No dia 12 de dezembro deste ano o Senado Federal aprovou o PL 4253/20, o qual é um substitutivo do projeto de lei da Câmara dos Deputados, e que revoga a lei 8.666/93, (que institui normas para licitações e contratos da administração pública), revoga ainda a Lei 10.520/2002, (lei do pregão), e a lei 12.462/11(do regime diferenciado de contratações públicas), altera o Código de Processo Civil e a lei de concessões lei 8.987/95, a lei 11.079/04, o Código Penal.
Este projeto de lei aprovado pelo Senado ainda aguarda sanção presidencial para se tornar lei, o texto aprovado vem sendo chamado de marco regulatório de licitação e contratos administrativos no Brasil, em substituição a uma lei de licitações da década de 90 que é considerada por muitos como defasada e ultrapassada, e por isso precisava de alterações urgentemente, é neste cenário que após muitas emendas e substitutivos em ambas as casas do Congresso Nacional surge o marco regulatório que será a nova lei de licitações no Brasil, importante ainda destacar que este marco regulatório não se aplica as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiárias, regidas pela lei 13.303, de 30 de junho de 2016, ressalvado o disposto no art. 178 do projeto de lei 4253/20 (Nova lei de licitações).
No entanto, é preciso reconhecer que apesar de avanços importantes este projeto de lei aprovado, ainda ficou aquém do que se esperava, pois apesar de algumas inovações, ainda repetiu muitas das legislações que já existem, ademais em alguns pontos será necessário aguardar para se verificar os desafios na prática, pois muitas vezes uma lei parece perfeita no papel, mas quando da sua aplicação prática ela não é tão boa como parece.
Embora ainda existem passos desafiadores a frente, fato é, que já temos uma nova lei de licitações e que precisa sim, ser comemorada, pois avanços importantes aconteceram e assim essa nova lei pode-se dizer que está calcada em quatro pilares que são: (i) O planejamento que deve existir por parte da administração pública; (ii) uma maior transparência com os gastos públicos; (iii) a economicidade com o dinheiro público, (iv) combate a corrupção.
Ao analisar pormenorizadamente esta novíssima lei recentemente aprovada pode-se perceber o enfoque que o legislador deu a alguns velhos conhecidos problemas que muitas vezes travavam o procedimento licitatório, ou que geravam maiores gastos de tempo e de dinheiro ao Estado, pois bem, esta lei parece que tem a pretensão de aparar algumas arestas com relação a alguns problemas que acontecem no dia a dia de quem trabalha com procedimentos licitatórios, seja por parte do Estado ou seja por parte da empresa contratada, como: a falta de planejamento nas licitações frustradas e nas inexecuções contratuais, excessivas dispensas de licitação, superfaturamento na aquisição de produtos e serviços, obras inacabadas, e muitos outros exemplos, e que só geram prejuízos a sociedade como um todo, fraudes aos processos licitatórios e por aí vai, são inúmeros os problemas que acontecem.
No entanto, é sabido de que a nova lei não é a tabua de salvação, mas pode-se dizer que avanços importantes ocorreram, sendo que agora existirá uma fase preparatória e obrigatória de planejamento.
Importante também citar a economicidade que pode ser traduzida pela inversão de fases entre a habilitação e a apresentação de propostas que a nova legislação traz, o que deve reduzir o trabalho gerando assim uma economicidade de tempo e também de eficiência ao procedimento, isso sem falar nos prazos dilatados, que com certeza gerarão um fôlego maior para ambas as partes.
Já quanto a uma maior transparência pode ser percebida quando a nova lei de licitações cria o portal nacional de contratações públicas, importante instrumento a serviço da população, que poderá fiscalizar cada item e cada gasto público de sua região, esse portal buscará centralizar os dados de licitações e contratos celebrados pela União, pelos Estados e pelos Municípios, desta forma qualquer cidadão poderá ter acesso a todas as aquisições e gastos públicos de qualquer ente federativo, este pode ser considerado um avanço importante, pois as informações vão estar a disposição de quem desejar saber mais sobre a sua região, outra inovação bastante interessante da nova lei é quanto a forma das licitações eletrônicas, e se forem presenciais precisarão serem gravadas em áudio e vídeo e anexadas ao processo administrativo.
Desta forma, acredita-se que esses avanços foram importantes, apesar como já dissemos acima, ainda precisaremos verificar na prática como se dará essas implementações, mas será de grande valia para o país, que precisa de investimentos públicos, de transparência e eficiência nas contratações para que o país possa se desenvolver socio e economicamente .
Este artigo não tem o escopo de trazer todas as alterações que ocorreram a respeito do tema com a aprovação do marco regulatório, mas trazer as principais alterações que segundo a nossa ótica traz mais impactos e que poderão também advir debates e discussões.
Portanto o texto aprovado possui como principais alterações:
1. A figura das contratações integradas – que não são uma inovação da nova lei, pois já havia previsão na lei de regime diferenciado de contratações e na lei que disciplinam as regrais das estatais , a lei 13.303/15, sendo que neste tipo de contratação o projeto e a execução e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto ficam a cargo do contratado, esses projetos envolvem uma maior complexidade, e com esse tipo de contratação reduz os diversos contratos e relações obrigacionais que por óbvio possam trazer problemas para a administração.
2. A inclusão da figura do credenciamento, que embora já utilizado pela administração, não estava expressamente prevista na lei 8.666/93, sendo fruto de uma construção doutrinária e jurisprudencial, sendo o credenciamento uma espécie de chamamento público em que a administração convoca interessados em prestar serviços ou fornecer bens para que se credenciem, onde não existe competividade, a intenção é a contratação com todos os interessados, um exemplo disso pode ser citado como o credenciamento de instituições financeiras que pretendem fornecer empréstimos consignados aos servidores públicos, onde todas as instituições credenciadas poderão fornecer esses serviços e o servidor poderá escolher qual instituição mais se adequa ao seu interesse, ou que tem as melhores taxas bancárias por exemplo.
3. A inclusão da arbitragem como método de resolução de conflitos nos contratos da administração pública, apesar da lei 13129/15 que alterou a lei de arbitragem no Brasil, já ter inserido essa possibilidade, ainda havia vozes contrárias sobre o tema, com o argumento de que a lei de licitações não previa a possibilidade de arbitragem e mediação nos contratos com a administração pública, ou apenas naqueles contratos vultuosos, pois bem, está aí para por fim a celeuma, o art. 150 do texto aprovado pelo Senado prevê a possibilidade de ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem, nos casos de controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações.
4. O contrato de eficiência que é aquele contrato cujo objeto é a prestação de serviços, e que possui como objetivo proporcionar economia ao contratante, na forma de redução de despesas correntes, remunerado o contratado com base em percentual da economia gerada;
5. O seguro-garantia que apesar de já existir em nossa legislação, ganhou um incremento, já que agora o seguro garantia é de até 30% do valor do contrato, então espera-se assim, que diminuam os “elefantes brancos” e as obras inacabadas, esse seguro deve garantir o fiel cumprimento das obrigações assumidas pelo contratado;
6. Matriz de risco - Definição de matriz de risco, que são os mais variados problemas que podem ocorrer durante a execução do contrato, incluindo esse valor no preço, para segurar a Administração durante a vigência contratual, no entanto, a critica neste ponto, é que como poderá se prever com exatidão os valores antecipadamente.
7. Agente de contratação - que se afigura como uma inovação e que segundo a lei vem a ser a pessoa servidora pública que tomará as decisões na licitação e que poderá ser auxiliado por equipe que o ajudará nesta tarefa, na prática essa pessoa terá maiores responsabilidades, do que uma comissão onde existe essa divisão de responsabilidades, a critica neste ponto, é que será difícil achar um servidor que queira assumir esta árdua tarefa, onde a responsabilidades estarão concentradas em uma única pessoa.
8. A inversão de fases, que já ocorria na lei do pregão e que foi unificada nesta nova lei de licitações, onde a fase do julgamento das propostas é anterior a habilitação, com a inversão de fases com certeza se ganhará tempo e haverá celeridade nas contratações.
9. Maior transparência – com a criação do portal centralizado de contratações de todos os entes da federação, onde todos os cidadãos poderão consultar as aquisições e compras, e com as licitações na forma eletrônica e quando forem justificadamente presenciais, deverão ser gravadas em áudio e vídeo, importante avanço na diminuição de acertos e fraudes, sendo importantes instrumentos de combate a corrupção.
10. Planejamento – com a criação da fase preparatória que já acontece na lei do pregão e que agora também fará parte do marco regulatório, onde as leis pregão, e do regime diferenciado de contratações foram unificados no marco regulatório, o planejamento como fase preparatório deverá diminuir as inexecuções contratuais e as licitações frustadas.
11. Criação de nova modalidade de licitação – o diálogo competitivo, e que já está causando debates, mas que nada mais é do que uma modalidade de licitação que envolve soluções inovadoras para a contratação de obras, serviços ou compras de valores maiores que os praticados normalmente, onde os licitantes interessados apresentam propostas e soluções a administração.
12. Cria e tipifica crimes relacionados as contratações – diversos crimes foram criados e o crime de fraude a licitação agora será punido com pena de reclusão de 4 a oito anos, bem como os casos de contratação direta ilegal e frustação do caráter competitivo de licitação, que também possuem a mesma penalidade.
13. Concessão de serviço público e parceria público privada também poderá ser na modalidade concorrência ou dialogo competitivo, pois ambas as legislações foram alteradas, tanto a lei de concessões como a lei de parceria publico-privada, onde geralmente os contratos possuem valores vultuosos e de maior complexidade.
14. Possibilidade dos contratos de serviços e fornecimentos contínuos serem prorrogados sucessivamente, até o prazo de 10 anos.
15. Dispensa de licitação com valores maiores - que agora será de 50 mil para compras e serviços e 100 mil para obras e serviços de engenharia .
16. Critério de julgamento – inovação e criação do critério de julgamento pelo maior retorno econômico, ( nos contratos chamados de contratos de eficiência), onde a administração contrata o serviço que vai gerar mais economia para a administração e a remuneração é variável de acordo com a eficiência, o critério de maior desconto e o de melhor técnica ou conteúdo artístico
17. Procedimento de Manifestação de Interesse, que foi incluído no art. 80 do texto aprovado, onde a Administração poderá solicitar à iniciativa privada, mediante chamamento público a realização de projetos de soluções inovadoras que contribuam com questões de relevância pública.
Essas são algumas das principais mudanças do texto aprovado pelo senado e que aguarda sanção do Presidente da República, desta forma vamos aguardar e verificar como se dará na prática a implementação dessas mudanças, certamente terá muitos desafios pela frente.
Mas o que deve ser comemorado é que após quase três décadas a nova lei foi aprovada, e forçoso reconhecer que o legislador buscou aplacar os anseios da sociedade, apesar da lei ter ficado aquém das expectativas e julgada por alguns como ainda mais burocrática, deve-se reconhecer que avançou em passos largos no tocante a uma exigibilidade de planejamento do gestor público, buscando evitar desperdícios de recursos públicos, uma maior transparência possibilitando a sociedade uma fiscalização mais efetiva , uma economicidade de tempo e de dinheiro público e também criou mais mecanismos e instrumentos de combate a corrupção.