Migalhas de Peso

Ponderações sobre o usucapião familiar/afetivo perante a legislação brasileira

O usucapião Familiar/Afetivo e seus reflexos diante o sistema jurídico brasileiro, desde o seu surgimento legislativo pendurando até o ciclo atual desse segmento de aquisição de propriedade.

9/3/2021

(Imagem: Arte Migalhas.)

Usucapião familiar/afetivo – o inicio

Em 16 de junho de 2011, com o advento da lei 12.424, sendo esta uma normatização que trouxe diretrizes sobre o programa Minha Casa e Minha Vida, elaborou-se também uma nova espécie de usucapião especial urbana, denominada como usucapião pró-moradia, sendo conhecida popularmente como usucapião familiar ou afetivo. Nesta esteira, a referida lei institui o Artigo 1240-A no CC que preconiza a posse em imóvel urbano, no prazo de 02 anos, cuja área pendura até 250 m2, no qual a propriedade habitava com o ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o Lar, podendo obter para o uso familiar, entretanto, não pode ser proprietário de outro imóvel no âmbito urbano ou rural.

A modalidade de aquisição de propriedade discutida traz uma novidade que se foca na questão do prazo, sendo reduzidos para 2 anos, sendo o menor prazo exigido pelo legislador, ficando nítida, uma movimentação na era atual, na diminuição dos prazos existentes, propiciando uma resolução nas demandas com maior facilidade e agilidade. Importante salientar, com a epidemia de Covid-19 que acomete o mundo, o prazo aquisitivo para efeitos imobiliários e mobiliários, inclusive, para equivaler da titularidade do imóvel das modalidades do usucapião será suspenso no período de 12 de junho á 30 de outubro, mediante Artigo 10, do capitulo VII, da lei 14.010/20 (Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado). O abandono de lar, conforme mencionado no paragrafo anterior, se torna um dos elementos relevantes para concretização do desenvolvido usucapião, além disso, contempla todas as formas de relacionamentos, inclusive a união estável, mediante preconização de Flavio Tartuce (2017, p.132, 9º ed):

O abandono do lar é o fator preponderante para a incidência da norma, somando ao estabelecimento da moradia com posse direta. O comando pode atingir cônjuges ou companheiros, inclusive homoafetivos, diante do amplo reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, equiparada á união estável. Fica claro que o instituto tem incidência restrita entre os componentes da entidade familiar, sendo esse o seu âmbito de aplicação.

Insta esclarecer, o atinente Instituto, pode ser solicitado por casais que convivem em união homoafetiva, pois o Supremo Tribunal Federal, mediante julgamento da Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI 4277) e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (APDF 132) reconheceram a união estável pessoas do mesmo sexo, ou seja, como entidade familiar, não podendo haver distinções entre os casais devido a orientação sexual, neste contexto faz jus ao Principio da Igualdade em relação homoafetiva e entidade familiar que preconiza a uniformidade de direitos entre os casais. Nessa seara, se tem o enunciado 500 da V Jornada de Direito Civil traz a menção que a modalidade de usucapião na legislação (Artigo 1240-A do CC/02), abrange a propriedade em comum do casal e engloba todas as formas de núcleo familiar, inclusive as homoafetiva.

Cuida-se de analisar, o usucapião “pró-família”, por se contemplar num método originário de aquisição de propriedade, se engrandece proveniente direito de meação, bem como, pode ser observado na reflexão acima extraída, todos os casais podem recorrer ao atinente instituto, basta apenas ser comprovado o abandono do lar por uma das partes, e a outra remanescente permanecer residindo no imóvel, entretanto, se a parte requerente, já obtiver usufruindo das disposições do Artigo 1.240-A , ficara inapto para exercer outra vez, o direito de propriedade em analise.

Peculiaridades do instituto

Em épocas passadas, mas precisamente no Direito Romano, o usucapião de forma ampla, um dos métodos de realização de aquisição do domínio, pela posse de forma prolongada de um referido imóvel. È mister esclarecer, o emprego da terminologia usucapião se emprega no sentido masculino, conforme preconização de Roberto Senise Lisboa “...(usualmente se emprega a palavra com o artigo masculino antecedente, muito embora, originariamente, fosse do gênero feminino, orientação essa adotada pelo Código Miguel Reale)...”(2010, p.120, 4º ed), vale ressaltar, o instituto discorrido já se encontrava presente no direito quiritário (legislação aplicada no Direito Romano), no qual se autorizava para as pessoas que não fossem estrangeiro ou peregrino em obter aquisição do um bem, pelo exercício de uso distendido ao transcorrer dos tempos, mediante leis vigente na época.

No que concerne a competência para julgamento da respectiva ação judicial de usucapião familiar, apesar de embasar bens inerente ao casamento ou a união estável, logo se não se admite, a competência das Varas das Famílias para analise de processos desse viés, calha notar, o instituto pertence ao âmbito de direito civil, e ao episodio, se condiz ao bem imóvel, tendo assim, a competência do foro da situação da coisa, conforme dissertação do Artigo 47 do Novo Código de Processo Civil . Importante denotar, a propositura da ação do usucapião afetivo/familiar, não provem apenas da auto vontade do ingressante, e sim de outros diversificados fatores, nessa seara, se tem o entendimento de Tupinambá Miguel Castro do Nascimento (1992, p.105, 6º ed):

A demonstração de interesse de invocar a prestação jurisdicional tem forma especifica. Não basta haver exteriorização da vontade. Ela exige uma forma determinada, sem o que não se tem como completo o impulso oficial caracterizador da iniciativa com efeito de se ter a ação como proposta.

Nesse sentido, oportuna é a explanação dos legitimados para ingressar com a aludida ação, e consequentemente, as possíveis pessoas que poderá configura como polo passivo no cenário conflituoso.  No que se refere a legitimidade ativa para ação de usucapião afetivo/família é aquele cônjuge que exerceu durante o período de 02 anos, sem interrupções e oposições , a posse direta com exclusividade sobre o imóvel urbano com até 250 metros quadrados, no qual era vivenciada com o ex-cônjuge ou ex-companheiro que deserdou do lar , usufruindo para sua residência ou de sua família. Em suma, o ex-esposo ou ex-esposa são pessoas que devem compor a legitimidade para ser polo ativo na respectiva ação contra o parceiro que tenha se retirado do lar voluntariamente.  

Em relação ao polo passivo, se engloba o ex-cônjuge ou ex-companheiro, que abandonou o lar e se deixou transcorrer o prazo de 2 anos sem contradizer á posse do parceiro que permaneceu no imóvel, ou seja, aquele foi abandonado. Importante salientar, o imóvel usucapiendo também deve ser propriedade daquele que deserdou o imóvel. A citação da pessoa que esta registrada como proprietário se torna primordial na referida ação de usucapião, bem como, dos confrontantes, dos demais requeridos em localidade incerta e dos possíveis interessados.

Polêmicas concernentes ao assunto

Nesse posto de discussão, se torna de suma importância, em primeiro patamar examinar o Artigo 1240-A no CC num plano objeto e numa possível amplitude, em que traz a noção que apenas pode se atribuir a respectiva modalidade de aquisição de propriedade, se caso o imóvel estiver situado em ambiente urbano, mas por analogia, o referido dispositivo jurídico deveria ser aplicados aos requerentes habitantes em zonas rurais, devendo ao magistrado conceder o feito por questões análogas e também por se tratar de local aonde envolve “ moradia do casal”. Sob esse palio, se mostra interessante a preconização de Silvio de Salvo Venosa (2017,p.197, 17º ed):

Outra questão que pode trazer certa celeuma é o fato de o legislador ter restringido essa modalidade de usucapião ao imóvel urbano. Não pode deixar de ser aplicado o principio se o casal é titular de imóvel descrito no texto, situado em área rural, mas utilizado para moradia.

Desse modo que, se a retirada obrigatória de uma das partes que integram o polo matrimonial se tornar oriunda de ordem judicial, como exemplo, medidas acautelatórias derivadas da Lei Maria da Penha (lei 13.340/06), nesse caso e de outros não se contara a prescrição aquisitiva, pois o “abandonador (a)”  retirou-se da residência por medida judicial, mesmo sendo o elaborador da causa da ordem que a Justiça determinou devido as péssimas condutas. O abandono se realça na omissão exercício de atos de posse no imóvel (objeto do usucapião) , sendo de forma voluntaria, imotivada e permanente. Por outro lado, se o “abandonador” auxiliar no custeio do imóvel, como pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), taxas condominiais, reformas e outros, com esses fatores estará executando atos possessórios que podem impedir o animus domini do requerente.

No caso em tela, a finalidade de promover a moradia de quem ficar no imóvel, em primeira linha, parece transgredir a isonomia, pois o cônjuge que abandonou é punido pela conduta de sair do imóvel comum. Importante denotar, o mencionado método de aquisição da propriedade se averigua pela atitude de quem ficar na posse e a executa também, por sua vez, aquele que apresentar omissão na sua incumbência de proteger a propriedade e não realizar qualquer ato que objetiva a preservação, desacatando assim, o principio do uso social em nível constitucional.

De modo que, se o abandono for decorrente de um consenso entre as partes envolvidas se tornava incabível a concretização do usucapião familiar/afetivo. Vale ressaltar, o saída do lar, não se pode avaliar como pressuposto jurídico para ruptura matrimonial, entretanto, poderá se consolidar ao usucapião em prol do parte remanescente ao imóvel habitado. Por conseguinte, a deserção ou fuga devera ser proveniente conduta espontânea e unilateral para ser deferido na aludida espécie de usucapião discutida. Insta esclarecer, o tema discutido no concernente Artigo, envolvem aspectos principiologicos de âmbito constitucional e direito coligados ao nível sociais, (insculpidos no Artigo 6 do Texto Constitucional) , vale ressaltar, os desdobramentos que o assunto podem alavancar e colocarem em primeiro plano algumas valores essências aos Seres Humanos, mediante pronunciamento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2019, p.287, volume 5):

Com efeito, estamos diante um instituto que, além de imprimir concretude ao principio da função social, resguarda o direito constitucional á moradia, preservando a estabilidade de quem permaneceu exercendo atos de posso sobre o imóvel que, até então, serviu de lar para o núcleo afetivo que se desfez.

A Fluidez do prazo prescricional se encontra em outra indecisão que integra o assunto, contudo, boa parte da doutrina considera que o respectivo período somente poderia ser contabilizado, a partir da divulgação do divorcio ou extinção da União Estável, tendo discernimento, esta linha de entendimento, pois anteriormente, não se pode falar na titulação de ex-cônjuge ou ex-companheiro. Importante salientar, a inadmissibilidade de executar a prescrição entre as partes envolvidas, se houver da existência do vinculo conjugal, conforme dissertação do Artigo 197, I do CC/02. Tecendo comentários acerca do assunto, a separação em vias de fato, pode se tornar o período inicial para contagem do prazo do usucapião familiar/afetivo, se consumado o abandono voluntario do lar por uma das partes envolvidas.

Com base nas informações acima aduzidas, se tem a noção que a referida aquisição de propriedade com o prazo atinente, apenas pode ser acionada, após o advento da Legislação condizente (lei 12.424/11) para ser consumado o requisito que necessita perante a Lei como um dos fatores primordiais. Vale ressaltar, se o bem imóvel, estiver incorporando em objeto de litígios em nível judicial ou extrajudicial, não ficara demonstrada, a retenção ao usucapião, não sendo algo de inclusão ao cenário, por outro lado, se o conjugue ou companheiro que se ausentou do lar demonstrar comunicação de forma anualmente à outra parte que permaneceu no imóvel, sendo caso, inviável a computação do prazo.

CONCLUSÕES

Com base em fundamentos jurídicos e informações explanadas no mencionado Artigo, se traz uma ótica que o usucapião Familiar/Afetivo encontra-se em fase de implantação na Justiça Nacional, com possibilidade de aplicação em todo território nacional, se estender o feito para a população rural mediante posicionamentos jurisprudenciais e por fontes análogas do Direito. Importante salientar, o assunto teria uma evolução com efeitos eficazes para a Sociedade, bem como, aos operadores das Ciências Jurídicas, se obtivesse uma complementação jurídica na legislação pertinente para ter uma amplitude maior, além disso, se tivesse a presença de outros julgados relevantes dos Órgãos Supremos á nível nacional como ferramenta de suma importância da Flexibilização do assunto para aqueles que necessitarem.

Outro fator importante, a ser estabelecido se torna nos requisitos inerentes da “culpabilidade na dissolução do vinculo conjugal”, e no “abandono do lar“, discutidos neste artigo, pois como já discorrido, existem inúmeros formas de relacionamentos entre as pessoas, e o fator da culpa e a saída do conjugue abandonador da moradia onde habitam as partes. Nesse vertente, se tem a necessidade de averiguar o contexto social e financeiro que envolve ambos com a respectivo razão do a ruptura matrimonial, e não puramente adequar uma suposta culpa e decretar um abandono sem ter que avaliar o cenário convincente.

Com essas questões, se sanadas se destina em prol convívio familiar benéfico, tendo assim, uma harmonia em sociedade, sendo a atinente Usucapião apenas um detalhe que não interfira significativamente na Civilização, tendo em vista, a convivência não terá efeitos negativos no cotidiano das pessoas interligadas ao caso concreto, considerando que, atualmente as pessoas estão finalizando suas relações conjugais de forma traumáticas deixando sequelas graves aos filhos e pessoas que convivem em suas proximidades.

Por fim, o assunto possa apresentar como alicerce para o analise e crescimento de outros assuntos coligados, para propiciar benefícios á sociedade, levando em conta, os órgãos no âmbito jurídicos, recentemente, apresentam fragilidade e lentidão nas suas atuações e consequências para aqueles que suprem de uma decisão judiciaria. Antevejo a relevância, na minha visão de pós-graduando e estudante eterno do das Ciências Jurídicas, somou imensamente o meu crescimento em confeccionar o respectivo artigo, onde me sinto vitorioso em publicar o mesmo com o escopo dos demais profissionais examinarem se interessando pelo tema, além disso, instruindo como apoio de pesquisa para elaboração de trabalhos do gênero.

__________

DO NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro. Usucapião. 6 ed. Rio de Janeiro: Aide Editora, 1992.

GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil - Volume 5 – Direito Reais. 9 ed. São Paulo: Saraiva Educação,2019.

LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil. 4 ed. São Paulo: Editora Saraiva,2010.

TARTUCE, Flavio. Direito Civil – Direito Reais. 9 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2017.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil – Direito Reais. 17 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2017.

Nilson Costa Souza
Bacharel em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul/Campus São Miguel Paulista (2014), Advogado inscrito na Subseção de São Miguel Paulista (SP) e atuante no Escritório Costa Souza Advocacia e Consultoria Jurídica (Fundado em 2017), Especialista em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito (2016) Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Paulista de Direito (2017),Pós-graduado em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale (2020), Especialista em Direito e Processo Civil pela Faculdade Legale (2020) e Integrante do Núcleo de Pesquisa e Escrita cientifica do Legale Educacional.

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