Migalhas de Peso

O teletrabalho e o direito à desconexão

A tecnologia permite um contato imediato e, muitas vezes, desordenado por parte do empregador. Ocorre que, em razão disso, os empregadores passaram a ser questionados sobre o direito à desconexão do empregado. Mas o que seria isso e como o empregador deve lidar?

14/4/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Há um ano, os empregadores brasileiros se viram na obrigação de se reinventar, de forma totalmente abrupta e imprevisível, ante ao crescimento avassalador do número de infectados pela covid-19. Com isso, as empresas se depararam com a necessidade de realocar a sua mão de obra ou de, no mínimo, adequar a sua forma de prestação de serviços. 

Assim, nos casos em que a atividade empresarial permitiu que o trabalho fosse prestado à distância, os empregadores se valeram da implementação do teletrabalho, com base na Medida Provisória 927/20, para determinar que o serviço fosse executado fora de sua estrutura, onde os empregados tivessem maior segurança e o risco de contágio da doença fosse menor. 

Em que pese ter sido revogada a mencionada MP, devido à instalação da crise gerada pela pandemia no cenário nacional e da otimização do processo produtivo, muitas empresas ainda continuam se valendo do teletrabalho como forma fundamental de contratação. Nesse novo formato de trabalho, as relações laborais são regidas pelo art. 62, III, da CLT, em que se torna dispensável a verificação da jornada trabalhada. 

Nesse contexto, para suprir a necessidade de comunicação remota, empregadores e funcionários apossaram-se do uso de meios eletrônicos e tecnológicos que, por sua vez, tornaram-se fontes efetivas de produção técnica e intelectual à distância.  

A tecnologia permite um contato imediato e, muitas vezes, desordenado por parte do empregador.  Ocorre que, em razão disso, os empregadores passaram a ser questionados sobre o direito à desconexão do empregado. Mas o que seria isso e como o empregador deve lidar?  

O direito à desconexão é uma garantia de que o empregado não será demandado de forma indiscriminada em virtude do seu trabalho. Trata-se de direito constitucional e fundamental, em razão do qual o empregador deve assegurar a saúde e segurança de seu empregado. 

Por se tratar de uma dinâmica instituída recentemente, muitos empregadores ainda têm dificuldade de limitar os contatos remotos com o empregado que se ativa à distância. Assim, para lidar com esse novo contexto e evitar pedidos de dano moral, o empregador precisa ter em mente que a facilidade de comunicação inerente ao teletrabalho, deve, impreterivelmente, estar vinculada à garantia de que o trabalhador não pode estar disponível em tempo integral para atender as demandas patronais. 

Com essa conduta, os empregadores evitarão ou, ao menos, minimizarão os riscos relacionados ao ajuizamento de ações trabalhistas que tenham como objeto a verificação de horas extras e a reparação moral pelo tempo integral à disposição do empregador, bem como a instauração de procedimentos administrativos pelo Ministério Público do Trabalho. Por esta razão, sugere-se a implementação de políticas internas que visem resguardar, de forma institucionalizada, o direito à desconexão do empregado que atua em regime de teletrabalho.  

É preciso que o empregado tenha a faculdade de retornar o contato apenas quando disponível para retomar as atividades laborais, e ainda, tenha a liberdade de recusar determinada ordem quando emanada em horário incompatível com a sua execução. 

Colocados os limites quanto ao contato do empregador com o empregado que se ativa remotamente, acredita-se que essa modalidade de regime de trabalho é extremamente favorável a ambas as partes. Com isso, os empregados passam a ter total autonomia para gerir o horário de execução de suas tarefas, ao passo que os empregadores contam com a redução de despesas contratuais típicas, como vale-transporte e horas extras.

Além disso, com tais cuidados, o empregador minimizará os riscos desse novo pedido, que vem crescendo nos últimos tempos, conhecido como direito à desconexão. 

Júlia Eugênia Cruz e Campos
Advogada da área de Relações de Trabalho e Consumo da Andrade Silva Advogados.

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