Há um famoso filme, musical, que gosto muito: “Um violinista no telhado”. O filme trata da vida de uma comunidade judaica na Rússia Czarista do século retrasado. A personagem principal, Reb Tevye, um homem religioso, piedoso, bom pai de família e muito trabalhador diz logo na primeira cena: “É pela tradição que sabemos quem somos e o que Deus espera de nós”.
Concordo, aplaudo e entendo que a sentença se ajusta bem ao que Churchill falou e destaquei no início deste texto.
O tempo atual é iconoclasta e tende a desprezar costumes e tradições. Parece que há um mórbido e esfomeado desejo de desconstrução da identidade de todos os povos, especialmente na porção ocidental do mundo.
Meu objetivo não é tratar das causas, pois necessitaria de rios de tintas, algo que não posso dispor neste espaço, e de muita paciência do amigo leitor, eis que tratar de temas agudos e espinhosos – relativismo moral, materialismo militante, hedonismo, revisionismo histórico, entre outras formas de ativismo ideológico – não é algo fácil de se fazer.
Quero, apenas, talvez despretensiosamente, comentar a importância da tradição, algo fundamental para qualquer sociedade e que permeia a psique dos homens e mulheres de boa-vontade, daqueles que se esforçam na preservação de valores fundamentais e não aceitam viver na superfície das coisas.
Valorizar as tradições é, antes de tudo, respeitar a própria história e defender a identidade. A valorização da própria história não impede análises críticas, honestas, e a defesa da identidade não se confunde com abominações como o nacionalismo, o etnocentrismo, a intolerância e qualquer coisa que implique odioso sentimento de pretensa superioridade ou desprezo por tudo o que for diferente, que estiver na esfera “do outro” (outro povo, outra pessoa, outra cultura, outra religião).
Gosto de pensar que o respeito ao conjunto de valores que marca a identidade nada mais é do que a máxima socrática “conheça a ti mesmo” e, sem dúvida alguma, a melhor forma de respeitar as diferenças em geral. Quem se conhece, quem sabe realmente quem é e qual é sua posição no mundo, tende a superar melhor as adversidades, gostar mais da própria vida e, portanto, abrir seu coração ao próximo, ao outro, ao diferente.
Isso parece tão óbvio que eu nem deveria perder tempo a escrever. Parece, mas infelizmente não é e justamente por não ser é que escrevo e espero ser lido e compreendido.
A tendência atual em destruir a própria identidade e pisotear nas tradições é algo triste, preocupante e que revela perturbadora desordem moral, portanto, também social. Parece existir, sabe-se lá orquestrado por quem e para quê, um plano muito bem construído de corrosão de cultura ocidental, cristã, florescida na Europa e difundida em muitas partes do mundo.
Sataniza-se quase dois milênios de história, de elevada cultura e de tradições impossíveis de serem exaltadas dignamente. Para falar da grandiosidade da civilização cristã ocidental eu precisaria de livros e livros.
Tenho a impressão de que aquele que se dedica a diabólica arte de destruir as tradições, simplesmente ignora a grandeza invulgar da civilização ocidental, que tem em sua organicidade a filosofia grega, o Direito romano, os valores e princípios cristãos. Se não ignora, age com má-fé, orientando-se para a destruição do que é belo, justo e valioso.
Nunca é demais lembrar que a civilização cristã ocidental deu ao mundo as belas artes, a ciência, a exuberante arquitetura (simbolizada nas catedrais medievais), o sistema de ensino, as melhores práticas de piedade e os mais elevados ideais. A democracia é essencialmente um valor ocidental.
É claro que entre as luzes exuberantes, esses dois milênios foram também pontilhados por sombras e, mesmo, pontos constrangedores de abissal escuridão, mas o produto da soma destes não ofusca toda a grandiosidade da civilização ocidental, muito menos desautoriza sua história e suas tradições.
Cada um de nós, a seu modo, conforme seu estado, deve ser uma sentinela, um defensor das tradições, ajudando a preservar a cultura que herdamos de nossos antepassados. Ou assumimos esse compromisso ou sucumbiremos, perdendo-nos em uma zona cinzenta inferior a triste medida da mediocridade.
Preservar tradições não é viver no passado, tampouco se fechar ao novo. Não! Muito pelo contrário: preservar tradições é buscar no passado a inspiração para o presente e discernir quando o novo há de ser abraçado e difundido e quando há de ser deixado de lado ou repelido. Há entre tradição e sabedoria uma união quase hipostática, íntima, inexorável.
Sim, é pela tradição que sabemos quem somos e o que Deus espera de nós. Em sendo assim, saberemos melhor respeitar as diferenças, admirar culturas, tradições e costumes alheios, bem como buscar a justiça social, proteger e elevar os mais fracos e vivenciar a mandamento de “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”.
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