No presente momento está ocorrendo a Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI da covid-19 no Senado Federal, que, em resumidamente, visa investigar possíveis omissões e desvios provenientes da conduta do Governo Federal através da pessoa de seu presidente, Jair Bolsonaro, de seus subordinados como ministros, secretários e demais entes que por ventura tiveram ou possam ter relação com atuações que envolvam a pandemia do novo corona vírus, no Brasil.
Cumpre destacar, em breve parêntese, que a CPI foi iniciada de maneira extremamente controversa e questionável, já que não teve seu início definido pelo presidente do Senado Federal, como determina o regimento interno do Senado, mas sim pelo Ministro do Superior Tribunal Federal – STF, Luís Roberto Barroso, em decisão que depois fora confirmada pelo pleno do referido Tribunal. Em outras CPI’s, o STF não se manifestou sobre a obrigatoriedade do Senado em acatar imediatamente o preenchimento dos requisitos para tal (ao menos 1/3 dos integrantes da casa legislativa, indicação de fato determinado a ser investigado e duração em prazo certo) visto que tal prerrogativa é exclusiva do presidente do Senado Federal – ou era.
Exposto este breve e importante parêntese, expõe-se a reflexão acerca do Relator da comissão. O Senador Renan Calheiros, escolhido como relator da CPI que visa investigar o Governo Federal e demais entes relacionados à atuação de combate à pandemia da covid-19, objetivando definir se houve ato de improbidade administrativa atos de corrupção ou quaisquer atividade prejudicial ao combate da pandemia, que possa ser tipificada junto ao ordenamento jurídico brasileiro.
Pois bem, este senhor, Renan Calheiros, está sendo investigado em 10 (dez) inquéritos que versam sobre possíveis crimes cometidos pelo mesmo, na atuação de sua função pública, que caminham de corrupção passiva a lavagem de dinheiro, passando por desvios, apropriações e omissões quanto à verba pública. 9 (nove) destes inquéritos estão em tramitação no Superior Tribunal Federal, que inclusive foi instado a se manifestar acerca da possibilidade ou não de o Senador ser o Relator, mas o mesmo, sob decisão do Ministro Ricardo Lewandowski, entendeu, por bem, que não haveria qualquer impedimento jurídico.
Os inquéritos sob a apreciação dos investigadores, versam sobre recebimento de propina advinda da Odebrecht, repasses relacionados à BRASKEM, desvio de verba pública disponibilizada para acelerar e fomentar aprovação de medida provisória colaborativa aos anseios do parlamentar, entre outros temas, dos quais um deles, em particular, inclui o próprio filho do Senador, o Governador do Estado de Alagoas, Senhor Renan Calheiros Filho.
Mais um parêntese que cumpre ser exposto, visto que o Senado foi instado a investigar, através da CPI, não somente a conduta do Governo Federal, mas, também, dos Estados e Municípios. Mas como o pai poderia investigar o filho? O Relator da CPI poderia investigar o Governador de um Estado? Sim. Um pai poderia investigar o filho? Fica a reflexão, pois o Senado entendeu que não deveria investigar Estados e Municípios.
Retornando à análise sobre a relatoria da comissão parlamentar, fica a ideia de que há um certo preconceito em impedir que um Senador da República seja o Relator de uma CPI “apenas” por ser investigado em inquéritos que (ainda) nãos e tornaram em denúncias. No entanto, como não poderia deixar de ser, Renan Calheiros já foi condenado, em primeira instância, em processo que visou investigar atos de improbidade administrativa, que condenou o referido senador, inclusive, à perda de seu mandato. Em sede recursal, a condenação foi cassada, somando esta a mais 9 (nove) processos criminais que se findaram sobre o mesmo – este parlamentar é o senador com maior número de inquéritos e processos da história do Senado Federal brasileiro.
Em complemento, Renan teve seu patrimônio questionado inclusive pela Polícia Federal, em investigação paralela, onde resta comprovado que o mesmo possui uma fortuna que não condiz com sua renda como parlamentar e pecuarista. No ano de 2020, a Polícia Federal concluiu que a não há comprovação que justifique os bens do Senador, tampouco suas movimentações bancárias.
Renan Calheiros está sem seu quarto mandato como Senador por Alagoas, sendo que no primeiro, no período de 2005 a 2007, se viu obrigado a renunciar ao cargo em decorrência de denúncias de corrupção – não é de hoje. Em 2016, em decorrência de sua condição de réu em processo que investiga cometimento de crime de peculato, o STF decidiu que, apesar de presidente do Senado Federal, o senador não poderia assumir a presidência da República, na linha sucessória.
O efeito principal de uma CPI é a possibilidade de se responsabilizar civil e/ou criminalmente indivíduo(s) por possíveis crimes e infrações cometidas. Renan Calheiros, com 10 inquéritos em trâmite é o responsável por ser o Relator de uma comissão que irá responsabilizar (ou não) possíveis crimes cometidos pelo Governo Federal e seus pares na atuação ao combate à pandemia.
Se isto não é imoral, antiético, deplorável, abominável, condenável e demais sinônimos, talvez seja o caso de redefinir-se o significado destas palavras nos dicionários brasileiros.