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A economia circular e seus instrumentos econômicos

Dentre os benefícios da Economia Circular estão a redução da dependência de recursos naturais, a regeneração de ecossistemas, a eliminação do desperdício e a diminuição da geração de resíduos e da poluição.

10/6/2020

Para que haja a consolidação do desenvolvimento sustentável, se faz necessária uma mudança do mindset econômico nacional e global. Os preceitos da Economia Circular são essenciais para que ocorra essa mudança sistêmica, gerando oportunidades econômicas e de negócios, além dos benefícios ambientais e sociais. 

Por Economia Circular entende-se a ruptura do modelo econômico linear que vem sendo aplicado historicamente, baseado na dinâmica "extrair, transformar e descartar", e sua substituição por um modelo onde todos os tipos de materiais são elaborados para que sejam recolocados na produção de forma eficiente. Trata-se da aplicação dos chamados "3 Rs" – reduzir, reutilizar e reciclar – na economia atual, além de outras formas de reinserção do material no ciclo produtivo, como o reparo e a redistribuição.

Dentre os benefícios da Economia Circular estão a redução da dependência de recursos naturais, a regeneração de ecossistemas, a eliminação do desperdício e a diminuição da geração de resíduos e da poluição. Ainda, nesse sistema é dado maior valor agregado ao produto, além de manter a sua matéria-prima em constante uso.

A implementação dos preceitos da Economia Circular pode ocorrer via instrumentos de comando e controle, que correspondem às normas em geral, como é o caso da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), bem como por meio de instrumentos econômicos, os quais atuam diretamente nos custos da produção.

Com respeito aos instrumentos econômicos adotados no exterior para a implantação de Economia Circular, cita-se o plano de ação europeu Closing the Loop, o qual consiste em um plano de apoio financeiro a projetos de economia circular, visando a redução de aterros sanitários e o estímulo à reciclagem.

O plano tem seu foco em determinados fatores, dentre eles o desperdício de alimentos, a destinação final adequada de resíduos plásticos, matérias-primas essenciais, resíduos da construção e demolição, biomassa e o reuso de água. Ainda, o plano prevê a revisão da legislação aplicável à destinação final de resíduos, de forma a adaptá-la aos objetivos da Economia Circular.

A China foi a pioneira na implantação da Economia Circular, por meio da promulgação da Circular Economy Promotion Law, em 2009. Mencionada lei tem seus objetivos embasados no princípio dos "3 Rs". Nos Estados Unidos, destaca-se a inciativa local da cidade de São Francisco, onde o Zero Waste Goal foi adotado em 2002. Tal projeto consiste em atingir a meta de zero geração de resíduos em 2020. Apesar de tal meta ainda não ter sido alcançada, a cidade conta com várias adaptações que a levaram a reduzir drasticamente o resíduo gerado, principalmente a partir de reciclagem e reuso, criando uma nova cultura quanto à forma de lidar com resíduos.

No que tange à adoção dos critérios da Economia Circular no Brasil, esta é abordada principalmente pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. Quanto aos instrumentos econômicos atualmente disponíveis, o setor privado recorre a instituições de fomento, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), para apoio financeiro na implantação de projetos de Economia Circular.

Outro modo de fomentar sua absorção no país se dá, mesmo que de forma modesta, por meio da emissão de títulos verdes (green bonds). Ademais, a Tributação Verde que estimula a reciclagem e/ou reuso de produtos finais na matéria-prima de uma nova produção também é um grande estímulo a este modelo econômico. Inclusive, algumas regiões do país já têm difundido largamente esse instrumento fiscal, como é o caso do estado do Ceará.

Cumpre destacar que o Brasil tem potencial para se posicionar dentre as nações com maior capacidade de transição não só para uma Economia Circular, como também para uma economia totalmente verde. Por Economia Verde entende-se aquela que prioriza o uso eficiente de recursos naturais, com baixa, ou até neutra pegada de carbono, e que seja socialmente justa.

Fatores como a sua expressiva matriz energética renovável, a variedade de recursos naturais presentes em seu território, além do espaço físico e suporte financeiro para a implantação da Economia Circular/Verde colocam o Brasil em posição de destaque. Entretanto, para que isso ocorra, são imprescindíveis as adaptações do setor privado, da comunidade e a vontade política, traduzida no estímulo por parte do Poder Público, por meio da criação de políticas públicas.

Como exemplo, a Política Nacional de Biocombustíveis – RenovaBio, como instrumento eficaz no incentivo à produção e consumo de biocombustíveis, com a criação de um mercado de carbono ao segmento, contribuindo para a transição a uma matriz energética mais limpa. Este foi um ato pioneiro do Brasil, e certamente será usado como exemplo para implantação de políticas semelhantes em outros países e segmentos.

É urgente a necessidade de que instrumentos econômicos como estes se sobressaiam no Brasil, não somente por seus benefícios ambientais e para o cumprimento da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira sob o Acordo de Paris, mas também para que o país se insira e opere de acordo com a nova estruturação econômica mundial. A esse respeito, cada vez mais os sistemas econômicos e financeiros levam em conta os critérios ambientais, sociais e de governança corporativa (chamados ESG) nos investimentos e alocação de recursos.

No mercado financeiro, por exemplo está numa crescente o foco de investimentos que deem não somente o retorno financeiro, como também nas áreas de meio ambiente, educação e saúde, cenário o qual só irá se intensificar a partir da reestruturação econômica posterior à crise causada pela pandemia da covid-19. Para ilustrar tal assertiva, em 2019 foram aplicados mundialmente US$ 31 trilhões em sustentabilidade, o que correspondente a 34% a mais do que em 2017. A Black Rock, maior gestora de investimentos do mundo, anunciou em janeiro que as mudanças climáticas se tornaram o centro da estratégia de seus investimentos.

Quanto ao sistema econômico mundial, é iminente a necessidade de iniciar-se a estruturação da proposta de um Green New Deal para o Brasil. A discussão sobre os chamados Pactos Verdes cresceu exponencialmente em 2019, e estes serão a base da reestruturação econômica por vir.

Tais pactos objetivam não só a implantação de uma Economia Circular, como também de uma economia totalmente verde. Em sua maioria, preveem pactos econômicos para a reestruturação econômica, objetivando a neutralização de carbono, uma transição justa para uma Economia Verde, e o desestímulo de subsídios à energia derivada de combustíveis fósseis.

Dentre os principais Green New Deals propostos, têm-se os regionais, como o da União Europeia e do Reino Unido, além dos nacionais, como o pacto da Coreia do Sul. A China, mesmo não tendo apresentado um pacto verde em si, baseou seu 14º Plano Quinquenal para a Economia Nacional no princípio do desenvolvimento sustentável e uso eficiente de recursos naturais.

Verifica-se, portanto, que o mundo está em discussão sobre uma nova economia, a Economia Verde. E o Brasil não pode se ausentar de tal debate. Ao contrário, tem plena capacidade de liderar e se empenhar na criação de instrumentos inovadores, que possam ser adotados em outras nações e também em escala global.

Para isso, além da implementação e amplificação nacional dos instrumentos ora mencionados, a presença do país em diálogos internacionais se faz imprescindível para que este vá ao encontro do novo perfil da economia mundial. Perfil que é consequência da mudança de mindset em escala global, pela qual questões sociais e a relação homem/ambiente são levadas em consideração na economia e no sistema financeiro.

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*Juliana Coelho Marcussi é doutora em Direito Ambiental. Mestre em Direito Internacional dos Negócios e Globalização. Pesquisadora pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP. Advogada e consultora em Direito Ambiental, responsável pelo Departamento de Direito Ambiental do escritório de advocacia Martinelli Advogados e consultora ambiental da Associação Brasileira de fabricantes de latas de Alumínio (Abralatas).

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