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Projeto de lei para prevenção e tratamento do superendividamento é aprovado na Câmara dos Deputados

Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor, pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial.

21/5/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Em 11/5/21 foi aprovado na Câmara dos Deputado o PL 3515/15, que atualiza o Código de Defesa do Consumidor para disciplinar as regras de prevenção e tratamento do superendividamento dos consumidores.

Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor, pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Tais dívidas englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos, decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.

O Anteprojeto de lei foi elaborado por uma Comissão de Juristas presidida pelo Min. Herman Benjamin (STJ) e relatada pela Profª Drª Dr. h. c. Claudia Lima Marques (UFRGS). Dentre as regras aprovadas nas duas casas do Congresso estão a proibição de oferta de crédito ao consumidor com referência a crédito “sem juros”, “gratuito”, “sem acréscimo”, com “taxa zero” ou expressão de sentido ou entendimento semelhante, bem como assediar ou pressionar o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente se se tratar de consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada ou se a contratação envolver prêmio.

O Projeto retorna para o Senado para deliberação dos destaques e, na sequência, seguirá para sanção presidencial. Caso sancionada, a nova legislação reconhecerá a conexidade dos contratos de financiamento com os de concessão de crédito para aquisição de bens e serviços e, além das regras de prevenção do superendividamento, criará um novo procedimento judicial para repactuação de dívidas com a presença de todos os credores.

O Banco Mundial¹ frisou fortemente a importância de todos os países, especialmente os com menor educação financeira² e com menor empreendedorismo da população,³ legislarem sobre superendividamento dos consumidores pessoas físicas,4 de forma a evitarem o risco sistêmico de uma ‘falência’ em massa de consumidores em seus mercados, uma das causas da crise financeira mundial nascida nos EUA, com a ‘falência’5 em massa dos consumidores de crédito subprime e de hipotecas.6

O superendividamento corresponde à morte civil de um consumidor, à sua exclusão do mercado de consumo7, o PL 3515/2015, inspirado no modelo francês, promove o pagamento das dívidas e a reinserção do cidadão no mercado de consumo, preservando o mínimo necessário para a sua subsistência e de sua família.

____________

1. Veja BANCO MUNDIAL (trad.Ardyllis Soares). Conclusões do Relatório do Banco Mundial sobre tratamento do superendividamento e insolvência da pessoa física – Resumo e conclusões finais, in Revista de Direito do Consumidor, v. 89, 2013, p. 435 e seg. E. MARQUES, Claudia Lima; LIMA, Clarissa Costa de. Notas sobre as Conclusões do Relatório do Banco Mundial sobre o tratamento do superendividamento e insolvência da pessoa física. In  Revista de Direito do Consumidor, v. 89, 2013, p. 453 e seg. E

2. Veja MARQUES, Claudia Lima, Estudo sobre a vulnerabilidade dos analfabetos na sociedade de consumo: o caso do crédito consignado a consumidores analfabetos. In: Stoco, Rui. (Org.). Doutrinas essenciais: dano moral. 1ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, v. 2, p. 973-1023.

3. Veja CARVALHO, Diógenes Faria de; FERREIRA, Vito Hugo do Amaral. Consumo(mismo) e (super)endividamento:  (des)encontros entre a dignidade e a esprança, in MARQUES, Claudia Lima; CAVALLAZZI, Rosangela Lunardelli; LIMA, Clarissa Costa de. (Org.). Direitos do consumidor endividado II: vulnerabilidade e inclusão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 171-202.

4. MARQUES, Claudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. In: Cláudia Lima Marques; Rosângela Lunardelli Cavallazzi. (Org.). Direitos do Consumidor endividado: Superendividamento e Crédito. 1ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, v. , p. 255-309.

5. BERTONCELLO, Karen Rick Danilevicz. Breves linhas sobre o estudo comparado de procedimentos de falência dos consumidores: França, Estados Unidos da América e Anteprojeto de lei no Brasil. Revista de Direito do Consumidor, v.83, set-2012, p. 313 e seg.

6. Assim  NEFH, James (EUA). Preventing another financial crisis: The critical role of Consumer Protection Laws, in Revista de Direito do Consumidor, v. 89, p. 29-40, 2013 e RAMSAY, Iain e WILLIAMS, Toni (Reino Unido). Anotações acerca dos contornos nacionais, regionais e internacionais da proteção financeira dos consumidores após a Grande Recessão, in Revista de Direito do Consumidor, v. 89, p. 41-58, 2013.

7. MIRANDA, Marié; MARQUES, Claudia Lima; ATHENIENSE, Luciana; BERGSTEIN, Laís. Moção da comissão especial de defesa do consumidor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pela aprovação imediata do PL 3515/2015. Aprovada por unanimidade pelos membros da Comissão em Brasília, 27 de maio de 2019.

Laís Gomes Bergstein
Sócia e integrante do Núcleo de Direito Civil do Escritório Professor René Dotti e secretária-adjunta da Comissão Especial de Direito do Consumidor do Conselho Federal da OAB.

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