Migalhas de Peso

A obrigatoriedade da ação penal e o pedido de novas diligências no curso do inquérito policial

O princípio da obrigatoriedade da ação penal define balizas para fundamentais para o Direito Processual Penal brasileiro e revela peso especial também sob a ótica garantista.

18/5/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Ainda que sob controvérsias, o princípio da obrigatoriedade da ação penal define balizas para fundamentais para o Direito Processual Penal brasileiro e revela peso especial também sob a ótica garantista. Isso porque, desconsiderado o aspecto exclusivamente punitivo que se enxerga em sua motivação, certo é também que limita, e delimita, a pretensão punitiva, ao enquadrá-la, de forma definitiva, estabelecer sua dimensão e permitir que a defesa se exercite unicamente contra aquela acusação. Isso porque, forçado o acusador a formalizar a incriminação e se a essa se restringir ao propor a respectiva ação penal, ao mesmo tempo abdica de acusação pelos demais fatos postos sob sua apreciação.

Conhecendo-se o posicionamento majoritário do STF a respeito do delicado e controverso tema do arquivamento implícito do inquérito policial, sob outro prisma se conclui que a obrigatoriedade da ação penal pública, ao impor a acusação ao Ministério Público, estabelece, ao mesmo tempo, que os demais fatos de que se tratou na investigação não serão objeto de incriminação, salvo na hipótese tratada no artigo 18, do CPP. Vale salientar que essa norma não restringe o princípio da obrigatoriedade, antes o confirma, pressupondo que, quanto aos fatos antes conhecidos, a ação estatal de persecução penal já foi exercida e delimitada.

Essa mesma obrigatoriedade se expressa no artigo 16, do CPP, segundo o qual o Ministério Público não pode deixar de acusar e, se pretender fazê-lo, deve oferecer denúncia ou devolver os autos à Polícia para novas diligências, imprescindíveis para essa denúncia. Pois esse comando importa ainda em registrar, expressamente, que a manifestação do Ministério Público nesse sentido implica, igualmente, explicitar um juízo de valor, segundo o qual as provas que já instruem o inquérito policial não são suficientes para uma acusação.

Por extensão dessa lógica, somente se, a partir das novas diligências, o quadro informativo for modificado e ganhar robustez suficiente é que poderá autorizar uma denúncia. Se, diversamente, as provas complementares forem inúteis, repetitivas ou desnecessárias, não se permitirá o oferecimento de denúncia e a denúncia que, a despeito, for oferecida terá de ser rejeitada por falta de justa causa.

A alternativa conferida pelo artigo 16 do CPP, portanto, pressupõe a insuficiência do inquérito policial como base para a denúncia e exige complementação idônea, de tal modo que somente com essa complementação a acusação se mostre viável. Em não se apresentando a complementação com essa feição, não poderá ser formulada a acusação, carecendo os fatos das novas provas de que trata o artigo 18, do CPP.

Arquivamento implícito ou não, esse o sentido da Lei e que impõe severo juízo de valoração quanto às diligências complementares, sob pena de se estar admitindo que um mesmo quadro informativo (em essência) possa e não possa servir “de base para a denúncia” (mais uma vez, artigo 18, do CPP).

Mauricio Lins Ferraz
Advogado criminalista. Fundador do escritório Lins Ferraz Advocacia.

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