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A importância prática da classificação jurídica dos contratos

As relações contratuais, principalmente empresariais, são compostas comumente por diversas obrigações simultâneas, muitas vezes complexas, fazendo com que a importância da classificação ganhe maior destaque.

5/11/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

A classificação jurídica dos contratos, em uma primeira análise, pode parecer não ter muita utilidade prática, não apenas em virtude das diversas divergências acadêmicas encontradas, mas também porque se criou um estigma de que a maior parte das relações contratuais já estão enraizadas nas entranhas da sociedade e, portanto, ao menos em tese, empiricamente já se sabe o que esperar de cada um dos tipos contratuais.

Contudo, as relações contratuais, principalmente empresariais, são compostas comumente por diversas obrigações simultâneas, muitas vezes complexas, fazendo com que a importância da classificação ganhe maior destaque, dado que as partes envolvidas poderão se valer das particularidades, natureza e até mesmo da própria classificação para conseguirem examinar de maneira mais profunda e precisa o modelo contratual escolhido, principalmente em caso de inadimplemento.

Os contratos, de um modo geral, podem ser classificados quanto à (I) carga de obrigação das partes (unilaterais, bilaterais ou plurilaterais), (II) vantagens patrimoniais (gratuitos ou onerosos – aleatório/comutativo), (III) condições do negócio (paritários ou adesão), (IV) momento de execução da obrigação (instantânea, diferida ou de trato sucessivo), (V) qualidade das pessoas (personalíssimos ou impessoais), e, ainda, sem prejuízo de eventuais outras classificações, (VI) quanto à previsão legal (típico, atípico – puro ou misto).

Nas palavras do professor Sílvio de Salvo Venosa Nesse a classificação dos contratos é essencial para “posicionar corretamente o negócio jurídico no âmbito do exame de seu adimplemento e inadimplemento, questão crucial para o jurista”.

Evidente, portanto, que a classificação dos contratos não tem fins meramente acadêmicos e deve ser levada em consideração pelas partes e operadores do direito para melhor análise e projeção das obrigações contratuais.

Para contextualizar a importância prática da classificação, oportuno destacar que o processo de digitalização da nossa sociedade, embora inegavelmente represente o progresso, tem incentivado as partes envolvidas a se valerem de modelos contratuais prontos que precisam apenas do preenchimento de determinadas lacunas ou ajustes superficiais.

Contudo, munidas de tais modelos, paralelamente se fortaleceu um movimento em que as partes, simplesmente por economia, deixam de procurar preventivamente profissionais especializados na elaboração e revisão de documentos para utilizarem modelos prontos e se socorrerem a estes apenas quando o litígio já não é mais uma opção, mas inevitável, sendo que o investimento acaba sendo muito maior para a resolução de um problema já criado do que na mitigação do mesmo através de um bom contrato.

Ora, é evidente que nem mesmo a melhor redação dada a um contrato pode garantir de forma absoluta que não haverá qualquer discussão relacionada às obrigações ali previstas, muito menos afastar os riscos de um litígio. Mas, sem dúvida, pode fortalecer a posição da parte em eventual litígio.

Assim, é inquestionável que a assessoria de profissionais especializados desde o início das negociações e elaboração do contrato, permitindo que o instrumento efetivamente represente a vontade das partes e tutele os interesses de seu cliente, trará maior fluidez não apenas durante a vigência da relação contratual, mas também potencializará as chances de composição em caso de litígio, bem como viabilizará os prognósticos de probabilidade de êxito.

Os ensinamentos de Rui Barbosa ainda ponderam a importância da classificação jurídica ressaltando o quão essencial é o uso apropriado da linguagem contratual, uma vez que “não é pela técnica das classificações e subclassificações mais ou menos argutas, mas pela acepção normal dos termos da linguagem usual, que se há de escrutar a intenção das partes, na hermenêutica dos contratos”.

Nesse sentido, a correta utilização dos modelos contratuais disponíveis em nosso ordenamento jurídico, respeitando a classificação jurídica do contrato e, ainda, fazendo uso de linguagem precisa, evidentemente através da contratação de profissionais especializados, permitirá que as partes efetivamente traduzam suas intenções no instrumento contatual e alcancem seus objetivos.

Evidente que há diversas dúvidas e questionamentos sobre os riscos e benefícios de tentar prever todas as possibilidades em uma relação contratual, visando a minimizar a teoria dos contratos incompletos, principalmente em virtude dos custos de transação, mas isso abordaremos em nova oportunidade.

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*Elisa Junqueira Figueiredo é sócia do escritório Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados.





*Bruno Maglione é advogado do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, responsável pelas áreas de contencioso cível, arbitragem e imobiliário.

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