Todas as cartas de amor são ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem ridículas; só as criaturas que nunca escreveram é que são ridículas, é o que pensava o poeta Fernando Pessoa (e que sábio pensamento).
Na seara jurídica, trata-se o “habeas corpus” de um remédio constitucional, de natureza judicial, que visa a garantir a liberdade de locomoção em face de ilegalidades ou abusos de poder. Então, infere-se que essa medida judicial visa proteger o chamado direito de ir e vir de uma pessoa, que fora cerceada por alguma ilegalidade ou abuso de poder.
Por falar em poder, o poder feminino é incomensurável, a ponto de levar o gênero masculino ao sucesso, ou ao fracasso. Quando a mulher abusa desse poder, seria cabível, assim, impetrar um “habeas corpus”?
Talvez um “habeas corpus” do amor, de acordo com os compositores Orestes Barbosa e Noel Rosa. Vejamos:
“No tribunal da minha consciência,
O teu crime não tem apelação,
Debalde tu alegas inocência,
E não terás minha absolvição,
Os autos do processo de agonia,
Que me causaste em troca ao bem que eu fiz,
Chegaram lá daquela pretoria
Na qual o coração foi o juiz
Tu tens as agravantes da surpresa
E também as da premeditação
Mas na minh’alma tu não ficas presa
Porque o teu caso é caso de expulsão.
Tu vais ser deportada do meu peito
Porque teu crime encheu-me de pavor.
Talvez o ‘habeas corpus’ da saudade
Consinta o teu regresso ao meu amor”.
O poema, evidentemente, caracteriza-se pelo uso predominante da linguagem figurada. O “habeas corpus” é apresentado, no final, como possibilidade de uma reconciliação. A consciência representa, metaforicamente, o tribunal e o coração, o juiz da causa, contudo, não está explícito qual o “crime” praticado pelo autor.
Trata-se, portanto, de uma paráfrase poética de julgamento, talvez o julgamento de um amor. Um amor à moda antiga, um amor sincero e afetivo, pouco lembrado nos dias atuais, quiçá por ser um pensamento ridículo.