Em 2020, o número de brasileiros endividados atingiu o maior índice em 11 anos, 66,5%, segundo estudo produzido pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Em recente declaração, o presidente da CNC, José Roberto Tadros, lembrou que os impactos negativos em decorrência da covid-19 exigiram a adoção de medidas de recomposição da renda, como o auxílio emergencial e o estímulo ao crédito, que ajudaram as famílias a ampliarem a contratação de dívidas e negociar as já existentes. Ainda assim, a inadimplência familiar cravou 25,5% na média do ano. A novidade é que, apesar do aumento no número de endividados, a tarefa de encontrá-los pode exigir um pouco mais de trabalho das empresas com a aprovação de um PL que tramita na Câmara dos Deputados.
De acordo com a atual Lei do Cadastro Positivo (12.414/11), os serviços de proteção ao crédito podem dispor livremente de todos os dados que possuam sobre os consumidores. Não só isso: podem, inclusive, vedar que estabelecimentos ou operações impeçam, limitem ou dificultem a transmissão do banco de dados e, consequentemente, as informações dos cadastrados. Entretanto, o texto contraria diretamente os princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor desde setembro do ano passado.
Atualmente, a LGPD permite o tratamento de dados pessoais para a proteção do crédito, mas não define quais dados podem ser compartilhados. Na intenção de definir esta questão, o PL 4374/20 busca fixar uma série de regras a serem observadas pelas empresas de prestação ao crédito. Nas palavras do deputado Wolney Queiroz (PDT-PE), autor do PL, a vedação estabelecida na Lei do Cadastro Positivo inverte o princípio da segurança previsto na LGPD, de modo que pela sua redação obriga os gestores de bancos a difundir os dados do cadastrado ao invés de protegê-los.
Com a nova redação proposta pelo PL, os serviços de proteção ao crédito somente poderão usar informações fornecidas pelas empresas que efetuarem registro do adimplemento do consumidor. Dessa forma, estaria proibida a utilização de dados de comunicação do consumidor em redes sociais, a interceptação de mensagens privadas enviadas por correio eletrônico e aplicativos para celulares, bem como a coleta de dados por meio de ferramentas de rastreamento de navegação na internet, como scripts de monitoramento ou cookies.
Ainda para atender ao que determina a LGPD, o texto propõe acrescentar à Lei do Cadastro Positivo a proibição de informações relativas a compras efetuadas por meio de pagamento eletrônico, bem como do patrimônio do consumidor e movimentação bancária em conta corrente. De acordo com o PL 4374/20, essas informações, assim como investimentos e empréstimos, não poderiam ser usadas como critério na composição da nota ou pontuação de crédito da pessoa cadastrada em banco de dados destinados à proteção do crédito.
Dessa forma, entende-se que o tratamento de dados para a proteção de crédito não deve ser utilizado como meio para uma completa investigação sobre a vida do consumidor, por isso a importância de delimitar quais dados devem ser compartilhados para este fim. Todavia, sobretudo no cenário atual, tão agravado pela pandemia, é preciso ressaltar que as empresas sofrerão considerável impacto com a falta de informações caso o Projeto de Lei seja aprovado, uma vez que os serviços de proteção ao crédito poderão fornecer somente dados relacionados ao contrato ou transação não cumpridos.