O direito de sequência constitui, de acordo com o artigo 38 da Lei de Direitos Autorais, no direito do artista plástico, ou seus herdeiros, em obter 5% sobre o aumento do preço eventualmente verificável em cada revenda de obra de arte no mercado brasileiro.
Esse direito, com base na Lei Federal vigente, só é verificável se (e somente se) constatado lucro entre a venda precedente e aquela última realizada pelo proprietário da obra de arte ou através de um agente intermediário deste segmento econômico, seja uma galeria de artes, marchand, organizadores de leilões, ou leiloeiros, numa última ponta.
Passa-se, e com razão, a ser um ônus do artista plástico ou de seus herdeiros a mapear as vendas daquele artista, desde a venda direta em ateliê às indiretas nos mercados secundários de leilões e exposições de artes, em geral, que fixa os preços dos artistas e dá parâmetros ao mercado.
E foi isso que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro considerou em importante leading case sobre o tema em relação às obras de Cândido PORTINARI, nos autos do processo 0258468-48.2012.8.19.0001, ao concluir que o herdeiro não fez prova constitutiva de seu direito.
Instituições de Direito Privado, contudo, e enxergando no direito de sequência uma verdadeira galinha dos ovos de ouro, vêm se consolidando e mobilizando artistas e sucessores a fim de representá-los extrajudicialmente ou judicialmente, a ponto de emparedar o mercado de artes.
Essas Instituições, em uma postura predatória, não só violam a Lei de Liberdade Econômica (Lei 13.874/19), como dão um tiro no próprio pé destes artistas ou herdeiros, pois o mercado, em decorrência do princípio da liberdade econômica e da livre iniciativa (artigo 170 da Constituição Federal), acaba por se recusar a negociar as obras dos artistas representados por estas Instituições, que estão a cada vez mais apertando os intermediários das obras de arte.
Além do mais, essas Instituições, que de filantrópicas não têm nada, ao tentarem ser mandatárias dos artistas e herdeiros violam a própria essência do direito de sequência, que tem como um de seus preceitos a inalienabilidade do direito previsto no artigo 38 da lei 9.610/98.
O que os herdeiros querem, então, extrajudicialmente ou mesmo nas ações judiciais que distribuem perante o Poder Judiciário, é garantir uma remuneração perene, e sem esforços, a ponto de auferir 5% sobre qualquer transação, o que não encontra embasamento legal.
Por fim, esses mesmos artistas e herdeiros, que tanto se valeram do mercado de artes em épocas passadas, agora tentam, por meio do Projeto Lei 6.890/13, aprovar uma lei que concedem a eles, artistas e herdeiros, 3% sobre as transações no mercado de arte, independentemente se verificável ou não o lucro na última transação.
Isso não só constituirá verdadeiro enriquecimento sem causa, vedado pelo artigo 844 do Código Civil, como criará uma deturpada figura, como se um “laudêmio” fosse, a incidir nas vendas de obras de artes, pois, a cada revenda, artistas e herdeiros se valeriam deste percentual de 3%, inobstante a verificação do lucro na operação.
Obviamente, se aprovado esse Projeto Lei no Congresso Nacional, medidas judiciais não faltarão diante dos Tribunais Superiores para questionar a validade jurídica desta (nova) Lei, que, a um só tempo, viola princípios constitucionais e infraconstitucionais de nosso ordenamento jurídico.
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*Cândido Carneiro é advogado, sócio de Cândido Carneiro Advogados.