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Chartered Institute of Arbitrators – CIArb: Recomendações sobre procedimentos remotos de resolução de conflitos

As Recomendações do CIArb para audiências virtuais podem ser um instrumento de grande utilidade prática para assegurar a viabilidade técnica e a regularidade jurídica dos procedimentos. Não dispensam a aplicação dos parâmetros legais que garantem o devido processo legal.

13/4/2020

1. Objeto

O Chartered Institute of Arbitrators – CIArb, instituição fundada em Londres em 1915 com representação no Brasil (CIArb Brazil Branch) desde 2019, edita regularmente diretrizes acerca de aspectos variados dos sistemas de resolução de disputas. As diretrizes do CIArb condensam práticas consolidadas e procedimentos recomendados a partir da experiência de grupos de especialistas. São divulgadas em seu website www.ciarb.org e amplamente aplicadas, por escolha das partes ou como soft law, para orientar a atuação dos envolvidos na resolução de controvérsias.

No início de abril de 2020, tendo em vista as necessidades urgentes e imprevistas derivadas dos reflexos das medidas de contenção da pandemia do Covid-19 sobre a resolução de controvérsias, o CIArb divulgou sua Guidance Note on Remote Resolution Proceedings – traduzida para o português pelo CIArb Brazil Branch como Recomendações sobre Procedimentos Remotos de Resolução de Conflitos.

Esta nota destina-se a apresentar as Recomendações e incentivar as instituições de arbitragem e mediação, árbitros, mediadores, advogados e usuários dos instrumentos de resolução de conflitos a conhecê-las e aplicá-las em seus procedimentos concretos e futuros contratos.

2. Comissão de especialistas

Tal como ocorre com as diretrizes editadas pelo CIArb, as Recomendações resultam do trabalho de comissões internacionais de especialistas responsáveis pela redação e revisão do texto.

No caso das Recomendações, a comissão de revisão teve a participação de uma brasileira, Carolina Morandi, secretária geral do Centro de Arbitragem e Mediação AMCHAM, em São Paulo.

3. Propósito

Conforme consta do seu preâmbulo, as Recomendações são uma contribuição do CIArb para que as dificuldades resultantes do isolamento social e da quarentena resultante do Covid-19 não sejam um obstáculo ao prosseguimento da resolução de disputas. Pretende-se com isso favorecer a atividade econômica, o que é instrumental para a superação sustentável da crise e restabelecimento pleno das relações comerciais.

Segundo as Recomendações, “A pandemia global da COVID-19 tem afetado severamente a vida pessoal e profissional das pessoas em todo o mundo. Inúmeros governos têm sido obrigados a impor medidas de restrição rigorosas às pessoas físicas e jurídicas, o que resultou em repercussões muitas vezes prejudiciais às relações comerciais”.

Por decorrência, “é responsabilidade de todos contribuir para o esforço global de evitar a propagação do vírus. No entanto, o CIArb acredita que a solução de controvérsias mediante a adoção de meios adequados de resolução de disputas não deve, na maioria dos casos, ficar na dependência das circunstâncias conjunturais. Assim, os negócios não precisam sofrer com litígios que ficam sem solução devido à impossibilidade de as partes se reunirem fisicamente para resolvê-los. O CIArb busca assegurar às partes em conflito que, na maioria dos casos, com a adoção das cautelas adequadas apontadas nestas Recomendações, possam valer-se de procedimentos remotos para a resolução completa de suas disputas”.

Em linha com a constatação generalizada que o esforço comum para o enfrentamento da crise global deve conduzir a alterações e aprimoramentos nas práticas anteriores, o CIArb aponta que, embora as Recomendações pretendam ser amplamente aplicáveis à crise sanitária global de 2020, contêm diretrizes permanentes que podem ser aplicadas a qualquer outra situação em que se necessite ou deseje adotar procedimentos remotos para a solução de conflitos, notadamente mediante a realização de audiências virtuais por meio de áudio e videoconferências.

4. Estrutura

As Recomendações se dividem em três partes.

A Parte I, subdividida em seis itens, contém recomendações de natureza prática e tecnológica. Formulam-se orientações sobre a escolha da plataforma adequada, questões de cibersegurança, cuidados na definição dos locais físicos a partir dos quais se dará a participação virtual e a garantia da privacidade das partes na audiência. Por exemplo, há orientações específicas sobre a insuficiência de as partes serem colocadas em “mudo” para conversas privadas, já que a linguagem corporal pode ser reveladora se ainda visível para os demais participantes. Também se destaca que os equipamentos de vídeo e áudio devem permitir uma captação de imagem e som que deixe claro a todos os participantes que ninguém possa ter acesso aos procedimentos sem ter sido previamente autorizado. Pretende-se formular orientações quanto a possíveis problemas tecnológicos: “se um árbitro ou uma das partes perceber que pode ouvir uma reunião privada dentro da sala separada, deve informar a todos os participantes imediatamente e encerrar a conexão”.

A Parte II tem dois itens diz respeito a questões jurídicas e processuais. Seu núcleo é o destaque dos pontos que devem ser acordados entre as partes ou definidos pelo Tribunal Arbitral previamente ou no curso da audiência virtual. Define aspectos específicos que merecem a atenção das partes na elaboração da convenção de arbitragem ou na organização do procedimento. Também trata da escolha dos árbitros adequados, que se recomenda terem familiaridade com as plataformas digitais utilizadas e uma visão positiva de sua utilização. Há recomendações práticas dirigidas especialmente aos árbitros, que “devem ficar sempre visíveis e audíveis para todas as partes do procedimento, salvo no caso de deliberações e/ou discussões entre membros do tribunal arbitral” e “aproveitar as oportunidades disponíveis para deixar claro às partes que elas têm toda a sua atenção durante os trabalhos”.

A Parte III, também com dois itens, dedica-se a detalhar a aplicação das Recomendações a arbitragens institucionais – nas quais as Recomendações se conjugam com as regras ou orientações da própria instituição – e nos procedimentos ad hoc. Destaca-se especialmente o papel do CIArb como autoridade nomeadora (por meio do DAS – Dispute Appointment Service) e a adoção de seu regulamento para arbitragens ad hoc.

Por fim, a parte final (Anexo I) consiste em um checklist de 19 itens que devem ser observados, tanto de natureza jurídica (registro do consenso das partes sobre o uso de procedimentos remotos, plataforma tecnológica e mecanismos de cibersegurança, por exemplo) como técnica, como a disponibilidade de suporte técnico, a prévia realização de testes da plataforma e do sistema de compartilhamento de telas.

4. Conclusões

As Recomendações do CIArb para audiências virtuais podem ser um instrumento de grande utilidade prática para assegurar a viabilidade técnica e a regularidade jurídica dos procedimentos. Não dispensam a aplicação dos parâmetros legais que garantem o devido processo legal.

Ao contrário, ressaltam a sua importância e sugerem providências práticas para que a criatividade e inovação possam ser instrumentos válidos no esforço para conciliar precauções sanitárias indispensáveis e o necessário restabelecimento da atividade econômica. E pretendem extrair desse esforço emergencial lições permanentes para a evolução tecnológica dos mecanismos de resolução de conflitos.  

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*Cesar Pereira FCIArb é presidente do CIArb Brazil Branch. Sócio do escritório Justen, Pereira, Oliveira & Talamini - Advogados Associados.

 

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