, no campo do processo, migramos da tutela processual, como fim em si mesmo, para a tutela dos direitos, como finalidade do processo. A doutrina reafirma esta mudança, que significa, além da necessidade de adequação da justiça, a emergência da atipicidade dos meios de solução de conflitos: “o direito de acesso ao Direito, pilar fundamental do Estado de Direito, vem sofrendo profundas transformações.
Deixou de ser um direito de acesso ao Direito através do direito de acesso aos tribunais para passar a ser um direito de acesso ao direito, de preferência sem contato ou sem passagem pelos tribunais [...] Agora, o direito de acesso aos tribunais é um direito de retaguarda, sendo seu exercício legítimo antecedido de uma série de filtros” (DIDIER, 2016)
Torna-se um desafio educacional ou de formação é duplo, pois é necessário preparar os operadores jurídicos desde a faculdade e é indispensável, de imediato, educar os operadores jurídicos e treinar e capacitar adequadamente os mediadores e conciliadores para que desenvolvam o seu mister.
Neste viés, o sistema multiportas pode ajudar a solucionar muitos casos perante o próprio Poder Judiciário, mas há necessidade da mudança de cultura entre os profissionais do direito e os próprios cidadãos:
“[...] Todos têm, hoje, plena consciência da grave crise que afeta a nossa Justiça, em termos principalmente de morosidade, efetividade e adequação de suas soluções.
Estamos, mais do que nunca, convencidos de que, entre as várias causas dessa crise, que são inúmeras, uma delas é a adoção pelo nosso Judiciário, com quase exclusividade em todo o país, do método adjudicatório para a resolução dos conflitos a ele encaminhados, vale dizer, solução dada autoritativamente, por meio de sentença, pela autoridade estatal, que é o juiz.
A mentalidade predominante, não somente entre os profissionais do direito, como também entre os próprios jurisdicionados, é a que vê na sentença a forma mais sublime e correta de se fazer justiça, considerando os chamados meios alternativos de solução de conflitos – como mediação, conciliação, arbitragem e outros – formas atrasadas e próprios de povos pouco civilizados” (ALMEIDA, 2012, p. 87)
Torna-se, assim, imprescindível reformular tal mentalidade e precipuamente adequar a grade curricular das faculdades de direito, pois são raras as que oferecem as disciplinas relativas aos meios adequados de resolução de disputas como parte de suas grades curriculares. Em tal ensino deve-se incentivar os valores, técnicas e habilidades da negociação, diretamente ou com o apoio de mediadores e conciliadores, e dos fundamentos do instituto da arbitragem, já que isto é uma lacuna dos cursos jurídicos nacionais.
Os meios alternativos de solução de conflitos, precipuamente a mediação, tornaram-se uma forma de melhorar e trazer eficiência na resolução de disputas deve estar em oferecer um melhor sistema de justiça civil e penal, uma justiça consensual, ampla e complexa. Deve ser analisado caso a caso, tanto na esfera judicial, quanto extrajudicial, pois um sistema de Justiça deve ser importante para resolver rapidamente as demandas sociais e a complexidade envolvida em cada conflito e oferecer alternativas de tratamento, de maneira célere e eficaz. Os meios adequados de resolução de disputa não são uma completa solução para os problemas do processo judicial ou situações extrajudiciais, são uma complementação do sistema de justiça, trazendo paz social.
Neste viés, como forma de se adequar ao princípio constitucional da duração razoável do processo, mister que todos os operadores do direito, na medida do possível, em casos concretos, apliquem os métodos alternativos da resolução de conflitos, seja na esfera judicial, seja na extrajudicial, concretizando a mens legis do constituinte originário.
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Almeida, RA; Almeida, T; Crespo, MH. Tribunal Multiportas: investindo no capital social para maximizar o sistema de solução de conflitos no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2012.
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_______, Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 125, de 29 nov. 2010. Disponível em www.cnj.jus.br. Acesso em 21 set. 2021.
_______, Lei 13.140, de 26 jun 2015. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em 21 set. 2021.
_______, Conselho Nacional de Justiça. Provimento n. 67, de 26 mar. 2018. Disponível em: www.cnj.jus.br. Acesso em 21 set. 2021.
Didier, FJ; Zanetti, HJ. Justiça multiportas e tutela constitucional adequada: autocomposição em direitos coletivos. Civil Procedure Review, v.7, n.3: 59-99, sept.-dec., 2016
Gabbay, DM. Mediação & judiciário no Brasil e nos EUA: condições, desafios e limites para a institucionalização da mediação no judiciário. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013.
Mancuso, RC. A resolução dos conflitos e a função judicial no contemporâneo estado de direito – 3 ed. ver. ampl. e atual. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020.
Mendes, G; Branco, PGG. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
Orsini, AGS; Alves, LS. Reflexões acerca do acesso à justiça pela via dos direitos – Belo Horizonte: Editora D’ Plácido, 2018.
Pinho, HDB. A mediação como ferramenta de pacificação de conflitos. Revista dos Tribunais - vol. 975/2017, p. 309 – 333, Jan 2017
Salles, CAS; Lorencini, MAGL; Silva, PEA. Negociação, mediação, conciliação e arbitragem: curso de métodos adequados de solução de controvérsias – 3 ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.