No último dia 1º de julho de 2021 entrou em vigor a nova Lei do Superendividamento (Lei Federal 14.181), que altera substancialmente a lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), e a lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento.
A nova Lei passou por diversos debates nas Casas Legislativas, ora originária do Projeto de Lei do Senado 283/12, após submetido à revisão da Câmara dos Deputados e designado como Projeto de Lei 3.515 ainda em 2015. O anteprojeto da lei que pretendia a modernização do Código de Defesa do Consumidor teve o apoio jurídico do ilustres Ministro do Superior Tribunal de Justiça Hermann Benjamin e a Professora consagrada na área do direito do consumidor, Claudia Lima Marques.
Referida Lei promulgada e em vigor pode ser considerada como uma verdadeira conquista para os consumidores que podem contar com o consentimento legal e do mercado para quitação de suas dívidas.
Dentre as alterações introduzidas pela nova Lei ao Código de Defesa do Consumidor (artigo 4º, incisos IX e X; artigo 5º, incisos VI e VII da Lei 8.078/90), destacam-se: (i) o fomento de ações direcionadas à educação financeira e ambiental dos consumidores; (ii) prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor; (iii) a instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural; e (iv) instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento.
Além disso, referida Lei prevê a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial do consumidor que necessita do amparo do Poder Judiciário para a repactuação de suas dívidas.
Com relação à “preservação do mínimo existencial”, entende-se como a definição de uma quantia mínima da renda a ser disponibilizada pelo consumidor-devedor que não poderá ser usada para pagar as dívidas. Ou seja, referidos valores serão usados única e exclusivamente para a sua subsistência, como por exemplo, gastos com moradia e alimentação.
Com relação ao procedimento, ora previsto no novo Capítulo V do Código de Defesa do Consumidor (artigos 104-A e seguintes), mediante pedido formulado pelo consumidor superendividado, o juiz poderá começar processo de repactuação das dívidas com a presença de todos os credores para o qual, na audiência, o consumidor poderá apresentar um plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos para quitação, preservadas as garantias originais.
Excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, conforme §1º do artigo 104-A do CDC.
Caso não haja acordo, o juiz (a pedido do consumidor) instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado. Ou seja, poderá ser apresentado um plano judicial obrigatório para o consumidor e seus devedores, estabelecendo prazos, valores e formas de pagamento, respeitando-se o mínimo para o consumidor conseguir sobreviver.
Ponto importante a ser mencionado é que não podem integrar o plano de renegociação das dívidas àquelas que se caracterizem como garantia real, bem como os financiamentos imobiliários, os contratos de crédito rural e as dívidas realizados pelo devedor sem o propósito de realizar o pagamento.
Inegavelmente que a nova Lei em vigor trouxe um verdadeiro “remédio jurídico” aos consumidores superendividados. Em contrapartida, as empresas terão que ter mais responsabilidade na concessão do crédito aos consumidores que se enquadram neste perfil, vez caberá a ambas as partes uma série de compromissos a serem assumidos.
Com a vigência da lei 14.181/21 há, portanto, direitos e obrigações para ambas as partes a serem cumpridos. Para as empresas que concedem o crédito, espera-se uma sensatez; e, aos consumidores, espera-se uma conduta de responsabilidade e educação financeira que visem a repactuação de suas dívidas que, sem os benefícios da nova lei, seriam impossíveis.