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Flexibilização da súmula 385 do STJ admite indenização por danos morais mesmo com inscrição preexistente

O entendimento, esposado pela súmula, é que não seria cabível a indenização por dano moral pelo fato de que a negativação não é um fato novo para o consumidor, de modo que não houve dessabor ou prejuízo com uma segunda negativação, ainda que seja indevida.

3/6/2020

A súmula 385 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), editada no ano de 2009, passou por recente flexibilização, conferindo ao consumidor o direito de receber indenização por danos morais ainda que possua negativação já existente.    

Pelo seu teor não caberia indenização por danos morais decorrente de anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento; ou seja, não caberia indenização ao consumidor que tiver seu nome inserido no cadastro dos órgãos de proteção ao crédito se a negativação já existir por qualquer anterior outro motivo, tendo resguardado o direito ao cancelamento da inscrição tão somente na existência de ilegalidade.

O entendimento, esposado pela súmula, é que não seria cabível a indenização por dano moral pelo fato de que a negativação não é um fato novo para o consumidor, de modo que não houve dessabor ou prejuízo com uma segunda negativação, ainda que seja indevida.

Desse modo, a súmula restringe a possibilidade de o consumidor que se sente lesado com a negativação indevida receber indenização por danos morais destacando que, antes de sua edição, a simples inserção irregular nos órgãos de proteção ao crédito já gerava o dever de indenizar, uma vez que se trata de dano moral presumido (dano moral in re ipsa), sendo desnecessária qualquer prova do dano.

O entendimento de que a inclusão ou manutenção indevida configura dano moral in re ipsa é consolidado pelo STJ sendo utilizado como fonte jurisprudencial para as demais decisões proferidas em relação ao assunto em âmbito nacional.

Os Tribunais de Justiça aplicam tal entendimento esposando que não restam dúvidas quanto aos efeitos negativos do protesto e da negativação do cadastro do consumidor, pois, além de comprometer as possibilidades de eventuais negócios, compromete sua imagem perante terceiros. Assim, caso este ato seja ilícito, a jurisprudência tem entendido que a inscrição indevida gera o direito à indenização por danos morais, independentemente de prova do dano, respaldada no entendimento expresso pelo STJ.

Assim, com a edição da súmula, diversas demandas encontraram obstáculos pelo fato de que muitos dos consumidores já possuíam inscrições anteriores; isso tornou possível que tais demandas não rendessem mais os tão almejados danos morais.

Entretanto, uma decisão proferida recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe uma nova visão em relação a estes casos. Segundo essa decisão, no caso de as dívidas anteriores estarem sendo discutidas judicialmente e pendentes de trânsito em julgado, a indenização por danos morais é devida, havendo, portanto, a flexibilização acerca do entendimento.

A ação foi movida por um consumidor que teve seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito, foi julgada improcedente em primeira instância diante da existência de anotações anteriores, em apreço à sumula 385 do STJ, e mantida em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Em sede de recurso especial 1.704.002 - SP, a ministra Nancy Andrigh manteve o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo de que, até o reconhecimento judicial definitivo acerca da inexigibilidade das dívidas, deve-se presumir como legítima a negativação. Contudo, admite-se a flexibilização da súmula 385/STJ para reconhecer o dano moral nos casos de inscrição indevida, ainda que não haja o trânsito em julgado das demais demandas que apontam irregularidades preexistentes, desde que haja elementos aptos a demonstrar a verossimilhança das alegações.

Conforme assevera a ministra, em algumas situações pode colocar o consumidor em uma situação excessivamente desfavorável e de complexa solução, especialmente quando as ações que discutem os débitos forem ajuizadas ao mesmo tempo. Nas palavras da ministra Nancy Andrigh:

em determinadas hipóteses, pode colocar o consumidor em situação excessivamente desfavorável e de complexa solução, especialmente quando as ações forem ajuizadas concomitantemente – como na espécie – ou em curto espaço de tempo, na medida em que ele se vê numa espécie de 'círculo vicioso', porquanto o reconhecimento do dano moral em cada um dos processos ajuizados estaria, em tese, condicionado ao trânsito em julgado dos demais, nos quais, por sua vez, não se concederia a respectiva indenização devido à pendência das outras demandas em que a regularidade dos mesmos registros está sendo discutida.

Assim, não se deve admitir a exigência quanto ao trânsito em julgado de uma das ações para que somente a partir daí seja concedido, nas demais, o direito à indenização aos danos morais. Ainda nas palavras da ministra Nancy Andrigh:

Certo é que não se pode admitir que seja dificultada a defesa dos direitos do consumidor em juízo, exigindo-se, como regra absoluta, o trânsito em julgado de todas as sentenças que declararam a inexigibilidade de todos os débitos e, consequentemente, a irregularidade de todas as anotações anteriores em cadastro de inadimplentes para, só então, reconhecer o dano moral.

A decisão proferida no Resp 1.704.02 não foi a primeira e única que promoveu a flexibilização da súmula nesse sentido: no ano de 2017, em decisão proferida pela mesma relatoria no Resp 1.647.795, foram utilizados os mesmos fundamentos, trazendo ao consumidor a oportunidade de comprovar o dano moral pela negativação indevida, ainda que ocorrida mais de uma inscrição, desde que todas estejam no âmbito judicial para discussão.

Concluiu-se que, para que ocorra a flexibilização deverá ser comprovado, pelo consumidor elementos que demonstrem verossimilhança das alegações quanto à irregularidade das anotações preexistentes capazes de levá-las ao cancelamento, e, ainda que pendente de trânsito em julgado, será devido o dano moral em relação às anotações posteriores em respeito à defesa do consumidor.

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JUS BRASIL. Acórdão Recurso Especial  1.647.795/RO. Acesso em: 15 abr. 2020.

JUS BRASIL. Acórdão Recurso Especial 1.704.02/SP. Acesso em: 15 abr. 2020.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 385. Acesso em: 15 abr. 2020.

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*Kelly Yohana Silva Arraes é advogada no escritório Jacó Coelho Advogados.

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