O Teste de Aptidão Física é comumente exigido em concursos da carreira policial, compreendendo uma etapa dentre as fases de habilitação do candidato ao cargo pretendido.
É um grande desafio, especialmente aos que não tem em sua rotina a prática de atividades físicas.
Normalmente os editais de concursos, das carreiras policiais, preveem a submissão de candidatos a testes como corrida, salto, testes de barra (estático e dinâmico), flexão abdominal, teste meio-sugado, dentre outros a depender da previsão editalícia.
Tendo em vista a previsão legal do sistema de cotas às pessoas com deficiência, em que mesmo os concursos de polícia civil têm obrigação de sujeitar-se [convido-vos à leitura do meu artigo sobre "Sistema de Cotas às Pessoas com Deficiência no Concurso Público"] é comum que os editais prevejam a submissão de candidatos Pessoas com Deficiência (PCD) aos testes de aptidão física, nas mesmas condições que os candidatos não-deficientes, sob o escopo da isonomia. "Condições iguais para todos", mas será?
Nesse sentido há falsa percepção de Isonomia entre os candidatos do concurso. Na medida em que todos são tratados igualmente, desprezando-se os desiguais na medida de suas desigualdades!!!
O direito à isonomia, ou à igualdade, está de fato assegurado na Constituição Federal brasileira.
O artigo 5º, caput, da Constituição Federal assegura mais do que uma igualdade formal perante a lei, mas uma igualdade material que se baseia em determinados fatores.
O princípio da igualdade pressupõe que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual: "Dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades" (NERY JUNIOR, 1999, p. 42).
Ocorre que a exigência da Prova de Aptidão Física para o cargo de Escrivão de Polícia Civil é desarrazoada, pois as atribuições do cargo, em regra, não incluem esforço físico.
As atribuições do escrivão de polícia são de natureza eminentemente administrativa e exigem aptidão mental e de saúde, mas não esforços físicos além daqueles cuja aptidão é detectável ao exame médico-admissional, o que torna desnecessário que, para o ingresso na carreira, o candidato seja aprovado em teste físico.
Nesse sentido pronunciou-se o Ministro Gilson Dipp, no julgamento do MS n. 8422/DF/STJ, veja:
"Cumpre esclarecer, agora, que o candidato portador de deficiência física concorre em condições igualitárias com os demais não-portadores, na medida das suas desigualdades. Caso contrário, a garantia de reserva de vagas nos concursos para provimento de cargos públicos aos candidatos deficientes não teria razão de ser".
Nesse feito, é comum que os candidatos que se sentem prejudicados, especialmente às pessoas com deficiência, busquem socorrer-se ao Poder Judiciário com vistas a satisfação de seus direitos na busca por uma igualdade proporcional porque não se pode tratar igualmente situações provenientes de fatos desiguais.
"O raciocínio que orienta a compreensão do princípio da isonomia tem sentido objetivo: aquinhoar igualmente os iguais e desigualmente as situações desiguais". (BULOS, 2002, p. 79).
O Decreto-Lei 3.298/99, que regulamenta a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, dispõe em seu artigo 37 que:
"Art. 37. Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.
§ 1º O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições, concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em face da classificação obtida". (g.n.)
Com esteio na Carta Magna (Art. 37, inc. VIII) é que esse artigo assegura às Pessoas com Deficiência a ampliação do acesso ao concurso público, quando em concorrência com pessoas que não gozam de limitações físicas ou mentais, por meio de ações afirmativas, também conhecidas como discriminações positivas que consistem em políticas estatais e privadas que visam a inclusão dos deficientes na sociedade, melhor dizendo, busca proporcionar a estes a efetiva igualdade de oportunidades a bens fundamentais, como o trabalho e. g..
O art. 34, §3º, da lei 13.146/15, prevê, quanto ao direito ao trabalho, vedação em sede de admissão à exigência de aptidão plena à PCD, ipsis litteris.
Art. 34. A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
§ 3o É vedada restrição ao trabalho da pessoa com deficiência e qualquer discriminação em razão de sua condição, inclusive nas etapas de recrutamento, seleção, contratação, admissão, exames admissional e periódico, permanência no emprego, ascensão profissional e reabilitação profissional, bem como exigência de aptidão plena. (destaco)
Esse mesmo entendimento é fundado na Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoas com Deficiência, que no Brasil tem status de emenda constitucional.
Pelo País a fora, esse direito é assegurado pelo Judiciário, segundo precedentes analisados nas mais diversas Cortes. Veja: STF: AIs 746.070, da relatoria do ministro Marco Aurélio; e 753.908, da relatoria do ministro Ricardo Lewandowski; bem como o RE 511.588-AgR, da relatoria do ministro Marco Aurélio; STJ: MS n. 8422/DF/STJ; TJMS: Apelação Cível - Nº 0800410-82.2018.8.12.0002, dentre outros.
Rui Barbosa, inspirado na lição de Aristóteles, já dizia "TRATAR IGUALMENTE OS IGUAIS E DESIGUALMENTE OS DESIGUAIS NA MEDIDA DE SUAS DESIGUALDADES” (LENZA, 2012, p. 973), isso sim é Princípio da Isonomia!
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LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
NERY JÚNIOR, Nélson. Princípios do processo civil à luz da Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
BULOS, Uadi Lammego. Constituição Federal anotada. São Paulo: Saraiva, 2002.
Site do STF.
Site do STJ.
Site do TJMS.