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A pandemia do coronavírus e os impactos sobre os reajustes, cancelamentos e rescisões de contratos de planos de saúde

Cerca de 80% dos planos de saúde são empresariais (firmado por empresas diretamente com as operadoras de planos de saúde), ou na modalidade de adesão, na qual a contratação se dá por intermédio de associações, entidades e sindicatos.

24/4/2020

O coronavírus afetou diversos setores do mundo inteiro, e no Brasil não foi diferente; além de causar estragos na economia, nas relações de emprego, o serviço de saúde foi um dos mais afetados, setor este que atualmente atende mais de 47 milhões de pessoas.

Nesse universo de 47 milhões de beneficiários de planos de saúde, cerca de 80% dos planos de saúde são empresariais (firmado por empresas diretamente com as operadoras de planos de saúde), ou na modalidade de adesão, na qual a contratação se dá por intermédio de associações, entidades e sindicatos.

Em meio a esse caos, a saúde suplementar foi colocada em evidência, pois o Sistema Único de Saúde não é capaz de suportar a demanda de pacientes em decorrência desse vírus. Com isso a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS estipulou que as operadoras de planos de saúde são obrigadas a cobrir o teste que identifica a infecção pelo vírus. Não apenas isto, a própria cobertura da internação hospitalar, bem como demais despesas relativas à recuperação desses pacientes também é de responsabilidade das operadoras, o que levou muitos a questionarem que a saúde financeira dos planos de saúde poderia ficar comprometida.

No entanto, o que podemos sentir do atual cenário, é que ao mesmo tempo que existe uma procura para os testes do covid-19, com o custeio do plano de saúde, além das internações em decorrência do vírus, também há que se notar que os demais serviços – notadamente aqueles que demanda internação eletiva - não são tão procurados, vez que a orientação é que toda a população fique em quarentena, ou seja, que evite hospitais, consultórios, laboratórios e demais lugares com aglomeração. Com efeito, devido ao alto risco de infecção proporcionado pelo coronavírus, somente o pacientes que se encontram em situações de urgência/emergência, com risco imediato à sua vida ou integridade física, ou então pacientes que possuem doenças crônicas com tratamento contínuo é que vão procurar os serviços médicos nessa situação de pandemia.

Assim, o real impacto financeiro da pandemia para as operadoras de planos de saúde ainda é incerto e dependerá de uma análise efetiva e pormenorizada da demanda que chegará aos hospitais das respectivas redes credenciadas. E para os consumidores – principalmente aqueles que possuem contratação coletiva -  esse é um assunto extremamente relevante, uma vez que a efetiva demonstração da receita auferida e das despesas será fundamental para o reajuste da mensalidade a ser aplicada no futuro. Outro ponto que merece destaque é que o reajuste divulgado para 2020 leva em consideração as despesas assistenciais ocorridas nos anos de 2018 e 2019, com isso, eventual aumento com o impacto da pandemia se dará somente no ano de 2021.

Ainda, deve-se frisar para os beneficiários de planos de saúde coletivos (tanto empresarias, como pode adesão),  que qualquer reajuste deve ser aplicado de forma clara, com a devida informação e transparência que estipula o Código de Defesa do Consumidor, proibindo-se, assim, reajustes unilaterais, desacompanhados de quaisquer documentos atuariais que legitimem o reajuste aplicado.

É evidente que as operadoras, sob o argumento de necessidade de equilíbrio financeiro, irão aplicar reajustes em suas carteiras; porém, não raro tais reajustes são calculados de forma desconhecida e sem a devida prestação de contas aos consumidores, situação esta que tem sido constantemente vedada pelo Poder Judiciário:

Apelação Cível.

Plano de Saúde Coletivo Sentença de improcedência Recurso do autor Controvérsia acerca da legalidade do reajuste por sinistralidade aplicado à apólice coletiva Inexistência de abusividade na cláusula contratual que permite tal reajuste Ausência, entretanto, de demonstração dos fatores que levaram aos reajustes por aumento de sinistralidade indicado na inicial Operadora que se limitou a apresentar planilhas genéricas dos “prêmios emitidos” e “sinistros pagos”, sem lastro técnico a comprovar a sinistralidade alegada Laudo pericial embasado em meros cálculos aritméticos das despesas e receitas que não se mostra suficiente para comprovar a legalidade do reajuste Operadora que não se desincumbiu do ônus da prova que lhe cabia Abusividade verificada Substituição pelos índices de reajuste anual aprovado pela ANS para planos individuais e familiares Restituição, de forma simples, dos valores pagos a maior Sentença reformada para o fim de julgar procedente a ação. Dá-se provimento ao recurso.

(Apelação Cível 1120120-22.2018.8.26.0100 Apelante: Guilherme Barby Simão Apeladas: Amil Assistência Médica Internacional S.A e outra – Relatoria: CHRISTINE SANTINI – Data de Julgamento: 18.03.20)

Além disso, com o repasse de seus eventuais prejuízos por parte das operadoras de planos de saúde, as mensalidades não serão suportadas por seus beneficiários, já afetados com toda essa situação, o que poderá ocasionar a inadimplência e cancelamentos dos contratos dos planos de saúde.

A Lei dos Planos de Saúde (lei 9.656/98) somente permite o cancelamento de planos individuais/familiares em função da inadimplência do consumidor, por período superior a 60 dias, consecutivos ou não, nos últimos 12 meses de vigência do contrato, sendo necessário o envio de notificação pela operadora até o 50º dia de atraso do pagamento.

Ciente dessa grande possibilidade de cancelamentos e rescisões dos planos de saúde, a ANS no dia 09 de abril de 2020, dentes outras medidas, flexibilizou o uso de mais de R$ 15 bilhões em garantias financeiras e ativos garantidores por parte das operadoras, porém estabeleceu contrapartidas que as empresas precisarão cumprir.

Uma dessas contrapartidas, é que as operadoras são obrigadas a oferecerem a renegociação de contratos, comprometendo-se a preservar a assistência aos beneficiários dos contratos individuais e familiares, coletivos por adesão e coletivos com menos de 30 vidas, até o dia 30 de junho de 2020.

Com efeito, essa contrapartida exigida pela ANS objetiva fazer com que as operadoras ofereçam o suporte aos seus beneficiários, além de evitarem um aumento à demanda do setor público de saúde.

Portanto, a possibilidade da aplicação de reajustes abusivos (unilaterais e sem transparência), bem como o cancelamento de planos inadimplência sem que sejam observadas as regras impostas pela lei de planos de saúde e pela Agencia Nacional de Saúde Suplementar – ANS, são dois temas extremamente relevantes e que os consumidores deverão se resguardar nesse período de pandemia do coronavírus.

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*Caio Henrique Sampaio Fernandes é advogado especializado em direito à saúde e sócio do escritório Vilhena Silva Advogados.

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