O consórcio societário, disciplinado pelos arts. 278 e 279 da Lei das S.A. (lei 6.404/76), revela-se como um ajuste intersocietário, traduzindo modalidade de concentração empresarial. Não possui, assim, personalidade jurídica, não é sujeito autônomo de direitos e obrigações, não detém patrimônio próprio e tampouco constitui ente formal. Portanto, à luz de sua moldura legal, o consórcio caracteriza-se como um contrato entre sociedades, de tipos iguais ou diferentes, sob o mesmo controle ou não, visando à conjugação de esforços e recursos para a execução de determinado empreendimento, mantendo cada consorciada a sua autonomia jurídica e empresarial (Sérgio Campinho. Curso de Sociedade Anônima. Rio de Janeiro: Renovar, 2015, p. 512).
Trata-se, pois, de mero contrato de coordenação ou cooperação entre pessoas jurídicas, sendo certo que cada consorciada responde pelas obrigações previstas no contrato de consórcio. Inexiste solidariedade legal entre elas, salvo no que se refere às licitações (art. 33, inc. V, da lei 8.666/93), às obrigações tributárias federais (art. 1º, §1º, da lei 12.402/11), às relações de consumo (art. 28, §3º, do CDC) e, no âmbito trabalhista, diante da configuração de grupo econômico (art. 2º, §2º, da CLT).
Portanto, o consórcio não pode figurar como empregador em relações jurídicas individuais ou coletivas de trabalho. A lei 12.402/11 não significou autorização para o consórcio contratar trabalhadores diretamente, mas simples expediente legal que objetivou exclusivamente estabelecer a solidariedade tributária das sociedades em relação às operações praticadas no âmbito do consórcio.
Embora o consórcio seja um ente despersonalizado, deverá ter inscrição no CNPJ. Essa exigência decorre da necessidade prática de controle da obrigação tributária acessória de reter na fonte o IR relativo aos pagamentos que efetua. A exposição de motivos da MP 510, convertida na sobredita lei 12.402/11 (art. 1º, §1º), reafirma que o consórcio “não tem personalidade jurídica, não integra a relação jurídico-tributária e não possui patrimônio próprio”, advindo daí a razão pela qual o normativo passou a estabelecer a solidariedade tributária das sociedades consorciadas em relação às operações praticadas no âmbito do consórcio.
Lacerda Teixeira e Tavares Guerreiro deixam certo de que o consórcio não é sujeito de direitos, não assume obrigações em nome próprio, e que sua atuação no mundo jurídico se dá por intermédio das sociedades que o constituem. As obrigações contraídas pelo consórcio perante terceiros o são pelas próprias consorciadas, nos termos definidos no respectivo contrato. E completam: “O recebimento de receitas far-se-á à conta das consortes, e em seu nome, e a partilha de resultados decorre da previsão contratual que se estipule. A administração e a contabilidade própria (art. 279, inciso VI) têm objetivos e características puramente internas, não induzindo de per se a capacidade jurídica do consórcio” (Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro, Livraria e Editora Jurídica José Bushatsky: 1979, v. 2, p. 797).
Por isso, o consórcio não recolhe em nome próprio tributos como ICMS, IPI, ISS, PIS, Cofins e IR. Os tributos decorrentes das atividades do consórcio são de responsabilidade de cada uma das consorciadas, na razão de suas atividades e arrecadações, conforme participação definida no respectivo contrato de constituição. Consoante o art. 4º da instrução normativa RFB 834/08, cada consorciada deverá emitir nota fiscal da qual conste a sua participação proporcional no empreendimento.
Como contrato de coordenação ou cooperação, é frequente no consórcio se designar, dentre as consorciadas, uma sociedade líder, que funcionará como um agente de administração e coordenação dos interesses comuns. Age como representante das consorciadas, nos termos definidos no contrato. Assim, é comum que a sociedade designada líder no contrato fique incumbida da escrituração contábil e da guarda dos livros e documentos relativos às operações praticadas ao abrigo do consórcio. Mas a providência visa, tão somente, a atender uma ordenação interna.
A portaria 6.136, de 3/3/20, que aprova as instruções para a RAIS, embora preveja obrigatoriedade de sua entrega por consórcio (art. 2º, inc. VII), partiu de mera constatação da realidade fática (primazia da realidade) para fins estatísticos e não pode ser vista como autorização para que o consórcio venha livremente a contratar trabalhadores de forma regular.
Diferentemente das sociedades personificadas, que devem obedecer a um procedimento para sua dissolução e liquidação regulares, o consórcio é encerrado definitivamente mediante o mero distrato, com cancelamento inclusive do CNPJ. Não há o ônus de pagar aos credores, mesmo os trabalhistas e os decorrentes de multas administrativas, e isto longe do risco de configuração de dissolução irregular e de surgimento novas responsabilidades daí derivadas.
Por tudo isso, o consórcio não pode, em nome próprio, contratar diretamente trabalhadores, celebrar acordo coletivo nem realiza atividade econômica independente das consorciadas para fins de enquadramento sindical. Nessa linha, não há como dimensionar para o consórcio a quota legal aprendizes e de pessoas portadoras de deficiência, ou estabelecer parâmetros para as medidas exigidas na área de saúde e segurança do trabalhado previstas na CLT e nas Normas Regulamentadoras. Enfim, não pode minimamente atuar como empregador por direito próprio.
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