Aceite-se ou não, a lógica que impera nas relações privadas atuais é quase que exclusivamente financeira: reduzir custos e incrementar lucros. E diante de uma surpreendente pandemia que paralisou o planeta, é natural que as partes de um contrato conjecturem, com maior ou menor legitimidade, saídas judiciais para modificar as bases financeiras dos negócios em curso.
Não há dúvida quanto à imprevisibilidade do fenômeno e dos seus deletérios efeitos na economia e nos contratos. Se o cumprimento se tornou impossível, o contrato poderá ser resolvido, com retorno das partes ao estado anterior. Se a prestação se tornou excessivamente onerosa, o contrato poderá ser revisto. É isso que em linhas gerais prevê o ordenamento jurídico com os conceitos de caso fortuito/força maior, imprevisão e onerosidade excessiva, que têm sido reiteradamente citados nas ações que já se multiplicam no judiciário.
Mas a judicialização em massa é a melhor alternativa? Mais do que isso: terão os contratantes razoável segurança de que seus pleitos serão atendidos? Note-se que há no episódio atual um quê de novidade, já que ele impactou ao mesmo tempo todos os setores sociais e econômicos. Não se trata de um fato natural localizado ou de uma súbita elevação do câmbio que afeta somente as operações a ele vinculadas, casos tradicionais de resolução ou revisão contratual.
Se o ineditismo da situação por si só gera insegurança quanto à resposta que afinal será dada pelo Judiciário, as partes também deverão estar atentas ao seu comportamento ético e social. A moderna teoria contratual assenta-se nos princípios da probidade, boa fé objetiva e solidarismo, sendo o contrato visto como uma ordem de cooperação. Nesse sentido, todo o esforço para a preservação do contrato e atingimento do seu escopo fundamental certamente será bem visto pelo Judiciário, se a ele a discussão chegar. Por outro lado, comportamentos oportunistas certamente serão censurados.
A situação atual reclama soluções diferentes, nem sempre coincidentes com os referenciais da lei (diga-se, por exemplo, que aplicar agora as normas protetivas do consumidor levaria à destruição do setor aéreo, razão pela qual foram editadas normas específicas para a proteção daquele setor). No plano privado, o mesmo deve ocorrer. As partes, que bem mais que o juiz conhecem a operação econômica objeto do contrato, devem buscar com ponderação e responsabilidade a readequação e manutenção dos contratos, cientes de seu papel fundamental na superação desta grave crise.
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