No Brasil, é inegável e perene a relevância estratégica do setor sucroalcooleiro, diante seja da essencialidade dos produtos, seja da demanda advinda do mercado nacional e/ou internacional e seja, ainda, do imprescindível equilíbrio entre o derivado alimentício e o energético.
Trata-se de uma das mais importantes commodities brasileiras, que tem merecido não apenas constante regulação interventiva, mas também decisões do STF, v.g: “a intervenção estatal na economia, mediante regulamentação e regulação de setores econômicos, faz-se com respeito aos princípios e fundamentos da Ordem Econômica” e de que “o estabelecimento de regras bem definidas de intervenção estatal na economia e sua observância são fundamentais para o amadurecimento das instituições e do mercado brasileiros, proporcionando a necessária estabilidade econômica que conduz ao desenvolvimento nacional.” (RE 422.941, DJ 24/3/06).
Nesse julgado de 2006, o relator min. Carlos Velloso destacou que “a fixação de preços a serem praticados pela Recorrente, por parte do Estado, em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor constitui-se em sério empecilho ao livre exercício da atividade econômica, em desrespeito ao princípio da liberdade de iniciativa. (...) a fixação dos preços acabou realizada em valores inferiores. Essa conduta gerou danos patrimoniais ao agente econômico, vale dizer, à recorrente: obrigação de indenizar por parte do poder público”
Porém, em 4 de setembro de 2020, foi publicado acórdão do STF relativo a leading case (tema 826 de repercussão geral), cujo julgamento apertado (5 a 4) foi divulgado, nos noticiários, como vitória bilionária da União em face de Usinas com a tese fixada: "É imprescindível para o reconhecimento da responsabilidade civil do estado em decorrência da fixação de preços no setor sucroalcooleiro a comprovação de efetivo prejuízo econômico, mediante perícia técnica em cada caso concreto"
Apesar do destaque conferido à vitória da União, é importante destacar que persiste o entendimento do STF quanto à possibilidade de indenizações decorrentes da intervenção estatal na economia.
No acórdão do tema 826, o relator min. Fachin aduz que, no RE 422.941, foi reconhecida “responsabilidade da União pelos danos causados ao setor sucroalcooleiro em virtude da fixação de preços abaixo do preço de custo e em desacordo com os preços encontrados pela FGV”, porém “não chegou a examinar se o critério a ser observado para apuração do dano deveria ser a tabela da Fundação Getúlio Vargas ou o prejuízo contábil”. Divergindo, min. Fux defende que “o dano decorrente da intervenção da União na atividade comercial do setor sucroalcooleiro abrange não apenas o que os agentes econômicos perderam, mas também inclui o que os agentes econômicos deixaram de lucrar, tendo-se como referência os indicadores de custos auferidos pela Fundação Getúlio Vargas e o preço fixado verticalmente pela União. Afinal, a se admitir indenização apenas nos casos em que houve prejuízo contábil, estar-se-ia a prejudicar agentes econômicos que eventualmente conseguiram realizar gestão adequada e eficiente de seus recursos para minorar os efeitos negativos da intervenção estatal.”
Em razão desse recente julgamento apertado, é salutar acompanhar os desdobramentos em outros casos do setor sucroalcooleiro, até para avaliar eventual impacto de razões fiscais em decisões do STF.
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