A Medida Provisória 936, publicada em 1º de abril de 2020, cria o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda.
Dentre os efeitos práticos trazidos com a presente medida, temos no seu art. 3º o pagamento de Benefício Emergencial, pago pela União na hipótese de: (i) redução proporcional de jornada de trabalho e de salários; e (ii) suspensão temporária do contrato de trabalho, ambos custeados pela União e de prestação mensal.
O Seguro-Desemprego cujo empregado teria direito, será base de cálculo do Benefício Emergencial pago pela União.
No seu art. 7º, a MP traz as regras de redução de jornada/salário que poderão ser de 25%, 50% ou 75%, pelo período máximo de 90 dias, preservando o salário-hora de labor, através de acordo individual ou coletivo. Em contrapartida o trabalhador irá receber o benefício emergencial, com valor equivalente à redução do salário/jornada, calculado sobre o seguro-desemprego.
Quanto à suspensão temporária dos contratos de trabalho, com fulcro no art. 8º, deixa consignado que o empregador poderá acordar a suspensão temporária do contrato de trabalho de seus empregados, pelo prazo máximo de 60 dias, fracionado em até dois períodos, caso haja necessidade.
O benefício emergencial poderá ser formalizado por Acordo Individual Escrito entre Empresa e Empregado, que perceba salário de até R$ 3.135,00, ou, sendo este possuidor de Diploma de Ensino Superior e receba R$ 12.202,12 ou mais. Ainda, por acordo individual é permitida a redução de 25% (vinte e cinco por cento), independentemente do salário do trabalhador1.
Já a Negociação Coletiva é obrigatória para os empregados que recebam acima de R$ 3.135,00 e menos R$ 12.202,12, podendo ainda ser estabelecido outros percentuais de redução do salário e jornada.
A participação do empregado nas medidas apontadas acima confere Garantia Provisória de Emprego durante toda a vigência do Acordo Individual ou Coletivo de Trabalho e, ainda, por igual prazo posteriormente ao restabelecimento da jornada/salário e da suspensão do contrato de trabalho.
Para os casos de suspensão temporária do contrato de trabalho os Empregados também irão receber o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, sendo que o percentual de custeio da União dependerá diretamente da renda bruta Empresarial do ano de 2019.
Tema de extrema importância na aplicabilidade da MP 936 é a análise da decisão liminar proferida na AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 6.363/DF, pela qual requereu o partido político Rede Sustentabilidade o deferimento de cautelar para suspender o uso de acordo individual para dispor sobre as medidas de redução de salário e da suspensão de contrato de trabalho, bem como a inconstitucionalidade dos dispositivos da MP 936 que tratam do tema.
Em decisão liminar o Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski decidiu por deferir parcialmente o pedido cautelar.
Da detida análise da liminar do Ministro, nota-se que a decisão proferida nos traz problemas de ordem prática e de efetividade, gerando acentuado risco de que os empregadores, diante da dificuldade de formalizar a concessão dos benefícios da MP, entendam por dar preferência em rescindir os contratos de trabalho.
Fala-se isto, pois a decisão cautelar estabelece que os acordos individuais formalizados somente produzirão efeitos após comunicação e manifestação do Sindicato da categoria2, para que este, querendo, deflagre a negociação coletiva, importando sua inércia em anuência com o acordado pelas partes3.
Ocorre que a prática de negociação coletiva nos mostra inúmeros entraves negociais para aceitação, pelo Sindicato, dos acordos individuais, perdendo a MP, sua efetividade e as urgências tão buscadas.
Na hipótese de formalização do Acordo Individual e aplicação imediata da regra, poderá o Sindicato posteriormente não concordar com os termos do Acordo individual, afastando os seus efeitos.
Além disso, o relator aponta que na omissão do sindicato o acordo individual terá validade, fazendo mansão ao artigo 617 da CLT, o qual possui um procedimento de formalização de acordos coletivos extremamente burocrático e, se observado em face da urgência trazida pela MP 936, poderia inviabilizar a aplicação dos benefícios emergenciais, principalmente em razão da necessidade dos empregadores aplicar as medidas com a maior celeridade possível.
Considerando a prática sindical, é sabido que são grandes as chances de os acordos individuais não serem aceitos em razão de ordem negocial, jurídica, política e histórica envolvendo os sindicatos e empresas, ferindo os princípios de celeridade e de urgência que a MP pretendeu estabelecer.
Ainda, não podemos deixar de ter em mente que as atividades, inclusive a dos sindicatos, estão suspensas em razão da pandemia vivenciada, tornando ainda mais difícil a negociação e aplicação do procedimento pretendido inicialmente pelo relator.
No entanto, vale ressaltar que no dia 13/4/20, em razão do Embargos de Declaração oposto pela Advocacia Geral da União (AGU), foi proferida nova decisão pelo ministro Ricardo Lewandowski, que apesar de manter a liminar proferida, esclareceu alguns pontos importantes.
Um dos pontos de maior relevância da decisão dos Embargos Declaratórios possui relação com os efeitos do acordo individual, vejamos:
Diante de todo o exposto, esclareço, para afastar quaisquer dúvidas, e sem que tal implique em modificação da decisão embargada, que são válidos e legítimos os acordos individuais celebrados na forma da MP 936/20, os quais produzem efeitos imediatos, valendo não só no prazo de 10 dias previsto para a comunicação ao sindicato, como também nos prazos estabelecidos no Título VI da Consolidação das Leis do Trabalho, agora reduzidos pela metade pelo art. 17, III, daquele ato presidencial.
Aponta o ministro em seus esclarecimentos que os acordos individuais produzem efeitos imediatos, alterando a decisão liminar anteriormente proferida que vinculava a validade do acordo individual à manifestação do ente sindical.
Neste aspecto, reputamos favorável a interpretação dada pelo Ministro em sua decisão. Porém, nos termos da decisão, permanece a regra prevista de que na omissão do sindicato as empresas devem seguir por completo o procedimento do artigo 617 da CLT, com prazo pela metade, fato que ainda pode causar insegurança jurídica diante das inúmeras dificuldades que os empregadores terão para comunicar os sindicatos, federações e as confederações.
Nota-se ainda que a decisão cria a “possibilidade” de adesão do empregado às normas coletivas posteriores, mesmo já tendo sido formalizado acordo individual, aplicando-se o princípio da norma mais favorável, o que da margem de interpretação da possibilidade de aplicação da teoria da acumulação (soma de fragmentos de normas distintas para aplicação daquilo que é mais favorável). Tal posicionamento, além de criar dificuldades aos empregadores de ordem prática, afronta à interpretação dada pela Reforma Trabalhista no artigo 620 da CLT.
Deve-se levar em consideração ainda a existência de retroatividade da norma coletiva, em caso de eventual acordo individual abarcar ulterior hipótese não prevista em negociação coletiva.
Portanto, em que pese esta adequação dada pelo STF na decisão em Embargos de Declaração, com todo respeito à decisão proferida pelo Ministro relator, ainda poderá inviabilizar a prática de acordos individuais relativos à MP 936, minimizando extremamente os efeitos e finalidades da norma, gerando riscos se na hipótese de não seguimento dos acordos individuais os empregadores optarem pela rescisão dos contratos de trabalho, inclusive sob o argumento de aplicação do fato do príncipe previsto no artigo 486 da CLT4.
Tal decisão prejudica não apenas os empregadores, mas também a classe trabalhadora, que pode se ver diante de milhões de rescisões de contrato de trabalho em razão da extrema “burocracia” aplicada pelo STF na MP 936.
Por fim, a ADIn 6.363/DF será definitivamente julgada em sessão plenária no STF na data de 16/4/20, quando novamente poderá haver mudanças na aplicabilidade da MP 936.
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1 Parágrafo único. Para os empregados não enquadrados no caput, as medidas previstas no art. 3º somente poderão ser estabelecidas por convenção ou acordo coletivo, ressalvada a redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e cinco por cento, prevista na alínea “a” do inciso III do caput do art. 7º, que poderá ser pactuada por acordo individual.
2 Por isso, cumpre dar um mínimo de efetividade à comunicação a ser feita ao sindicato laboral na negociação. E a melhor forma de fazê-lo, a meu sentir, consiste em interpretar o texto da Medida Provisória, aqui contestada, no sentido de que os “acordos individuais” somente se convalidarão, ou seja, apenas surtirão efeitos jurídicos plenos, após a manifestação dos sindicatos dos empregados.
3 Na ausência de manifestação destes, na forma e nos prazos estabelecidos na própria legislação laboral para a negociação coletiva, a exemplo do art. 617 da Consolidação das Leis do Trabalho será lícito aos interessados prosseguir diretamente na negociação até seu final.
4 Art. 486 - No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.
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