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Publicidade x Propaganda: Uma distinção que pode evitar muitas discussões no novo provimento da OAB

Uma das maiores e mais benéficas novidades trazida na minuta do Novo Provimento da OAB que versa sobre o Marketing Jurídico é o seu artigo 2º, que traz algumas definições a fim de facilitar a comunicação e o entendimento de toda a norma e suas orientações.

7/5/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Escreverei 2 artigos sobre as definições trazidas no art. 2º da minuta. Neste primeiro, brindo a todos com a participação especial do Sérgio Fadel. Profissional com atuação desde 1987 em marketing para vários setores no mercado nacional, com destaque em projetos para a Unilever, Sompo Seguros, Fox (Simpsons, Fox Sports, The Walking Dead) e Accorhotels e que desde 2002 é especialista em marketing jurídico, além de professor em várias instituições desde 2006 em diversas matérias relacionadas à Gestão Legal e ao Marketing Jurídico.

Sérgio Fadel irá contribuir com um embasamento histórico, conceitual e prático sobre minha proposta para que seja acrescentada a definição de PROPAGANDA no Novo Provimento. Meu intuito é demonstrar que embora seja verdade que no Brasil os termos publicidade e propaganda são comumente usados como sinônimos e sem qualquer distinção, muito provavelmente porque para os demais ramos de negócios, exceto o jurídico, isso realmente não faz diferença, para o negócio jurídico, a distinção dos termos se faz necessária e, principalmente, será a resposta para várias dúvidas e economizará muitas explicações e discussões no que tange ao assunto.

Vamos então a um texto que Fadel fez para nosso artigo:

“Aqui no Brasil os termos “propaganda e publicidade” sempre foram sinônimos no segmento de mercado que abrange as agências, empresas de marketing, áreas de marketing internas, meios de comunicação e universidades. Darei alguns exemplos:

As primeiras e mais importantes agências em território nacional e que ainda existem como ALMAP, DPZ, McCann, W/Brasil, entre outras, que criam, produzem e veiculam propaganda são chamadas de agências de publicidade ou propaganda, tanto faz.

Os profissionais de agência se apresentam e são apresentados como publicitários, entre eles alguns profissionais como Nizan Guanaes e Washington Olivetto, muito conhecidos pelo público em geral, pois se destacaram por criar propagandas memoráveis e premiadas.

De fato, aqui no Brasil, os publicitários são os responsáveis pela propaganda com o objetivo de vender, reposicionar as marcas, gerar relacionamento etc.

Também nas empresas, muitas das quais participei nos últimos anos como Unilever, Sompo Seguros, Fox, Accorhotels etc., há os cargos de gerente de publicidade ou gerente de propaganda e as funções são sempre as mesmas.

Veja também que interessante: quando abrimos revistas ou jornais vemos algumas vezes “informes publicitários”, que nada mais são do que anúncios como o objetivo claro de vendas, disfarçados como se fossem artigos do respectivo veículo e assim, tentar garantir maior credibilidade.

O que talvez confunda algumas pessoas (mas que não deveria) é que nos Estados Unidos, berço do marketing contemporâneo, as palavras têm significados distintos e como importamos muitos conceitos e informações de lá, se formos olhar a cultura deles enxergamos uma outra realidade.

Propaganda para eles é “advertising”, ou seja, uma comunicação voltada a apresentar produtos e serviços com a indução de seu consumo, influenciar comportamentos, impulsionar vendas, melhorar a participação do mercado e tudo mais que sabemos. Já o termo “publish” tem como conotação tornar público, ou seja, a informação sai do privado e passa a ser divulgada para o público específico.”

Como podemos notar, embora os termos publicidade e propaganda não sejam diferenciados aqui no Brasil, do local de onde importamos o marketing que usamos aqui, eles possuem definições bem distintas e importar tal distinção poderá nos auxiliar muito no entendimento do que pode e do que não pode ser feito no marketing para o negócio jurídico brasileiro.

Já no meu livro, Marketing Estratégico para Advogados, publicado em 2019, página 22, eu mencionava esta distinção entre os termos e a vedação da propaganda no atual Código de Ética e Disciplina da OAB.

Transcrição do livro

Vejamos o que diz o atual CED:

Art. 39. A publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão.

Sendo assim, já devemos eliminar tudo o que é propaganda e nos atermos somente ao que for publicidade.

E qual é a diferença entre propaganda e publicidade?

Enquanto a propaganda visa induzir que os interlocutores consumam sua ideia, produto ou serviço, a publicidade não tem o intuito da indução, mas somente de tornar algo público, tal qual o princípio da publicidade do art. 37 da Constituição Federal que nós advogados estamos acostumados a interpretar.

Podemos observar a vedação explícita à propaganda indutiva no Código de Ética:

Art. 41. As colunas que o advogado mantiver nos meios de comunicação social ou os textos que por meio deles divulgar não deverão induzir o leitor a litigar nem promover, dessa forma, captação de clientela.

Vamos a mais um trecho do que Sério Fadel nos presenteou sobre o tema:

“Percebo que no mercado jurídico a confusão é às vezes um pouco mais abrangente. Muitos enxergam o marketing como sinônimo de publicidade/propaganda. E isso não é verdade, seja aqui ou no exterior. Marketing engloba análise de mercado, observação das tendências políticas e socioeconômicas, conhecimento do perfil do cliente (público e personas), composição de custos/preços de venda, pesquisa de satisfação, gerenciamento do relacionamento com clientes e comunicação, entre outros.

Já dentro de ações de comunicação temos: identidade visual, material de papelaria, portfólios, assessoria de imprensa, produção de conteúdo, informativos, eventos físicos e digitais, sites e blogs, brindes, e claro, a propaganda, que pode ser divulgada em meios físicos ou virtuais.

Pensando objetivamente no mercado jurídico, ou seja, advogadas, advogados e escritórios de advocacia, e já considerando as regras de divulgação, sua abrangência e limitações, penso que talvez possamos utilizar como base o conceito americano, ou seja, definirmos o termo publicidade como tornar público e o termo propaganda como um anúncio ou conjunto de anúncios veiculados nos meios de comunicação que objetivamente têm a intenção de vender serviços ou produtos para pessoas físicas e jurídicas.

Essa distinção talvez facilite uma maior compreensão do que pode ou não ser possível/permitido viabilizar nos meios de comunicação. Também importante definir como a mensagem será classificada. Por exemplo, quando um escritório divulga em uma revista ou jornal, os serviços prestados, endereço, meios para contato e horário de funcionamento ele está fazendo um anúncio, contudo não há “gancho de vendas ou captação de clientes” e sim uma maneira de manter a marca na lembrança e o serviço à disposição.”

Aproveito as palavras de Fadel para demonstrar a amplitude do que é marketing para destacar uma grande evolução trazida na minuta do Novo Provimento que é a inclusão da expressão marketing jurídico já no início do seu art. 1º: “É permitido o marketing jurídico, desde que...”. Considero o uso do termo marketing jurídico no lugar de publicidade, como é o título do CED que versa sobre o tema, como uma grande evolução, pois demonstra que a OAB e toda a classe estão mais envolvidos e conhecedores de conceitos que são de sua importância para qualquer negócio, inclusive o jurídico.

Infelizmente, na minuta também temos a grande confusão entre publicidade e propaganda: “Dispõe sobre a publicidade, a propaganda e a informação da advocacia.”, “considerando as normas sobre publicidade, propaganda e informação da advocacia, “Art. 10. Faz parte integrante do presente provimento o Anexo, que estabelece os critérios específicos sobre a publicidade, propaganda e informação da advocacia.” e “§ 1º O Comitê Regulador do Marketing Jurídico se reunirá periodicamente para atualizar os critérios específicos sobre a publicidade, propaganda e informação na advocacia...”.

Ora, como já vimos, é intenção proibir o uso da publicidade indutiva: “VIII – Captação indevida de clientela: utilização de mecanismos de marketing que, de forma ativa, independentemente do resultado obtido, se destinam a angariar clientes pela indução à contratação dos serviços ou estímulo do litígio.”, logo, o termo propaganda está sendo mal utilizado, gera dúvidas e causa insegurança jurídica. Por outro lado, se o termo propaganda fosse usado como uma definição daquilo que não é permito somente traria benefícios à normatização do marketing jurídico.

É importante percebermos que os mais atentos já estão seguindo a linha da separação dos conceitos publicidade x propaganda há algum tempo e que ela nos ajuda, seja como profissionais de marketing, advogados ou OAB, a compreender o que se quer dizer com captação indevida de clientela.

Antes de concluir, gostaria de parabenizar à OAB SP pelo “GUIA DE UTILIZAÇÃO DAS REDES SOCIAIS PELA ADVOCACIA” publicado agora em abril/2021. Neste guia, Marlon Luiz Garcia Livramento, advogado e membro da OAB e Alexandre Motta, especialista em marketing jurídico, fazem uso das definições distintas de publicidade e propaganda para tornar mais fácil a leitura do que é permitido e do que é proibido no marketing jurídico.

Para finalizar, ressalto que tanto a publicidade quanto a propaganda podem ser pagas ou gratuitas. Os anúncios, pagos ou não, podem conter publicidade ou propaganda, a depender se trazem consigo o viés de indução ao consumo ou não.

Nossa intenção é refletir sobre pontos que geram discussões e polêmicas, a fim de que o Novo Provimento possa cumprir seu papel e que o marketing jurídico possa ser praticado em sua amplitude sem medo e sem insegurança. Para isso precisamos de definições corretas, objetivas e esclarecedoras!

Leia o primeiro artigo e o segundo artigo desta série!

Até breve! 

Juliana Pacheco
Advogada, especialista em gestão legal com experiência de 20 anos na área, sócia-fundadora da JP Gestão Legal, fundadora do BuscaJur, autora do livro Marketing Estratégico para Advogados, membro Consultora da CEGEI - Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB Nacional, membro do Conselho da Fenalaw 2018, 2019, 2020 e 2021.

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