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A desjudicialização da execução: o PL 6.204/19 e breves ponderações sobre o seu uso na prática

A despeito da relativa rapidez da execução em relação ao processo de conhecimento, não há dúvidas de que o judiciário está afogado em milhões de demandas.

28/6/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Na advocacia, sabe-se muito bem que é preferível um procedimento de execução de título extrajudicial do que, por exemplo, o ajuizamento de uma ação de cobrança, que conta com toda a fase de conhecimento, sendo o primeiro muito mais célere, para fins de satisfação da dívida.

A despeito da relativa rapidez da execução em relação ao processo de conhecimento, não há dúvidas de que o judiciário está afogado em milhões de demandas, de várias naturezas, tornando, em regra, bastante demorada qualquer tutela jurisdicional.

Diante disso, em novembro de 2019 foi apresentado pela senadora Soraya Thronicke (PSL/MS), o PL 6.204/19, que "dispõe sobre a desjudicialização da execução civil de título executivo judicial e extrajudicial".1 

O projeto busca, em resumo, viabilizar a cobrança de títulos judiciais e extrajudiciais por via de execução extrajudicial civil, na qual o credor interessado será necessariamente representado por advogado em todos os seus atos, ao passo que caberá ao tabelião de protesto exercer as funções do denominado "agente de execução", com a competência regida pelo foro de domicílio do devedor, se extrajudicial o título, ou o foro do juízo sentenciante, se judicial.

Ao agente de execução incumbirá examinar o requerimento e os requisitos do título, bem como eventual ocorrência de prescrição e decadência, consultar uma base de dados mínima para localização do devedor e de seu patrimônio, efetuar a citação do executado, bem como a penhora e avaliação de bens, realizar atos de expropriação, o pagamento ao exequente, e, ao fim, extinguir a execução – ou suspendê-la na hipótese de ausência de bens suficientes para a satisfação da dívida.

Dispõe, ainda, que os atos do agente de execução observarão as regras do processo eletrônico, incluindo-se publicações no Diário Oficial.

Por outro lado, na hipótese de o agente de execução discordar do pedido formulado, deverá consultar o juízo competente, que resolverá o incidente.

O procedimento, na verdade, com as necessárias adequações, conta com todo o regramento aplicável às atuais execuções judiciais e já é adotado em alguns países, como Portugal e França.

A despeito de todo o procedimento, de seu início ao fim, contar com a supervisão e eventual participação do Estado-Juiz, a fim de que seja observado o devido processo legal, a medida tem como objetivo, principalmente, reduzir o volume de demandas que tramitam perante o Poder Judiciário, oferecendo, além disso, uma alternativa mais célere aos credores, com a garantia da segurança jurídica oferecida pelos Cartórios Extrajudiciais espalhados pelo país, em número muito superior ao de varas e juízes.

No momento, o aludido PL se encontra no plenário do Senado Federal, não tendo havido emendas à proposta original e pendente de aprovação.

Pela leitura da proposta original do PL 6.204/19, a despeito da aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, restam questões ainda pendentes de uma melhor definição. Será o procedimento facultativo? Haverá, como nos Juizados Especiais, limitação ao valor executado? A concordância do executado será requisito para a adoção do procedimento extrajudicial? Qual o regime recursal?

Observa-se que, de acordo com o artigo 18 do PL, "o executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos a serem apresentados ao juízo competente", o que, mais uma vez, acionaria o Poder Judiciário.

Na teoria, a proposta apresentada se mostra, de modo geral, como uma alternativa viável para o desafogar o saturadíssimo Poder Judiciário e replica a estratégia já adotada com sucesso para outras hipóteses, como o inventário, o divórcio e a usucapião.

No entanto, a título exemplificativo, a instituição da via extrajudicial do pedido de usucapião, com a vigência do Código de Processo Civil de 2015, mesmo após mais de 5 anos, não se mostra muito mais célere ou eficiente, eis que muitos dos próprios Oficiais de Registros de Imóveis reconhecem que ainda lhes falta prática no procedimento, bem como procura pelos interessados.

Mirando a longo prazo, de fato, trata-se de uma proposta que, se exitosa, poderá reduzir sensivelmente o acervo do Poder Judiciário, uma vez que, em 2018, mais da sua metade era composta por execuções de títulos judiciais ou extrajudiciais23.

Nesse sentido e acerca do referido PL, o prof. Humberto Theodoro Junior consignou "como primeiro passo para a desjudicialização da execucção por quantia certa, a transformação do oficial de protestos em agente executivo. A medida seria facilitada pela sua atual competência para notificação do devedor a pagar o débito líquido e certo constante do título levado a protesto, bem como para receber o montante da prestação devida. Bastaria, segundo a lição lembrada, adicionar à sua atual função, o poder de penhorar e expropriar os bens constritos"4.

É fundamental registrar, por outro lado, que, assim como já mencionado, há pontos no PL 6.204/19 que merecem uma redação mais detalhada, no entanto, se realizadas as necessárias adequações, vislumbra-se como uma medida bastante adequada para enfrentar o cenário atual de assoberbamento do Judiciário e, ao mesmo tempo, imprimir celeridade aos feitos executivos.

Yvani Chung
Sócia do escritório Duarte Garcia, Serra Netto e Terra e atua nas áreas de Prevenção e Resolução de Litígios, Família e Sucessões.

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