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A advocacia preventiva sob o viés da mentalidade vuca

A advocacia preventiva está longe de ser exclusivamente relacionada à burocracia empresarial. A sociedade atual requer uma gestão jurídica estratégica, consequência da exigência da mentalidade VUCA e do atual mundo complexo.

1/4/2021

A mentalidade VUCA surgiu na década de 90, após a Guerra Fria. Trata-se de um conceito utilizado para explicar a complexidade e as incertezas da geopolítica mundial no pós-guerra. Já em 2008, diante da crise econômica mundial, tal mentalidade passa a ser aplicada no ambiente dos negócios que sofria com a insegurança e volatilidade do mercado.

Também denominado de mundo VUCA, seu conceito gira em torno da abreviação: Volatility, Uncertainty, Complexity and Ambiguity. Ou seja, mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo diretamente atrelado à transformação digitação.

A transformação digital trouxe conhecimento, velocidade, volatilidade, complexidade e ambiguidade para a sociedade, inclusive para a sociedade empresária. A informação tornou-se mais acessível, o ser conectado deu origem ou se originou, não é possível saber ao certo, o mundo complexo. Várias decisões sendo tomadas ao mesmo tempo diante de um mundo complexo, fora do controle e imprevisível. Os indivíduos se tornaram mais exigentes e, consequentemente, a atividade empresária se torna ainda mais difícil.

Os consumidores possuem ainda mais conhecimento do que antes, sabem exatamente quais são os direitos que os cercam, são os verdadeiros stakeholders. Não só os consumidores, mas os empregados detêm informações da relação trabalhista, estão mais pensantes do que nunca.

São tantas as exigências que podemos classificar o mundo VUCA como o verdadeiro caos.

Nos resta saber o que a advocacia preventiva tem a ver com a mentalidade VUCA.

Pois bem. Sobreviver nesse caos é algo difícil, principalmente diante da volatilidade e complexidade que ele trouxe. Ora, o novo mundo requer maior regulamentação e alterações legislativas em tempo recorde e, consequentemente, depende de tomadas de decisões, trabalho em equipe, resiliência e, portanto, boa gestão!

A advocacia preventiva visa, nesse “novo mundo”, auxiliar o empresário a gerir os riscos da atividade empresária. Alguns acreditam que o papel da consultoria jurídica é análise e elaboração de documentos e contratações para evitar demandas judiciais futuras, é gerir o risco daquilo que é previsível por qualquer homem médio. Pelo contrário, o advogado, na atuação preventiva, age como um gestor jurídico, porém, através de um escritório de advocacia. Seu papel? Gerenciar os riscos.

As novas regulamentações e alterações legislativas precisam de interpretação de um profissional do direito para que sejam assimiladas e efetivadas da melhor maneira possível, evitando ações judiciais e ações fiscalizatórias.

A advocacia preventiva não está atrelada apenas a consultoria preventiva, longe disso. Ter um advogado para atuar preventivamente é ter um escritório que conhece a atividade empresária exercida pelo cliente para que, desta forma, consiga identificar a causa das ações judiciais recorrentes e o setor “causador” da demanda. Ou seja, aquele capaz de criar um plano de ação que vise diminuir o volume das demandas judiciais agindo na causa raiz do problema.

A consultoria preventiva precisa auxiliar o empresário em diversos aspectos, em especial no provisionamento de valores envolvidos nas demandas judiciais, na análise estratégica das demandas mais recorrentes (causa de pedir do processo), na apreciação subjetiva dos processos, ou seja, se o setor demandado agiu corretamente, além de disponibilizar treinamentos específicos para cada um dos colaboradores.

Para alguns, mais conservadores, essa nova visão é equivocada, visto que a atuação preventiva invade a gestão empresarial. O intuito não é usurpar competências, mas atuar em cooperação e interdependência.

Não podemos deixar de citar a maior comprovação de todos os argumentos expostos, a Lei Geral de Proteção de Dados. Ora, todas as empresas foram obrigadas a reforçar a segurança dos dados pessoais, observando princípios constitucionalmente estabelecidos como liberdade e privacidade. Os profissionais do direito em conjunto com as demais áreas responsáveis pelo manuseio de dados foram requisitados pelos empresários no intuito de gerenciar o risco atrelado ao uso e tratamento dos dados pessoais. Isso é fruto daquilo que denominamos de transformação digital, o mundo complexo sendo regulamentado por consequência daquilo que lhe fez surgir.

Não nos restam alternativa senão concordar que quem agiu preventivamente nesse caos se viu em uma situação mais confortável, já que o caos depende do ponto de vista daquele que lhe observa.

Em um mundo complexo, volátil, ambíguo e incerto é imprescindível que a empresa seja composta por profissionais trabalhando em cooperação, e entre esses profissionais o advogado “gestor”, uma cabeça pensante com conhecimentos jurídicos que auxiliarão nas tomadas de decisões.

O gerenciamento de risco vai muito além do previsível. A mentalidade VUCA está em todos os lugares, inclusive do âmbito jurídico.

A realidade é: vivemos em um caos! Porém, a sua perspectiva de caos depende das ações estrategicamente pensadas para o convívio com o novo mundo.

Carolina Adães Fernandes
Advogada. Professora. Especialista em direito tributário, penal e processual penal. Coaching. Gestora de Projetos pela Harvard ManageMentor. Mentora em concursos jurídicos e OAB.

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