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Soberania dos veredictos x Presunção de inocência

O que se tem no debate da execução imediata de condenação pelo Tribunal do Júri é mais uma página daquilo que o dia a dia da prática vê como maleabilidade seletiva de direitos.

5/5/2020

O que se tem no debate da execução imediata de condenação pelo Tribunal do Júri é mais uma página daquilo que o dia a dia da prática vê como maleabilidade seletiva de direitos. A rigor, nada mais é do que um meio de revisitar mecanismos constitucionais, direitos fundamentais, e adequá-los ao Estado policialesco, à verve punitivista e às respostas simbólicas contra um problema de segurança pública sério; e que não se resolve pelo Poder Judiciário.

Não há motivo sério para equiparar a presunção de inocência com o Tribunal do Júri e disso “ponderar” o segundo em face do primeiro. Ambos constam na Constituição, mas tratam de elementos de natureza distinta. A presunção da inocência está na categoria dos direitos fundamentais inalienáveis ao indivíduo, enquanto o Tribunal do Júri é uma previsão positiva de que certos crimes não serão julgados por um juiz togado, mas por membros da própria sociedade, como meio de participação deste no Judiciário, marca de um Estado Democrático de Direito.

Ainda que fossem coisas aproximáveis à “ponderação”, nos depararíamos com uma total malversação da técnica. A ponderação, enquanto técnica dogmática para a solução de conflitos entre princípios, em ponto algum argumenta que a primazia de um resultará na total supressão de outro; como se pretende no caso com a oclusão do princípio da presunção de inocência. Mais do que isso, as noções de “mutação constitucional” nada mais servem do que de pretensa ciência para justificar a maleabilidade da interpretação, um verniz de legalidade, cujo único resultado prático é “a tirania dos princípios” disposta a justificar as maiores atrocidades em nome de uma justiça seletiva e bem endereçada; como Ricardo Campos muito bem lembra no prefácio da obra "O Direito Público na Alemanha", de Michael Stolleis, na crítica desse neoconstitucionalismo oportunista.

Para justificar a nova interpretação que buscam alguns da Suprema Corte, se faz uso errado de boa técnica e se aplica técnica ruim para justificar o que há de errado. No fim das contas, ao confundir as coisas se esconde o que há de mais importante na questão, faz parecer que há um mar de assassinos sanguinários soltos após o julgamento por se presumirem inocentes. A prática, claro, não é essa. Pelo uso corrente à prisão preventiva (algo que nossos presídios são testemunhas), quem deve aguardar preso eventual apelação, por apresentar risco qualquer à sociedade ou ao processo, já o fica em detrimento da prisão preventiva, enquanto quem não apresenta risco qualquer e pode aguardar em liberdade assim o faz. Ou seja, nada será alterado na prática, se não a segurança jurídica, relegada ao cargo de espantalho constitucional.

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*Leonardo Magalhães Avelar é advogado, sócio responsável pela área de Direito Penal Empresarial do escritório Cascione Pulino Boulos Advogados e membro do Observatório do Direito Penal.

*Alexys Campos Lazarou é advogado do escritório Cascione Pulino Boulos Advogados e membro do Observatório do Direito Penal.

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