No decorrer dos anos temos constatado um crescimento no número de locações por temporada através de meios digitais e aplicativos de internet, sendo o mais conhecido atualmente é o sistema Airbnb.
Por exemplo, no sistema Airbnb, os proprietários cadastram seus imóveis em um site, informando as características deste imóvel e as condições da locação, sendo que as negociações ocorrem diretamente entre os chamados “hospedes” e o “anfitrião”.
Ocorre que com o aumento desta modalidade de locação por temporada, síndicos e condôminos ainda têm demonstrado muita preocupação, principalmente no tocante a segurança pelo grande fluxo de pessoas desconhecidas (e muitas vezes estranhas) dentro das dependências do condomínio, como também por supostamente existir um desvio de finalidade no uso das unidades, o que (em tese) é vedado de acordo com o Código Civil.
Hoje as locações por temporada são regidas pela lei 8.245/91, conhecida como Lei do Inquilinato, que dispõe em seu artigo 48 que as locações por temporada são aquelas que não excedam a 90 (noventa) dias e são destinadas a residência temporária do locador.
Artigo 48. Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.
Porém, observamos que as locações por temporada através destes sistemas digitais podem se assemelhar com a prática hoteleira, pois geralmente são locações que ocorrem por curtíssimo espaço de tempo, porém não há nenhuma decisão judicial ou jurisprudência pacífica sobre o assunto, havendo os mais diversos tipos de decisões, tanto favoráveis quando contrárias a esta prática.
Neste sentido existem fatores que podem ser considerados contrários essa prática de locação.
O primeiro fator contrário a estes sistemas seria o desvio de finalidade. O artigo 1336, IV do Código Civil estabelece que todas as unidades do condomínio devem ser destinadas para ao mesmo fim, ou seja, se o condomínio for exclusivamente residencial essa espécie de locação em tese seria vedada por ter características comerciais, havendo assim o desvio de finalidade no uso da unidade.
Artigo 1336. São deveres do condômino:
(...)
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação (...).
Um segundo fator contido neste mesmo artigo é que nenhum condômino pode utilizar a sua unidade de maneira prejudicial ao sossego, a salubridade e a segurança dos outros condôminos.
Dessa forma, ao realizar a locação da sua unidade para um desconhecido, o locador estaria colocando em risco o sossego e a segurança de seus vizinhos, atrapalhando assim, a harmonia de viver em condomínio.
Artigo 1336.
(...)
IV - (...) não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.
O terceiro fator seria uma possível vedação dessa prática em condomínios por conta da Lei nº 11771/2008, que trata sobre hospedagens de turismo, pois para que essa espécie de prática em condomínios fosse válida seria necessário que a residência estivesse cadastrada junto ao Ministério do Turismo e atendesse certas exigências.
Alguns juristas entendem que a falta de lei específica sobre assunto pode coibir este tipo de locação, pois tal prática não se assemelharia a locação por temporada e necessitaria de regulamentação própria para sua operação.
Paralelo a isto, existem fatores favoráveis a essa espécie de prática locatícia.
De acordo com o artigo 1335, I do Código Civil, o condômino pode usar, gozar e livremente dispor de sua unidade. Como por princípio do direito privado, tudo que não é proibido, é permitido, o proprietário da unidade poderá realizar esse tipo de locação, cabendo a ele fazer com que o locatário do seu imóvel cumpra todas as regras existentes no condomínio.
Outro aspecto é que a Lei do Inquilinato não dispôs de um período mínimo para a locação por temporada, determinando apenas um prazo máximo, qual seja, 90 dias, assim como, por se tratar de lei federal, as normas dos condôminos não poderiam sobrepor seus dispositivos, de forma a vedar essa espécie de locação.
No final de 2019, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ iniciou o julgamento que vai definir se um condomínio residencial pode proibir a oferta de imóveis para aluguel por meio de plataformas digitais como o Airbnb com o voto favorável do Relator, Ministro Luis Felipe Salomão.
De acordo com o voto do Ministro, as locações por temporada, via Airbnb e/ou através de outras plataformas virtuais, não se assemelham ao conceito de hospedagem, fato este que impossibilita a sua vedação pelo condomínio, assim como não pode ser enquadrada como atividade comercial passível de proibição, uma vez que, em tese, a referida prática está aparada pela Lei do Inquilinato, violando assim, o direito de propriedade, caso a locação seja proibida.
Dessa forma, como o avanço da nova economia global, onde muitas relações estão concentradas nos meios digitais, os condomínios deverão se adaptar a essa nova realidade criando mecanismos que possam trazer conforto e segurança aos seus moradores, bem como permitindo essa modalidade de locação por temporada muito utilizada em nossos dias.