1. Introdução: Do conceito e pressupostos da marca de alto renome
Inicialmente se faz necessário elencar o que é uma marca e o que diferencia uma marca comum daquelas classificadas como marca de “alto renome”. A Lei de Propriedade Industrial (LPI), em seu artigo 1221, define marca como o sinal distintivo visualmente perceptível que identifica, direta ou indiretamente, produtos e serviços.
Já em sentido estrito, temos o termo “marca” como “um nome ou desenho que identifica junto aos consumidores um produto ou serviço oferecido no mercado.”2
O âmbito mercadológico, o mais compreensível no ponto de vista de análise preliminar, confere-se a partir dos impactos que uma marca exerce em uma lógica de fluxo de capital, ou seja, é o entalhe simbólico na sociedade, o elemento que distingue uma marca de outra, que gera destaque e reconhecimento em determinado meio.
Não raro, empresas acabam por investir um grande montante de dinheiro na pesquisa, desenvolvimento e aplicação da marca. Porém, sem uma segurança jurídica, seria por certo muito dispendioso ter que sempre atualizar a marca para garantia do reconhecimento no mercado.
O registro da marca nada mais é do que uma concessão legal para garantir o uso exclusivo e proteção da marca em todo o território nacional, pelo período inicial de 10 anos, prorrogáveis por períodos iguais e sucessivos.
E é por isso que há uma proteção da marca por parte do Ordenamento Jurídico, para assegurar o gozo de sua especificidade e lucratividade decorrente do conhecimento coletivo. Atualmente regida pela Lei de Propriedade Industrial (LPI), sob a responsabilidade do Instituto de Propriedade Industrial do Brasil (INPI), que é o responsável por coordenar os processos de registro das marcas e por salvaguardar os direitos do detentor.
Todavia, existem algumas marcas que detém de um grande reconhecimento entre os consumidores, portanto, a estas é assegurada uma proteção especial, em todos os ramos e atividades, ultrapassando, assim, os limites do princípio da especificidade, são as conhecidas marcas de alto renome3.
Assim são definidas as marcas de alto renome:
“As marcas de alto renome são sinais que exercem magnetismo próprio, sobrevoando todas as categorias de produtos ou serviços e conservando o poder de distinção ainda que desvinculada de sua função originária”.4
Assim, tem-se que o alto renome de uma marca é situação de fato que decorre do amplo reconhecimento que o signo distintivo goza junto ao público consumidor.
Não obstante, não basta apenas a fácil identificação pelo público, sendo necessário também que a marca tenha prestígio e autoridade, requisitos e pressupostos essenciais para que uma marca goze desta proteção especial e seja elevada a uma classificação de alto renome.
Para que seja reconhecido o alto renome, o INPI, por meio de uma comissão especial, realiza um estudo técnico e detalhado para analisar se determinada marca atende às exigências para receber essa proteção especial, neste estudo serão consideradas algumas características: reputação, prestígio, grau de reconhecimento por ampla parcela do público residente no Brasil, além da exclusividade.
Alguns pré-requisitos atualizados pela resolução INPI/PR 172/16 são:
I. Reconhecimento da marca por ampla parcela do público brasileiro em geral;
II. Qualidade, reputação e prestígio que o público brasileiro em geral associa à marca e aos produtos ou serviços por ela assinalados; e
III. Grau de distintividade e exclusividade do sinal marcário em questão.
Cumpre ressaltar que para reconhecimento de alto renome, é necessário que a marca já esteja registrada no INPI com certificado de registro já expedido, formulando-se posteriormente, o pedido de reconhecimento como marca de alto renome, mediante peticionamento junto ao processo já existente no INPI da marca registrada, nos termos da resolução 107/13.5
Junto à petição de requerimento, deverão ser apresentadas as provas cabíveis à comprovação do alto renome da marca em âmbito Nacional, a resolução 107/13 recomenda que a comprovação se dê por meio de pesquisa de imagem de marca com abrangência nacional, sem prejuízo de outras provas, devendo conter as seguintes informações:
I. Extensão temporal da divulgação e uso efetivos da marca no mercado nacional e, eventualmente, no exterior;
II. Perfil e fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, e perfil e fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identificam a marca com os produtos ou serviços a que ela se aplica;
III. Perfil e fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, e perfil e fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identificam a marca
essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado;
IV. Meios de comercialização da marca no Brasil;
V. Amplitude geográfica da comercialização efetiva da marca no Brasil e,
eventualmente, no exterior;
VI. Meios de divulgação da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior;
VII. Valor investido pelo titular em publicidade e propaganda da marca na mídia
brasileira nos últimos 5 (cinco) anos;
VIII. Volume de vendas do produto ou a receita do serviço nos últimos 5 (cinco)
anos;
IX. Valor econômico da marca no ativo patrimonial da empresa;
X. Perfil e número de pessoas no Brasil atingidas pelas mídias em que o titular
anuncia a sua marca;
XI. Informações que ofereçam indícios de que está havendo diluição da capacidade distintiva da marca alegada como de alto renome ou de que a mesma esteja sofrendo aproveitamento parasitário por terceiros;
XII. Informações que evidenciem a identificação do público com os valores da
marca;
XIII. Informações que demonstrem o grau de confiança do consumidor em relação à marca.
Caso seja deferida, o próprio INPI procederá com a anotação no registro da marca, indicando o seu reconhecimento como de alto renome, passando a marca a constar na lista de marcas de alto renome, junto às outras que já tiveram o reconhecimento deferido. Tal anotação perdurará por 10 (dez) anos.
2. Da marca de alto renome - Excepcionalidade
Em decorrência dos requisitos objetivos e, mormente, os subjetivos, percebe-se o fato de que o deferimento das marcas a nível de alto renome detém um caráter excepcional, sendo necessária a comprovação não só formal, mas também a constatação de que uma marca de fato é prestigiosa e conhecida e, por consequência, merecedora de macular o Princípio da Especialidade das Marcas.
Por sobre a excentricidade do deferimento de uma marca de alto renome, leciona Adonis Filho6:
Exceto pela imposição legislativa trazida pela Lei Geral da Copa, temos somente 18 marcas de alto renome reconhecidas pelas vias normais, ou seja, analisadas e anotadas pelo INPI em procedimento competente para tanto.
Não obstante, essa timidez é naturalmente explicada pelo grau de importância que essa condição especial, que é o alto renome, representa. Para ser considerado de alto renome, a marca precisa exercer força atrativa sobre o público em geral, atraindo clientela de diferentes mercados pela sua simples presença, o que não é tarefa simples e requer uma boa gestão da marca somada a altos investimentos.
Salienta-se que o excerto do artigo supracitado foi confeccionado em 2013. À época, havia-se 18 marcas de alto renome reconhecida pelas vias normais. O ano de 2020 só registrou uma marca a nível de alto renome, a marca YouTube (nominativa), em 18/2/20.
Ademais, Elizabeth Lima elucida que o pedido de elevação de uma marca a caráter de alto renome é um ato de proteção a alguma ameaça:7
Entretanto, para o INPI, o AR é uma proteção à marca e somente deve ser concedida se esta estiver correndo algum risco provocado por terceiros. Ela visa a proteger a marca do aproveitamento parasitário, da diluição. Não se faz necessário outorgar o AR somente como um título de status ou reconhecimento de fama, mas sim com o objetivo de estender a proteção legal de uma propriedade, neste caso a marca.
Infere-se que não só há dificuldades no que diz respeito à subsunção de requisitos formais e subjetivos, mas também é necessário demonstrar um possível ferimento ao direito à proteção da marca, ou seja, pela via incidental.
3. Conclusão
Conforme demonstrado, a marca de alto renome é uma exceção ao princípio da especialidade, entretanto, a sua concessão depende de diversos critérios, por vezes, subjetivos.
A marca de alto renome é assim considerada nos casos em que o sinal, devidamente registrado, goze de renome que transcenda o segmento de mercado para o qual foi originalmente destinado e, por isso, goza de proteção em todas as classes.
Uma vez sendo concedida, à marca de alto de renome será assegurada uma proteção especial dentro do Território Nacional, uma vez que será vetado o registro em qualquer outra classe de produto e/ou serviço.
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1 Art. 122. São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais.
2 Revista CEPPG - CESUC - Centro de Ensino Superior de Catalão, Ano XIV, Nº 25 - 2º Semestre/2011. O Conceito de Marca e sua Proteção Jurídica. Guilherme Machado Aires.
3 Art. 125. À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade.
4 DANNEMAN, Siemensen Bigler & Ipanema Moreira. Comentários à lei de propriedade industrial e correlatos. Rio de Janeiro, São Paulo:Renovar, 2005, p 232.
5 Art. 2º A fim de poder gozar da proteção conferida pelo art. 125 da LPI, o titular de marca registrada no Brasil deverá requerer ao INPI o reconhecimento da alegada condição de alto renome de sua marca, por meio de petição específica, instruída com provas em idioma português.
6 MEDEIROS FILHO, Adonis Reis de. ANÁLISE DAS MARCAS DE ALTO RENOME EM VIGÊNCIA NO BRASIL. 2013. 10 f. Monografia (Especialização) - Curso de Direito, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão/Se, 2013. Disponível clicando aqui . Acesso em: 08 abr. 2021.
7 LIMA, Elizabeth Andrade Pereira. Marcas de Alto Renome: uma Abordagem sobre Proteção Marcária e Aspectos Mercadológicos. 2010. 144 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Ciências Humanas, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica/Rj, 2010.