Migalhas de Peso

Sobre a utilização do MRP em casos de falha de orientação da corretora (CTVM)

Hipóteses, requisitos e procedimentos para buscar o ressarcimento de prejuízos das operações financeiras, negociadas no mercado de bolsa de valores.

16/7/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

As operações em bolsa de valores, seja com a finalidade de investimento em renda variável ou a transação de ativos financeiros, envolvem elevados riscos pela própria natureza.

A instrução CVM 461/2007, que dispõe sobre a organização e funcionamento das bolsas de valores, determinou no art. 77 a criação de um mecanismo para o ressarcimento dos prejuízos dos investidores, decorrentes de ação ou omissão dos intermediários do mercado.

Este mecanismo é um verdadeiro procedimento reparatório, para o ressarcimento dos danos, ocasionados por ação ou omissão dos intermediários, que são especificamente: pessoa autorizada a operar em nome do investidor, administradores, empregados ou prepostos.

Neste rol de agentes estão incluídas as corretoras de valores (CTVM), as distribuidoras de valores (DTVM), por prepostos ou agentes autônomos.

1. Dos requisitos

Para lançar mão deste procedimento de salvaguarda é necessário a presença dos requisitos indicados na norma, que são: (i) a existência de prejuízo, (ii) oriundo de operação em bolsa e (iii) que seja decorrente de ação ou omissão de intermediários.

Este prejuízo, por norma, está limitado ao valor de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) por ocorrência. Caso o valor ultrapasse este teto, deverá ser buscado outro procedimento específico ao caso.

Registre-se, com notória importância, que este prejuízo não poderá ser originado das oscilações de mercado, em relação aos preços dos preços dos ativos.

As operações questionadas, para o pedido de ressarcimento, serão as negociações realizadas em mercado de bolsa com valores mobiliários, por exemplo a compra e venda de ações, derivativos, fundos imobiliários, fundos de índices (ETFs), dentre outros. As operações de balcão, investimentos em renda fixa ou fundos de investimentos abertos estão excluídos deste mecanismo.

Por fim, o prejuízo deverá ser decorrente, diretamente, da ação ou omissão de um dos intermediários do mercado, como o qual o investidor tenha negociado ou autorizado a negociar em nome próprio.

2. Do procedimento e prazo

Nas hipóteses de prejuízo do investidor, caso a demanda não seja atendida internamente pela corretora (CTVM), o pedido de ressarcimento (MRP) poderá ser apresentado à B3 no prazo de até 18 meses da ocorrência.

O pedido poderá ser formulado por meio de requerimento, dirigido à Supervisão de Mercados (BSM), de forma física ou eletrônica, narrando o fato, o prejuízo, a conduta omissiva ou comissiva e quem foi o interveniente responsável pela causa, com os documentos que se fizerem necessários.

Aberto o processo, a BSM irá notificar a parte contrária para apresentar defesa. Em seguida o processo é encaminhado para a Superintendência Jurídica, para análise e decisão. A decisão poderá ser desafiada por recurso administrativo, dirigido à Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários (SMI) da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

3. Das hipóteses de falha de orientação da corretora

O art. 77 da Instrução CVM 461/2007 indica as hipóteses nas quais o pedido de ressarcimento poderá ser formulado.

I - inexecução ou infiel execução de ordens;

II - uso inadequado de numerário e de valores mobiliários ou outros ativos, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimo de valores mobiliários;

III - entrega ao investidor de valores mobiliários ou outros ativos ilegítimos ou de circulação restrita;

IV - inautenticidade de endosso em valores mobiliários ou outros ativos, ou ilegitimidade de procuração ou documento necessário à sua transferência;

V – intervenção ou decretação de liquidação extrajudicial pelo Banco Central do Brasil; e

VI - encerramento das atividades.

Porém estas hipóteses não são taxativas, mas enumerativas, ou seja, o dispositivo apenas exemplificou alguns dos eventos nos quais o MRP poderá ser processado, sem exauri-los.

O "caput" do dispositivo legal indica os casos de ação ou omissão, que acarretarem prejuízo ao investidor. Portanto, não são somente aquelas hipóteses do
art. 77 em que o prejuízo do investidor poderá ser reparado pelo mecanismo de ressarcimento.

Os casos de erro de análise ou de orientação em relação aos ativos do mercado, que impliquem em perdas financeiras por uma operação mal formulada, constituem-se ato de omissão, imprudência ou negligência, que impõem a necessidade de reparação do dano causado.

O investidor necessita obter as análises de mercado, em visão macro, ou mesmo o exame de determinado ativo, para decidir sobre os investimentos, aportes e negócios a serem entabulados. O intermediário, corretora de valores, assessor de investimentos e outros, possuem o dever de conhecer as pretensões do cliente, para recomendar-lhe os ativos que podem alcançar os objetivos pretendidos.

Assim, uma análise viciada do ativo ou a indicação de investimentos em descompasso com os objetivos do investidor, acima do risco suportado ou muito aquém do pretendido, que causem prejuízos, constituem-se em ato danoso passível de ser reparado.

Da mesma forma, um estudo do mercado, sem a isenção necessária, enviesando as pretensões do investidor, também são atos danosos.

4. Conclusão

Como o investidor deposita todas as confianças nas análises, estudos e recomendações dos intermediários que lhe acompanham. Um ato danoso, por ação ou omissão, que corresponda em prejuízo, deverá ser reparado, por intermédio do mecanismo de ressarcimento de prejuízos (MRP), a ser processualizado perante a entidade administradora de mercado.

José Augusto da Costa Lima
Trader e advogado, especialista em Direito Público pelo Centro Universitário de Goiás – Uni-Anhanguera; Direitos Difusos e Novos Direitos pela UFG.

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