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Impacto da coronacrise nos contratos comerciais. Dá para negociar?

Quando se fala em covid-19, ambas as partes estão na mesma situação de esclarecimento. Portanto, os casos devem ser analisados individualmente e a melhor saída é a renegociação amigável, procurando evitar a geração de conflitos.

3/8/2020

As paralisações em todo o mundo afetam as relações contratuais B2C e B2B e as organizações buscam driblar a crise com renegociações. Mesmo no atual clima de retomadas parciais, os contratos celebrados antes da atual crise, tais como compra e venda de produtos e insumos, prestação de serviços em geral, locação e outros, foram deixados em uma situação preocupante.

Normalmente, no caso de descumprimento, quem não executa o serviço é responsável e penalizado financeiramente. Entretanto, consta no Código Civil a exceção de que ninguém será responsável pelos eventos que não poderiam ter sido previstos ou que são inevitáveis. E este é o caso da atual pandemia.

Mas é importante não generalizar soluções. A teoria da imprevisão, o fato do príncipe, ou a força maior podem ser observadas e gerar efeitos nos contratos. Mas há casos em que nem mesmo elas justificarão a isenção do cumprimento de determinadas obrigações. Cada caso é um caso.

Teorias e regras como essas, já existentes na Constituição Federal, no Código Civil e em recentes medidas provisórias e leis editadas em decorrência da coronacrise, constituem exceções à regra do princípio da força obrigatória dos contratos.

Antes de qualquer judicialização, é importante analisar o caso concreto. Examinar os efeitos da alteração da situação para todos os envolvidos. Buscar a negociação e, em seguida, a mediação como método alternativo de resolução de conflitos.

Não faz sentido só uma das partes arcar com todo prejuízo, nem o devedor e nem o credor de obrigações. Isso configuraria vantagem indevida, que premiaria indevidamente seja o lado mais forte, ou o fraco.

O empresário controla seu fluxo de caixa e sabe, melhor que ninguém, a situação do seu negócio. Por isso, não há necessidade de esperar a crise chegar para começar a agir. Até porque, ainda não se sabe ao certo quando haverá de fato a retomada econômica ao status planejado no período imediatamente anterior à coronacrise.

Se não for possível atender a todas as cláusulas de um contrato por conta da pandemia, é preciso que o devedor da obrigação entre em contato com a outra parte com a máxima antecedência ao vencimento do prazo. É essencial explicar e comprovar os motivos da impossibilidade do cumprimento e, principalmente, demonstrar que tais motivos decorrem direta e exclusivamente da crise que daí decorre. Também é importante ouvir as ponderações da outra parte.

Técnicas avançadas de negociação e de renegociação, aplicadas por profissionais, são apaziguadoras e diretamente conectadas ao princípio da preservação das relações comerciais. Afinal, não é momento para rupturas comerciais quando houver espaço para conciliação, ainda que os objetivos das partes não possam ser totalmente atingidos.

Se o contato entre as partes for verbal, é importante que depois seja formalizado por escrito, se tenha um comprovante da entrega da comunicação para a outra parte, preferencialmente assinado. Os ajustes devem ser formalizados por contratos e aditivos. Mesmo com o isolamento social, é possível manter a documentação em ordem. Existem inúmeras ferramentas, algumas até mesmo gratuitas, para a celebração de contratos e documentos de forma virtual, plenamente aceita no direito brasileiro.

Apesar de existir a possibilidade da renegociação (que é a mais adequada), em muitos casos as empresas ou pessoas que não entregarem os produtos adquiridos, não prestarem os serviços ou não realizarem pagamentos, podem ser demandadas extrajudicialmente ou até judicialmente.

Isso não significa que a empresa será condenada. Já há normas legais recentes adiando as providências que gerariam bloqueio de valores em dinheiro, penhoras, leilões e imposição de multas pelo Poder Judiciário. Em vários casos, há norma legal estabelecendo prorrogação de prazos para cumprimento de obrigações.

Mesmo assim, é recomendável que as empresas mantenham em seus arquivos provas do que precisarão demonstrar no futuro sobre o nexo de causalidade entre a pandemia e o cumprimento ou não da obrigação. Isso para todos os lados da relação contratual. Tanto para o credor, que deve manter provas dos motivos pelos quais entende que, mesmo com a coronacrise, o devedor pode cumprir sua obrigação; quanto para o devedor, no sentido inverso.

Em alguns casos, é importante não fechar ou manter fechadas empresas, indústrias e afins, sem o governo ter editado ordem oficial para o fechamento, porque isso é um fundamento muito importante de afastamento de responsabilidade. As regras da Organização Mundial da Saúde (OMS) e organizações internacionais podem ser utilizadas para demonstrar orientações que devem ser obrigatoriamente cumpridas ou preferencialmente cumpridas. São fundamentos para afastamento de responsabilidade da empresa em caso de não cumprimento do contrato.

Estamos vivendo uma situação ímpar no mundo todo, não apenas no Brasil. Quando se fala em covid-19, ambas as partes estão na mesma situação de esclarecimento. Portanto, os casos devem ser analisados individualmente e a melhor saída é a renegociação amigável, procurando evitar a geração de conflitos que levarão anos a serem solucionados judicialmente.

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*Izabela Rücker Curi é sócia-fundadora do escritório Rücker Curi Advocacia e Consultoria Jurídica e da SMART LAW OFFICE, uma incubadora de projetos inovadores que envolvem questões jurídicas. Atua na área do Direito Empresarial há mais de 23 anos. Também é palestrante e mediadora ad hoc.

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