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Do correto valor da ação em ações pleiteando remédios oncológicos

O presente artigo trata do valor da causa em demandas em face de plano de saúde, pleiteando custeio de medicamentos oncológicos, mas a análise aqui discorrida pode ser aplicada a inúmeras outras situações.

9/9/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O presente artigo trata do valor da causa em demandas em face de plano de saúde, pleiteando custeio de medicamentos oncológicos, mas a análise aqui discorrida pode ser aplicada a inúmeras outras situações.

A organização do Judiciário no Brasil entendeu que: (i) as ações possuem um valor econômico; (ii) que esse valor será sustentado pela parte que perder a ação, como forma de evitar aventuras jurídicas que abarrotam o judiciário.

Assim, o valor da causa não é um número qualquer, arbitrário. O seu valor irá influenciar principalmente no montante das custas iniciais (em São Paulo 1% do valor da ação), da apelação (4% em São Paulo) e na sucumbência (entre 10% e 20%). Desse modo, por cima, a parte que perde a ação terá de arcar com 11% numa ação sem recurso e 15% com recurso (sem contar sucumbência recursal) – estipulando-se o mínimo de sucumbência.

Esse alto valor de custas evita uma inundação de ações. Caso não houvesse custas e despesas processuais, seria mais vantagem para as partes descumprirem a lei e postergarem o pagamento, protelando uma ação. Com os custos, a ideia é que fique mais barato agir corretamente e reduza o número de ações propostas.

Pois bem, desse modo, instituiu o CPC um título próprio destinado apenas para prever como se estabelecer o valor da causa. Uma vez que o legislador se preocupou em regular tal matéria, nos parece razoável que as partes e os juízes sem preocupem em cumpri-la, já que a lei não é um conselho e sim um mandamento.

Pela leitura da lei, fica claro que o valor da causa será o valor do proveito econômico da demanda, o valor que se pretende ganhar ou ressarcir com a ação. Se a ação versar a respeito de um carro de R$ 100.000,00 o valor da causa será R$ 100.000,00, se a demanda for a respeito de um dano de R$ 5.000,00 a esse carro, o valor da causa será de R$ 5.000,00 e assim por diante.

Sendo assim, qual o valor nas causas que envolvem pedido de fornecimento de tratamento médico – especialmente medicamento – para câncer? O valor, se não for prestação continuada, será o valor do medicamento. Se se pleiteia 6 meses de medicamentos que custam R$ 200.000,00, o valor da ação será exatamente R$ 200.000,00 (isso deveria ser bem óbvio!)

O valor da ação não é genérico, é o preço que se paga pelo remédio que se pleiteia. Há um claro proveito econômico em se requerer medicamento. Se a demanda versa sobre a entrega de bens, com valor de mercado, vendidos na farmácia, seu valor é o proveito. Não estamos falando de algo abstrato, são caixas de remédio vendidas nas farmácias por um dado valor. Se a parte perder a ação ela terá que comprar o medicamento? Sim! Então o proveito econômico é o valor desses medicamentos que ela não quer ter de comprar.

Não há o menor sentido em se arbitrar um valor genérico de R$ 1.000,00 se o remédio custa R$ 50.000,00. Lógico que fica mais difícil suportar as custas (e pode-se até dizer que o advogado quer valor alto para ganhar mais sucumbência), mas acima de tudo, é de rigor seguir a lei e não pensar que ela é vantajosa pro advogado ou que encarece o custo da demanda. Isso são apenas consequências, que não podem ser postas na balança de uma norma (regra) clara e objetiva.

Se alguém não concorda com a lei que pleiteia sua alteração de maneira democrática, por meio de reforma legislativa, nunca por meio de decisão contra legem por parecer mais “justo” ou “razoável”.

E mais, digamos que o medicamento custe R$ 50.000,00 e o valor da causa fique em R$ 1.000,00. O juiz concede tutela, todo tratamento é realizado e a sentença é de improcedência, entendendo que o plano não precisava fornecer o medicamento. Qual valor a parte que já usou o medicamento restituirá a outra? R$ 50.000,00 que o plano efetivamente gastou ou os R$ 1.000,00 de valor da causa?

Só com essa resposta já se chega a uma conclusão. O valor da causa tem de guardar relação com o valor do medicamento que se pleiteia e nunca estipulado arbitrariamente por segundas intenções (que são má intencionadas) de pagar menos custas ou de menos sucumbência. Se o valor final de sucumbência e de custas for muito alto, o plano que pense duas vezes antes de negar o tratamento.

Alexandre Lagoa Locatelli
Mestre em direito, pós graduado em Civil e consumidor. Pós graduando em processo civil. Graduado pelo Mackenzie. Instrutor no Tribunal de Ética. Sócio do CLLA Advogados.

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