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Gás Natural Liquefeito (GNL)

A questão energética no Brasil, a exemplo de outros mercados, relaciona, em certa medida, a oferta de energia elétrica à oferta de gás natural como combustível das usinas geradoras de eletricidade equipadas para girar à base de gás natural.

25/1/2007


Gás Natural Liquefeito (GNL)

Regulação e fomento

Diretrizes do Conselho Nacional de Política

Leonardo Miranda*

A questão energética no Brasil, a exemplo de outros mercados, relaciona, em certa medida, a oferta de energia elétrica à oferta de gás natural como combustível das usinas geradoras de eletricidade equipadas para girar à base de gás natural.

Não obstante a vocação natural do Brasil seja a geração hídrica, fato é que, toda vez que um risco de desabastecimento de eletricidade se apresenta, o gás natural retoma sua posição de salvador da crise iminente.

Nesse cenário, o Conselho Nacional de Política Energética – CNPE emitiu, recentemente (em 24 de novembro), uma resolução (Resolução nº 4) que “estabelece diretrizes e recomenda ações para a implementação de Projetos de Importação de Gás Natural Liquefeito – GNL, a serem disponibilizados ao mercado brasileiro, de forma a garantir suprimento confiável, seguro e diversificado de Gás Natural”.

O Brasil vem, portanto, tratar o gás sob uma ótica que já está presente em outros países do mundo - notadamente na Europa, onde o uso direto de gás pelo consumidor final traz problemas sazonais em razão do inverno europeu.

Embora o caso brasileiro não seja idêntico ao Europeu, estamos presenciando a discussão sobre o risco de desabastecimento (ou abastecimento insuficiente) do gás, ainda que essa discussão seja em razão de uma outra questão mais direta, qual seja o risco de desabastecimento de eletricidade. Neste cenário, o CNPE, legitimado para tanto, houve por bem emitir diretrizes para que seja fomentado o uso do gás sob a forma liquefeita, cujas características e normas são apresentadas a seguir.

1. Diretrizes do CNPE:

A nova resolução do CNPE, em breves linhas, determina o seguinte:

“Art. 1º Declarar prioritária e emergencial a implementação de Projetos de Gás Natural Liquefeito – GNL, compostos pela importação de gás natural na forma criogênica, armazenamento e regaseificação, bem como a infra-estrutura necessária, com o objetivo de:

I – assegurar a disponibilidade de gás natural para o mercado nacional com vistas a priorizar o atendimento das termelétricas;

II – facilitar o ajuste da oferta de gás natural às características do mercado nacional, por meio de suprimento flexível;

III – mitigar riscos de falha no suprimento de gás natural em razão de anormalidades;

IV – diversificar as fontes fornecedoras de gás natural importado; e

V – reduzir o prazo para implementação de Projetos de Suprimento de Gás Natural.

Art. 2º Visando à execução plena das atividades a que se refere o art. 1º, fica assegurada a implementação de mecanismos para garantir o cumprimento desta Resolução e a articulação dos meios institucionais necessários para superar possíveis problemas na implantação dos Projetos de GNL.

2. Características do produto e dos mercados de GNL:

O GNL desempenha um papel fundamental no cenário atual de gás natural, nos principais mercados energéticos do mundo. Normalmente, o GNL é a única alternativa viável para monetizar campos de gás localizados em grandes distâncias dos centros consumidores. Portanto, há muita perspectiva de crescimento do consumo de GNL no mundo, cenário no qual o Brasil está se inserindo rapidamente.

Existe, vale dizer, uma questão paralela ao uso do GNL no Brasil para solucionar um problema de desabastecimento elétrico. Essa questão passa pela insegurança crescente, em diversos países importadores de GNL, com as suas fontes supridoras, posto que muitos dos países exportadores de GNL passam por problemas políticos bastante sérios, gerando uma insegurança geopolítica que amedronta os países importadores no que diz respeito à certeza da continuidade do suprimento.

Nesse âmbito, havendo sobra de gás no Brasil, após atendida a demanda interna, pode-se vislumbrar o Brasil como um exportador de GNL, já que, no campo geopolítico, o Brasil não apresenta as inseguranças de muitos dos seus potenciais competidores.

O GNL é obtido a partir do resfriamento do gás natural a -260ºFarenheint. Com esse processo, advém a principal característica e vantagem na utilização do gás sob a forma de GNL; a redução do seu volume em 600 vezes com relação ao estado gasoso. Logo, a capacidade de transporte fica ampliada sobremaneira, reduzindo o custo de uma das etapas mais custosas da cadeia do gás natural; transporte.

Com o resfriamento, se torna possível o transporte de volumes cada vez maiores de gás natural, o que acaba por encorajar projetos de exploração e produção em áreas distantes dos centros consumidores (norte e oeste da África, Alasca, etc.).

A cadeia do GNL consiste em (1) Liquefação, (2) Transporte em navio-tanque, (3) armazenamento e (4) regaseificação.

O transporte de GNL deve ser feito em navios equipados com tanques duplamente protegidos com cobertura criogênica, por razões de segurança.

Alguns mercados tradicionalmente consumidores de GNL são Japão, EUA, Reino Unido, China e Coréia do Sul. E os tradicionais exportadores são Indonésia, Argélia, Malásia e Catar.

3. Regulamentação da cadeia de GNL no Brasil:

Uma das políticas de energia estabelecidas pela chamada Lei do Petróleo (9.478/1997) (clique aqui) consiste em “incrementar, em bases econômicas, a utilização do gás natural”.

Nesse sentido a ANP, já em 1998, por meio da Portaria nº170 (clique aqui), regulou a construção, ampliação e operação de instalações de transporte ou de transferência de gás natural, inclusive GNL. E definiu essas “instalações de transporte” como sendo os dutos, terminais terrestres, marítimos, fluviais ou lacustres, e unidades de liquefação de gás natural e de regaseificação de GNL.

No que tange ao GNL, portanto, a Portaria nº 170/1998 regula:

a construção, ampliação e operação de unidades de liquefação e de regaseificação de gás natural.

Ato contínuo, no ano de 2000 a ANP emitiu nova Portaria (nº118) (clique aqui), dessa vez regulando (1) a distribuição de GNL a granel e (2) a construção, ampliação e operação das chamadas “centrais de distribuição de GNL”, estas definidas como “área devidamente delimitada que contém os recipientes destinados ao recebimento, armazenamento e transvasamento de GNL, construída e operada de acordo com as normas internacionalmente adotadas”. “Recipientes”, segundo a portaria, são os tanques criogênicos referidos anteriormente neste artigo.

A “distribuição” referida na Portaria nº118/2000 “compreende as atividades de aquisição ou recepção, armazenamento, transvasamento, controle de qualidade, e comercialização do GNL, através de transporte próprio ou contratado, podendo também exercer a atividade de liquefação de gás natural”.

Com isso, a Portaria nº118/2000 veio regular a:

(1) Distribuição
de GNL a granel

(2) Construção, ampliação e operação
de “centrais de distribuição de GNL”

Essas duas normas do órgão federal regulador do setor de gás natural abrangem, portanto, a instalação, ampliação e operação de unidades de liquefação e regaseificação, bem como a distribuição (a granel) do produto GNL. Essencial, portanto, o conhecimento dos requisitos dessas duas normas.

A Portaria nº 170/1998 prevê que as atividades reguladas pela mesma somente podem ser exercidas por empresas constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no país. Dentre os diversos outros requisitos da portaria, destaca-se o compasso como licenciamento ambiental do projeto. Nesse sentido, a chamada “autorização para construção” somente é concedida mediante apresentação da licença de instalação expedida pelo órgão ambiental competente. Por sua vez, a chamada “autorização para operação” também só pode ser concedida mediante apresentação da respectiva licença ambiental de operação.

A ANP possui um prazo máximo de 90 dias para se manifestar, podendo esse prazo ser prorrogado caso sejam requeridos pela ANP documentos ou esclarecimentos adicionais.

A autorização para construção está relacionada com o cronograma de obras do projeto, que será acompanhado pela ANP. Ao passo que a autorização para operação está relacionada ao comissionamento do projeto, que deverá ser atestado por empresa independente.

No que diz respeito aos requisitos introduzidos pela Portaria nº 118/2000, a distribuição está vinculada a dois itens em especial, a saber:

1. Comprovação de propriedade de central de distribuição de GNL própria ou de terceiros, devidamente autorizada pela ANP a operar, para receber do produtor ou de outra fonte supridora o volume de GNL correspondente aos contratos para distribuição;

2. Comprovação de propriedade, no mínimo, de 2 (dois) veículos transportadores, que poderão ser próprios, fretados ou arrendados, adequados ao transporte de carga perigosa, nos termos do Regulamento Técnico INMETRO RT 6.

O prazo para a ANP se manifestar é de no máximo 60 dias, ressalvada a hipótese do órgão regulador requerer documentos ou informações adicionais.

Ademais, os distribuidores devem informar mensalmente à ANP os volumes e respectivo Poder Calorífico Superior (Kcal/m³) das aquisições ou recebimentos, estoque inicial, estoque final e vendas ou entregas de GNL realizadas no mês anterior (“em formulário próprio que se encontra disponível no Escritório Central da ANP ou em seu website”).

Quanto à construção, ampliação e operação das centrais de distribuição, vale novamente destacar o compasso com o licenciamento ambiental e com o projeto ou comissionamento da obra, conforme a fase (construção ou operação).

Finalmente, não é menos importante recordar que existe legislação específica sobre penalidades para descumprimentos relacionados com as atividades da indústria do petróleo no Brasil. Nesse sentido, a Lei nº 9.847/1999 (clique aqui) estabelece punições para quem exerce atividade sem autorização, ou distribui produto não autorizado, etc.

As penalidades previstas na lei, que poderão ser aplicadas cumulativamente, são: multa, apreensão de bens e produtos, perdimento de produtos apreendidos, cancelamento do registro do produto junto à ANP, suspensão de fornecimento de produtos, suspensão temporária, total ou parcial, de funcionamento de estabelecimento ou instalação, cancelamento de registro de estabelecimento ou instalação e revogação de autorização para o exercício de atividade.

Alguns exemplos de penalidades que se aplicam ao objeto deste artigo seriam os seguintes:

1. Exercer atividade relativa à indústria do petróleo, ao abastecimento nacional de combustíveis, ao Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis e ao Plano Anual de Estoques Estratégicos de Combustíveis, sem prévio registro ou autorização exigidos na legislação aplicável: Multa de R$50.000,00 a R$200.000,00.

2. Construir ou operar instalações e equipamentos necessários ao exercício das atividades abrangidas por esta Lei em desacordo com a legislação aplicável: Multa de R$5.000,00 a R$2.000.000,00.

3. Não enviar, na forma e prazo estabelecidos na legislação aplicável, as informações mensais sobre suas atividades: Multa de R$20.000,00 a R$1.000.000,00.

4. A penalidade de perdimento de produtos apreendidos será aplicada quando o produto estiver sendo utilizado em atividade relativa à indústria do petróleo, por pessoa sem prévio registro ou autorização exigidos na legislação aplicável.

4. Conclusão:

Pelas razões que causaram a manifestação do CNPE objeto deste artigo, bem como em face dos potencias riscos de abastecimento de GNL importados de determinados países, resta bastante claro que o Brasil tem não só motivos internos para fomentar projetos de GNL, como também boas perspectivas externas pare se tornar um importante player exportador de GNL.

O órgão regulador do setor, ANP, já delineou algumas principais normas sobre atividades afeitas ao GNL, dentro do seu âmbito de atuação. Algumas outras questões poderão ser levantadas e passíveis de regulação à medida em que os projetos de GNL sejam desenvolvidos em escala considerável.

Resta, contudo, sejam atendidas as determinações do CNPE para a “implementação de mecanismos para garantir o cumprimento desta Resolução e a articulação dos meios institucionais necessários para superar possíveis problemas na implantação dos Projetos de GNL”.

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* Advogado do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2007. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS










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