Há mais de um ano estamos passando por um período de pandemia do novo coronavirus (Sars-CoV-2), e para tentar conter o contágio, diversos governadores publicaram decretos de lockdown, restringindo o funcionamento de diversas atividades que não sejam consideradas essenciais, que foram, em grande parte do País, ratificado pelos prefeitos municipais.
Esse é o panorama atual em diversas cidades do Brasil: indústrias e comércios não considerados essenciais estão paralisadas; trabalhadores, quando possível, em regime de home office; falta de circulação do dinheiro; riscos de desabastecimento generalizado; toque de recolher em algumas cidades, enfim, um verdadeiro caos total.
Tudo isso, obviamente, trouxe e continuará trazendo algumas nefastas consequências, até mesmo porque é uma situação que se estende desde o mês de março de 2020: grande parte dos empresários não conseguem trabalhar e faturar, recebimentos são suspensos ou prorrogados, dificuldade na obtenção de créditos/capital de giro, dificuldade de pagamento dos colaboradores, e as contas não deixam de chegar.
Diante deste cenário, os empregadores precisam se reinventar para que não sofram a bancarrota ou se endividem neste momento que exige cada vez mais cautela.
Lembramos que durante o estado de calamidade pública decretado pela União em 20/3/20, com vigência até 31/12/20, o Governo Federal editou algumas medidas de enfrentamento para empregadores e empregados frente à crise provocada pela pandemia. Dentre elas, a MP 936/20, posteriormente convertida na lei 14.020/20, que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e o pagamento do Benefício Emergencial, viabilizando aos empregadores a suspensão temporária dos contratos de trabalho dos seus empregados, bem como a redução do salário proporcional à redução da jornada.
Entretanto, ante à ausência de prorrogação do estado de calamidade pública pela União, tais medidas não puderam mais ser adotadas a contar de 1/1/21, e desde então, com o recrudescimento da pandemia e, mais recentemente, com o avanço do contágio em razão da nova cepa do vírus e os novos decretos de lockdown, os empregadores se encontram desamparados e na persistente busca de soluções para a sobrevivência de sua atividade empresarial e para manter o emprego de seus colaboradores.
Bem da verdade, existe uma grande expectativa do retorno das medidas de suspensão do contrato de trabalho e redução do salário proporcional à redução da jornada ainda no mês de março de 2021, com duração de quatro meses e custeio do BEM (Benefício Emergencial) através de recursos do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, que é o fundo utilizado para custear o seguro-desemprego.
Mas até que isso aconteça, os empregadores vêm se valendo das medidas que tem em mãos para a sua sobrevivência e manutenção dos empregos, como concessão de férias, utilização das horas positivas existentes no banco de horas, e a modificação do regime de trabalho dos empregados de presencial para teletrabalho que, de acordo com o artigo 75-B da CLT, é "a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo."
Especialmente quanto ao teletrabalho, é importante que os empregadores tenham conhecimento de que, ainda que o empregado que se ative em tal regime não tenha a sua jornada de trabalho controlada nos termos do artigo 62, III, da CLT, é certo que o direito do empregado de não trabalhar fora do seu expediente deve ser obedecido, seja por obediência ao direito à desconexão, seja pelo risco do pagamento de horas extras, vez que os atuais meios de tecnologia e informação facilitam o acionamento do empregado.
Alguns Sindicatos tem se antecipado e firmado Convenções Coletivas de Trabalho Extraordinárias, com validade durante os períodos de lockdown, prevendo medidas de suspensão do contrato de trabalho, redução da jornada e do salário, instituição de banco de horas, férias individuais e coletivas, dentre outras, com o principal objetivo de salvar os empregos e dar fôlego para as empresas.
Ainda como medida de manter empregos e aliviar os empregadores, o artigo 503 da CLT, com redação pelo decreto lei 5.452/43, assim dispunha que em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, seria lícita a redução, temporária e geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente em até 25% (vinte e cinco por cento).
Posteriormente, foi editada a lei 4.923/65, revogando o artigo 503 da CLT, cujo artigo 2º dispõe:
Art. 2º - A empresa que, em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário-mínimo regional e reduzidas proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores.
É certo que estamos enfrentando uma situação de força maior, afetando a conjuntura econômica nacional. Por óbvio quando a empresa não funciona, não vende, ela reduz seu faturamento e, consequentemente seu lucro. Destarte, autorizada a redução salarial delineada no artigo 2º, da lei 4.923/65, sendo obrigatório o prévio acordo com entidade sindical representativa de seus empregados.
Citado dispositivo não conflita como teor do artigo 7º, caput e inciso VI, da Constituição Federal, pois, como exposto acima, a redução salarial só poderia ocorrer mediante negociação coletiva, restando hígido o texto constitucional.
Diante deste contexto, temos que em situações de instabilidade financeira como a que notoriamente as empresas se encontram atualmente sem a edição de medidas do Governo para manutenção do emprego, vislumbramos ser possível a redução salarial dos seus empregados em até 25% (vinte e cinco por cento), proporcional à redução da jornada de trabalho e respeitado o limite do salário mínimo vigente, pelo prazo máximo de 03 (três) meses, prorrogável por igual período, caso indispensável, conforme previsto no artigo 2º da lei 4.923/65, realizada por instrumento coletivo (ACT ou CCT), como requisito de validade do negócio firmado, em observância ao disposto no artigo 7º e inciso VI, da CF.
Destacamos que a Constituição Federal trata da possibilidade da modulação salarial mediante negociação coletiva, entretanto, não limita um percentual. De toda sorte, a jurisprudência nos norteia a acompanhar o percentual de 25%, observado o limite do salário-mínimo vigente.
Lembrando que essas são medidas extremamente necessárias para que as empresas possam ter mitigados os efeitos do coronavírus e consequente edição de atos normativos que vedam ou restringem o seu funcionamento normal.
Nada obstante tudo deve ser feito dentro da mais estrita legalidade, com a supervisão de profissional especialista, para que tais ações não gerem eventual futuro passivo trabalhista.