Em um texto anterior, abordamos as desvantagens da figura do Microempresário Individual (MEI). A partir das dúvidas de alguns leitores, elaboramos o presente texto para destacar as diferenças entre a empresa enquadrada como MEI, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) e a Sociedade Limitada Unipessoal, introduzida pela Lei de Liberdade Econômica (lei 13.874/19), que incluiu os §§ 1º e 2º no art. 1.052 do Código Civil¹.
Primeiramente, a comparação é pertinente, pois as três sociedades são unipessoais – são tipos societários ideais para profissionais que desejam formalizar suas atividades sem que haja a necessidade de existência de um sócio adicional minoritário meramente para atendimento a formalidades legais. Contudo, as similaridades param por aí.
A primeira diferença diz respeito ao nível de proteção ao patrimônio da pessoa física. Ninguém abre uma empresa pensando que o negócio vai dar errado. Contudo, com certa frequência, a pessoa jurídica passa a ter dificuldade de pagar seus credores/fornecedores. Em geral, a menos que haja fraude (que pode ser demonstrada quando, por exemplo, o sócio utiliza a empresa para pagar suas contas pessoais), ou, ainda, em casos mais estritos de débitos tributários ou trabalhistas, o patrimônio da pessoa física não responderá automaticamente por dívidas nos casos da EIRELI e da Limitada Unipessoal, diferentemente do que ocorre com o MEI, em que o patrimônio do titular poderá responder pelas dívidas contraídas no exercício da atividade empresarial.
A EIRELI e a Limitada Unipessoal, ademais, não possuem limitação de número de funcionários, de atividades ou de faturamento, o que se adequaria a empresas maiores. Ao contrário, o MEI só pode exercer certas atividades autorizadas e contar com apenas um funcionário, além de não poder ter um faturamento anual superior a R$ 81.000,00.
Ainda, diferentemente do MEI, que se enquadra no Simples Nacional, é isento de tributos federais e paga uma taxa fixa que engloba todos os tributos – a qual varia, em 2021, de R$ 56,00 a R$ 61,00 mensais –, a EIRELI e a Limitada Unipessoal, apesar de estarem sujeitas ao pagamento de impostos federais, podem optar por um dos três regimes tributários: 1) Simples Nacional, desde que o faturamento anual não ultrapasse o teto de R$ 4.800.000,00; 2) Lucro Presumido, sem limite de faturamento e no qual os impostos serão cobrados com base na projeção de faturamento da empresa, calculada a partir da receita bruta anual ou trimestral; 3) Lucro Real, sem limite de faturamento e no qual os impostos serão calculados a partir do lucro líquido da empresa.
Destaca-se, também, que a pessoa física poderá ser sócia de apenas uma EIRELI, mas poderá, por exemplo, ser simultaneamente sócia de uma EIRELI e de uma Sociedade Limitada (SL), o que não é permitido ao MEI, vez que uma pessoa física não pode, ao mesmo tempo, ser MEI e participar como sócia de outra empresa.
Outro ponto relevante que merece ser mencionado é que a EIRELI necessita de integralização no capital social do valor de, ao menos, cem salários-mínimos vigentes no país, equivalentes, em 2021, a R$ 110.000,00 – sem necessidade de integralização complementar em caso de aumento do salário-mínimo –, ao contrário do MEI e da Limitada Unipessoal, que não precisam ter um capital social mínimo.
Visando deixar mais claras as diferenças entre MEI, EIRELI e Limitada Unipessoal, é possível visualizar as distinções principais a partir dos seguintes critérios:
- Quanto à proteção da pessoa física: no MEI, o patrimônio da pessoa física se confunde com o da empresa, podem responder pelas dívidas assumidas no negócio, enquanto, na EIRELI e na Limitada Pessoal, o patrimônio da empresa é separado do patrimônio da pessoa física;
- Quanto ao valor dos tributos pagos: o MEI deverá efetuar o pagamento, em guia única do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS), de um valor fixo mensal – que, em 2021, pode ser de R$ 56,00 (comércio ou indústria), R$ 60,00 (prestação de serviços) ou R$ 61,00 (comércio e serviços juntos), sendo R$ 55,00 de INSS, R$ 1,00 de ICMS e R$ 5,00 de ISS –, ao passo de o valor dos tributos pagos pela EIRELI e pela Limitada Unipessoal dependerá do regime tributário por elas escolhido;
- Quanto ao limite de faturamento: o MEI não poderá ter um faturamento que ultrapasse R$ 81.000,00 por exercício anual, enquanto a EIRELI e a Limitada Unipessoal não terão qualquer limite de faturamento anual;
- Quanto ao limite de funcionários: o MEI poderá contar com apenas um funcionário registrado, enquanto a EIRELI e a Limitada Unipessoal poderão contar com tantos funcionários quanto seja necessário;
- Quanto ao capital social: o MEI e a Limitada Unipessoal não possuem um capital social mínimo a ser subscrito e integralizado, enquanto a EIRELI deverá subscrever e integralizar um capital social cuja importância não seja inferior a cem salários mínimos vigentes no país (em 2021, essa importância é de R$ 110.000,00).
Com a introdução, pela lei de Liberdade Econômica, da Limitada Unipessoal, que é uma empresa de responsabilidade limitada como qualquer outra, é bem verdade que houve um esvaziamento da EIRELI, tendo em vista que aquela congrega todas as vantagens oferecidas por esta última, em especial a proteção patrimonial do sócio, sem a necessidade de integralização de um valor substancial a título de capital social.
Contudo, não existe uma fórmula mágica para determinar qual o tipo societário mais adequado a uma empresa, sendo imprescindível a análise, em conjunto, de diversos fatores que variam conforme o caso concreto e as necessidades do empreendedor.
___________
1. Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
§ 1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
§ 2º Se for unipessoal, aplicar-se-ão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social. (Incluído pela lei 13.874, de 2019)