Desde o início deste ano o WhatsApp vinha avisando seus usuários brasileiros sobre “novos termos de privacidade”. O aplicativo pedia o aceite para o compartilhamento de novos dados com o Facebook, o que seria realizado a partir de 8 de fevereiro. Essa notificação causou grande insegurança em seus usuários, uma vez que a mensagem não continha os esclarecimentos necessários sobre quais dados seriam compartilhados com a rede social. Também, não informava quais as finalidades específicas do compartilhamento. E o mais grave: não permitia a recusa dessa política.
A falta de confiança e a consciência do cidadão acerca de seus direitos à privacidade e proteção de dados levaram à busca por aplicativos concorrentes. Alternativas como Telegram e Signal foram baixadas milhões de vezes desde que a notificação surgiu para usuários do WhatsApp. Essa movimentação fez com que os gigantes WhatsApp e Facebook recuassem, anunciado o adiamento do início de sua nova política de privacidade para 15 de maio. Segundo a empresa, a extensão do prazo servirá para que as pessoas "tenham mais tempo de entender a política".
Todavia, são evidentes o impacto do mercado e o efeito nocivo à imagem do WhatsApp — que pretende usar seus dados para direcionar anúncios e personalizar a experiência do usuário em outras empresas do grupo, como Facebook, Messenger e Instagram. Ademais, o aplicativo abrirá mão da criptografia de ponta a ponta na versão business, que até então era padrão.
Por outro lado, chamou a atenção da comunidade jurídica que as novas regras do WhatsApp não estejam de acordo com a LGPD, em vigor de forma parcial desde setembro de 2020. Para que o aplicativo possa compartilhar os dados de seus usuários com as outras empresas do grupo com finalidade diferente do serviço de mensagens, é necessário haver uma base legal para o novo tratamento de dados. Porém, o consentimento, nos termos propostos, não tem validade de acordo com o artigo 5º, inciso XII, e o artigo 8º, parágrafo 8º da LGPD. Isso porque não é livre. Caso o usuário não aceite prontamente a nova política de privacidade, incorrerá na perda do serviço, restando configurada a prática abusiva do take it or leave it, que retira a real escolha do indivíduo.
Ademais, há evidente falta de transparência, pois as informações completas sobre o compartilhamento não são reveladas instantaneamente, havendo despeito ao artigo 6º, inciso VI da LGPD, bem como ao artigo 4º do CDC. Curioso é o fato de que o regramento anunciado pelo aplicativo não será aplicado na União Europeia, em razão de negociações que já haviam sido feitas com as autoridades dedicadas à proteção de dados. Parece que o Whatsapp quer tirar proveito da situação no Brasil, uma vez que as sanções administrativas ainda não estão em vigor na LGPD e que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados brasileira, apenas recentemente constituída, não conta com atuação nos moldes europeus.