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Medida provisória que revoga medida provisória: Efeitos da Revogação da MPV 905

Entre outras providências, a medida provisória 905 criou uma forma especial de contrato de trabalho, o chamado Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, que teve como intuito a criação de novos postos de trabalho para o primeiro emprego.

22/5/2020

Em 11 de novembro de 2019 foi publicada a medida provisória 905, a qual entrou em vigor imediatamente. A MPV seguiu sua tramitação normal pelo período de 60 dias1 e em 12 de fevereiro de 2020 foi publicado o ato do presidente da mesa do Congresso Nacional 4, prorrogando a vigência por igual período de 60 dias.

Entre outras providências, a medida provisória 905 criou uma forma especial de contrato de trabalho, o chamado Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, que teve como intuito a criação de novos postos de trabalho para o primeiro emprego.

Essa forma especial de contratação trouxe incentivos à sua celebração e, nesse aspecto, a MPV 905 suspendeu a aplicação das regras gerais celetistas de contratação da relação de emprego2, desde que, por óbvio, preenchidos os requisitos por ela estabelecidos. Esse fenômeno está em consonância com a interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal de que a medida provisória não revoga lei anterior, mas apenas suspende seus efeitos no ordenamento jurídico, em face do seu caráter transitório e precário3.

A medida provisória produziu seus efeitos até o dia 20 de abril de 20204, data em que perderia eficácia pelo decurso do prazo para apreciação congressual. No entanto, a extinção da MPV se deu por revogação expressa, diante da edição e publicação neste mesmo dia da MPV 9555.

Importante destacar que esta última, teve como único escopo a revogação da MPV 905, diferente do que ocorreu com a MPV 928 de 23 de março de 2020, que além de adotar outras providências revogou o art. 18 da medida provisória 927, de 22 de março de 2020.

Tal expediente, por maior estranheza que possa causar, já foi ratificado em diversos julgados do Supremo Tribunal Federal, por todos o voto da min. Ellen Gracie na medida cautelar em ADIn 2.984-3/DF, in verbis:

“Ou seja, o que o Tribunal concluiu é que, embora não tenha disponibilidade sobre a medida já editada, é válido ao Chefe do Poder Executivo editar nova medida, ab-rogatória da anterior. Com tal procedimento não frusta nem tolhe a atuação do Congresso Nacional que persiste em sua plena competência para apreciar e converter, ou não, em lei o referido texto. O que se dá é uma inversão na ordem de apreciação das matérias, posto que o exame da medida ab-rogante há de necessariamente preceder ao da medida ab-rogada, cuja análise fica, ademais, condicionada ao resultado da apreciação daquela que lhe é cronologicamente posterior.”

Os efeitos dos atos normativos anteriores incompatíveis foram inibidos em um espaço temporal limitado e uma vez rejeitada, ou, como agora, revogada a medida provisória, a lei anteriormente por ela afastada, até então suspensa, readquiriu eficácia6.

No caso em análise, a forma geral de contratação do trabalho subordinado retornou as suas antigas regras. Surge, então, a dúvida quanto aos efeitos da revogação da MPV 905 nos contratos de trabalho verde e amarelo celebrados sob sua égide.

Acima se viu que a MPV 905 foi revogada pela MPV 955 e o efeito prático é que os prazos de tramitação e a vigência da MPV 905/19 tornaram-se suspensos a partir do dia 20.04.20, até que seja ultimada a votação da MPV 955/20 nas duas Casas do Congresso Nacional7, ou seja, até que seja apreciada a MPV revogada e a MPV revogadora. É que a revogação de MPV durante a tramitação por outra MPV não retira a primeira definitivamente do ordenamento jurídico e as duas MPVs ainda carecem de apreciação pelo Congresso Nacional.

Em consequência, se a MPV 955 vier a ser convertida em lei, a revogação da MPV nº 905 se tornará definitiva e os seus efeitos terminarão convalidados. Caso a MPV 955 venha a ser rejeitada, caberá então ao Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas oriundas de ambas as MPVs. Não o fazendo até sessenta dias após a sua rejeição, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas (art. 62, § § 3º e 11, da CRFB/88)8.

Adicionalmente, há outro caminho de sobrevida do conteúdo disposto na MPV 905. Existe indicativo de que o relator da MPV 927, dep. Celso Maldener (MDB-SC), inclua no projeto de conversão desta 8 ou 9 artigos da revogada MPV 905[9]. Essa manobra legislativa, contudo, não incide na proibição de reprodução de MPV rejeitada ou caduca na mesma sessão legislativa (art. 62, § 10, da CRFB/88)10, tendo em vista que não está sendo veiculada por outra MPV editada pelo Presidente da República, mas por deliberação parlamentar.

Logo, as conclusões de deliberação de uma medida provisória incluem a rejeição, aprovação na íntegra ou a aprovação de projeto de lei de conversão – PLV (com alteração do texto originalmente publicado). Neste último caso, a conversão da medida provisória em lei absorve o seu conteúdo, o que por si só já pressupõe um juízo afirmativo de que atende substancialmente aos interesses e valores da sociedade11.

Na hipótese de a MPV 955 não ser convertida em lei, restará frustrada a revogação da MPV 905 e esta será terá perdido sua eficácia pelo decurso de prazo. E mais uma vez caberá ao Congresso Nacional disciplinar as relações jurídicas dela decorrentes, observando as consequências anteriormente apresentadas, caso se movimente nesse sentido.

Enquanto não se afigurar uma das situações anteriores, os contratos de trabalho verde e amarelo regularmente constituídos durante o período de vigência da MPV 905 permanecerão produzindo efeitos até o seu termo final de duração, respeitando-se o princípio da segurança jurídica e o ato jurídico perfeito.

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1 Nos termos do art. 62, §3º, da CRFB/88, as medidas provisórias possuem vigência de 60 dias e podem ser prorrogadas por igual período, conforme o §7º do mesmo artigo.

2 A opção constitucional insculpida no art. 7º foi pela relação de emprego. Nos termos da CLT a relação de emprego se caracteriza pelo trabalho subordinado, prestado com habitualidade e de forma pessoal a um empregador, mediante sua contraprestação remunerada.

3 Ver ADIn 5.709, ADIn 5.716, ADIn 5.717 e ADIn 5.727, rel. min. Rosa Weber, julgamento em 27.03.19, publicado no DJE de 28.06.19.

4 A medida provisória 905 percorreu um período de vigência superior a 120 dias, pois nos termos art. 62, §4º, da CRFB/88 o prazo foi suspenso durante o recesso do Congresso Nacional, que ocorreu no período de 23 de dezembro de 2019 a 1º de fevereiro de 2020.

5 Esse expediente também foi utilizado para afastar a aplicação do art. 18 da medida provisória 927, de 22 de março de 2020, com a edição da MPV 928, de 23 de março de 2020.

6 Partindo-se da premissa de que a medida provisória “não tem eficácia normativa imediata de revogação de legislação anterior com ela incompatível, mas apenas de suspensão dos seus efeitos até o término do prazo do processo legislativo de conversão da medida provisória”, conforme julgamento da ADI 5717, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julg. 27.03.19, DJe 27.06.19, DJ 28.06.19.

7 Consulta ao sítio do Congresso Nacional em 14.05.20. Clique aqui.

8 ADI(MC) 221, Rel. Min. Moreira Alves, julg. 29.03.90, DJ 22.10.93.

9 MP 927 incorporará mudanças trabalhistas de MP que caducou. Valor Econômico. Edição do dia 13.05.20. Política. p. A10. Disponível clicando aqui

10 Deve-se observar que o do §10 do art. 62 da CRFB/88 veda a edição de medida provisória na mesma sessão legislativa e sobre o tema já se manifestou o SFT, nos seguintes termos: “É vedada reedição de medida provisória que tenha sido revogada, perdido sua eficácia ou rejeitada pelo Presidente da República na mesma sessão legislativa. Interpretação do §10 do art. 62 da Constituição Federal”. (ADI 5717, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julg. 27.03.19, DJe 27.06.19, DJ 28.06.19)

11 Ver ADI  1.721-3/DF, julg. 11.10.06, DJ 29.06.07.

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*Ronald Amaral Sharp Junior é mestre em Direito. Auditor-Fiscal do Trabalho.

*Leonardo Soares Bello é mestre em Direito. Auditor-Fiscal do Trabalho.

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