Migalhas de Peso

Os impactos da pandemia na Justiça do Trabalho e a necessidade de mudança de mindset

O momento é de soluções práticas e imediatas. Se no lugar destes milhares de ações fossem propostos bons acordos, como estariam estes trabalhadores agora?

6/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Análise rápida: Somente no ano de 2020 foram 1.161.417 ações, de acordo com os dados do Tribunal Superior do Trabalho. Do total deste número, mais de 86.000 ações têm relação direta com a pandemia.

O mais estarrecedor é que, dentre as principais causas, estão os pedidos de verbas rescisórias. Sim, o trabalhador brasileiro tem ingressado com ação trabalhista para pleitear o que deveria ser pago automaticamente no ato de sua rescisão contratual. Isso assusta, não?

O pensamento é lógico: a pandemia quebrou e ainda vem quebrando muita gente, são empresas de pequeno, médio e grande porte fechando as portas por falta de atividade ou até mesmo de matéria prima e, com isso, as demissões passaram a ser inevitáveis. Manutenção de emprego tornou-se inviável e, mesmo sem dinheiro em caixa, a alternativa para muitos tem sido o corte de funcionários. Mas neste interim, entre o desligamento do trabalhador e o recebimento das verbas rescisórias, mora um abismo. Quantos empregadores mantêm aquele pensamento de que “ganhará tempo” até receber a reclamação trabalhista e ocorrer a primeira audiência? E, pior que isso, o discurso direcionado ao trabalhador “vá buscar os seus direitos!”. O fato é que nem um, nem outro tem sido o motivo exclusivo dos pleitos pelas verbas rescisórias de forma judicial. A crise chegou fortemente e nem a legislação tem dado conta de proteger o trabalhador, como assim deveria acontecer. E é justamente diante deste cenário que precisamos mudar a cultura, tanto dos empregadores como dos empregados, para que eles tenham em mente que a negociação existe para resolver, inclusive, esse tipo de situação.

Muitas destas ações são de pequeno valor, às vezes de R$ 1.000,00 ou R$ 5.000,00, estamos falando de verbas trabalhistas e alimentares, com as quais o trabalhador sustenta sua casa e família. Não é justo que o lapso temporal, aliado ao custo do processo, onere ainda mais o momento da perda do emprego, atingindo diretamente o bolso do trabalhador, aqui mais hipossuficiente do que nunca.

A proteção ao trabalhador não pode anular a possibilidade de um bom acordo, que, neste caso, é visivelmente benéfico ao credor dos direitos trabalhistas e que, certamente não quer mais uma longa ação pela frente, mas sim apenas haver o que lhe é de direito.

O momento, mais do que qualquer outro dantes vivido, é de soluções práticas e imediatas. Se no lugar destes milhares de ações fossem propostos bons acordos, como estariam estes trabalhadores agora?

Quantos advogados oferecem a via da negociação aos seus clientes quando são procurados? E quantos deles estão realmente aptos para isto?

Parece-nos que não dá mais para cada um defender seu próprio interesse. A reflexão é nossa e a obrigação de mudar a mentalidade, também.

Marcelle Menezes do Amaral
Mediadora e design de soluções. Especialista em prevenção, solução estratégica de conflitos e práticas colaborativas. Graduada em Direito, Especialista em mediação e arbitragem pela Fundação Getúlio Vargas, especialista em mediação pela Escola Nacional de Mediação e Conciliação e Especialista em conciliação e mediação nas relações de consumo pela Escola Paulista da Magistratura. Pós graduanda em Neurociências e Comportamento pela PUCRS. Sócia do IMAP Soluções.

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