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O síndico pode impedir a realização de obras nas propriedades exclusivas tendo em vista a pandemia (Decreto 46.973/20)?

O direito a vida (direito coletivo) versus o direito de propriedade (direito individual).

24/4/2020

1. Introdução 

síndico pode ou não, proibir a realização/continuidade de obra na área privativa (unidade autônoma)?

Não responderemos essa pergunta com apenas um sim ou não, abordaremos abaixo, os dois entendimentos sobre o caso. Assim, o síndico deverá optar pelo entendimento que melhor se aplicar ao caso que enfrentará e as diretrizes de sua gestão. 

A questão é delicada e envolve inúmeros desdobramentos. Pelo lado do condomínio, o mesmo quer evitar o trânsito de pessoas e materiais nas áreas comuns. Pelo lado do condômino, o mesmo quer terminar a sua obra, pois, geralmente, a mesma está vinculada a outros compromissos, como, por exemplo, o pagamento do contrato de empreitada (lembrando que, no Rio de Janeiro a construção civil não foi paralisada), prazo para desocupação de imóvel alugado e etc.

2. Do PL 1.179/20

O PL 1.179/20, de autoria do senador Antônio Anastasia (PSD/MG), que trata sobre o regime emergencial e transitório das relações de direito privado no período da pandemia do coronavírus (covid-19), traz em seu bojo, mais precisamente no capítulo IX, três artigos sobre os condomínios edilícios.

Embora seja apenas um projeto de lei, achamos válido destinar uma breve análise sobre o tema.

O artigo mais importante do projeto de lei para o nosso estudo, sem sombra de dúvidas, é o artigo 15, pois, atribui mais poderes ao síndico além daqueles já previstos no artigo 1.348 do CC. Senão vejamos:

Art. 15. Em caráter emergencial, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 do Código Civil, compete-lhe:

I - restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação do Coronavírus (Covid-19), respeitado o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos;

II restringir ou proibir a realização de reuniões, festividades, uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação do Coronavírus (Covid-19), vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.

Parágrafo único. Não se aplicam as restrições e proibições contidas neste artigo para casos de atendimento médico, obras de natureza estrutural ou a realização de benfeitorias necessárias. (grifos nossos)

Diante de uma breve leitura do referido artigo, verifica-se que o síndico, caso sancionado o projeto de lei, terá poderes para restringir e até mesmo proibir a utilização das áreas comuns do condomínio, todavia, o aludido dispositivo tomou cuidado para não violar o direito de propriedade dos condôminos ao mencionar no final do inciso II que “vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade”.

Conforme veremos mais a frente, esse é o ponto nevrálgico do presente artigo, o direito individual versus o direito coletivo. Se o condômino não pode sofrer restrição ao uso exclusivo de sua propriedade, como o síndico pode proibir a realização ou a continuidade da obra na área privativa (unidade autônoma)? 

Em ato continuo, o parágrafo único, em sua parte final, destaca que as restrições e proibições não se aplicam as obras de natureza estrutural ou a realização de benfeitorias necessárias. 

No nosso sentir, após uma leitura integral e contínua do referido dispositivo, entendemos que o parágrafo único se refere as obras nas áreas comuns, deixando brechas para a realização de quaisquer obras nas áreas privativas, pois no inciso II o legislador foi claro ao mencionar que não haverá restrições ao uso exclusivo pelos condôminos.

Todavia, uma coisa é certa, as obras necessárias e estruturais poderão e deverão ser realizadas, tanto, nas áreas comuns como nas privativas. 

Por fim, apenas a título de curiosidade, os dois últimos artigos do capitulo IX do referido projeto tratam sobre a realização de assembleia1 e prestação de contas do síndico.2 

3. Tipos de obras – Código Civil.

Para melhor compreensão, faz-se necessário uma ligeira explicação/distinção a respeito das obras/benfeitorias trazidas pelo artigo 96 do CC3.  

O parágrafo primeiro trata das benfeitorias voluptuárias que servem “para o mero deleite ou recreio e que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor”.

Já o parágrafo segundo, trata das benfeitorias úteis que “aumentam ou facilitam o uso do bem. 

Por último, o parágrafo terceiro traz em seu bojo as benfeitorias necessárias que “têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore”. 

Conforme veremos mais a frente, a discussão/divergência entre condomínio e condômino reside nas obras voluptuárias e úteis por não possuírem caráter emergencial.  

Já no caso das obras necessárias, entendemos, salvo melhor juízo, que não há discussão quanto a sua realização, pois a sua paralisação/não realização poderá acarretar danos ao condomínio e demais condôminos, como, por exemplo, conserto de uma infiltração, inclusive, o parágrafo único do artigo 15 do PL 1.179/2020 menciona, que este tipo de obra, não poderá ser proibida.  

Veja a íntegra do artigo.

_________ 

*Allan Machado é advogado e diretor jurídico do escritório Ferreira & Borzone Assessoria Jurídica.

 

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