Essa é uma pergunta que muitos estão fazendo quando verificam que as obrigações estabelecidas em contratos se tornaram excessivamente onerosas, com sérios riscos de inadimplemento.
Para a maioria dos juristas, o covid-19 corresponde a um evento de força maior, de modo que pode legitimar o não cumprimento de certas obrigações. Nesse sentido, o Código Civil em seu artigo 478 dispõe que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Referido artigo positivou a teoria da imprevisão, já existente na doutrina e jurisprudência nacional. De acordo com esta teoria, contratos de prestação continuada ou diferida, que, por acontecimentos extraordinários e imprevisíveis posteriores à celebração do contrato, cause onerosidade excessiva da prestação para uma das partes e um enriquecimento desproporcional para a outra, poderá a parte prejudicada pleitear a revisão contratual a fim de reequilibrar as prestações. Ou ainda, a sua resolução, caso não se chegue a um acordo.
Importante esclarecer que não são todos os contratos sujeitos à aplicação da teoria da imprevisão, que permite a revisão ou resolução contratual em face do covid-19. É necessário que estes contratos preencham todos os requisitos aqui elencados, quais sejam:
(i) tenha prestação continuada ou diferida;
(ii) alteração do equilíbrio econômico em razão do covid-19, se comparada circunstância atual com a situação fática no momento da celebração do contrato;
(iii) onerosidade excessiva para uma das partes;
(iv) vantagem extrema para a outra parte;
(v) nexo causal da onerosidade excessiva e da vantagem extrema com o covid-19; e
(vi) o beneficiário da revisão ou resolução não esteja em mora em relação à outra parte.
Cada caso concreto precisará ser avaliado individualmente, pois os contratos possuem diferentes disposições sobre reequilíbrio econômico financeiro, que, consequentemente, direcionarão para diversas formas de resolução da demanda.
A fim de resolver essa situação imposta pela pandemia, a melhor possibilidade para ambas as partes é a renegociação contratual. A própria Lei da Liberdade Econômica, por meio do artigo 421-A, inciso iii do Código Civil, indo ao encontro do artigo 479 do Código Civil incentiva essa renegociação ao dispor que a revisão de contratos empresariais somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada, exatamente o que vivemos hoje com o fechamento dos comércios e quarentena.
É de fundamental importância tentar chegar a um consenso no sentido de mitigar os efeitos da pandemia, modificando equitativamente as condições do contrato, mesmo que por tempo determinado.
E para se chegar a um acordo é necessária boa-fé de ambas as partes. Ao credor, entender que a situação atual é atípica, imprevisível, e que para manter a parceria que gerara muitos frutos até a pandemia, torna-se necessário flexibilizar algumas obrigações, mesmo que temporiamente.
Isso manteria o prestador com a economia estável, evitaria sua quebra e a necessidade de negociar com um novo player desacostumado ao seu modelo de negócio. Além disso, seria vantajoso para a economia nacional, que veria uma empresa sobreviver em tempos de profunda crise.
O mesmo vale para o devedor, que deveria agir de boa-fé, não se valendo da onerosidade excessiva para inadimplir obrigações que poderiam ser cumpridas, ou se livrar do contrato com vantagem na situação.
As partes poderiam optar inclusive por mediação ou outras formas de resolução de conflitos. Atualmente, muitos profissionais no ramo de resolução de conflitos são capacitados e conseguem resultados muito positivos nestes tipos de situação.
A abordagem sobre (i) redução da prestação; (ii) alteração do modo de execução ou (iii) um novo cenário por tempo determinado são os caminhos para se chegar ao consenso e manter a relação saudável durante e após a pandemia.
Em persistindo a controvérsia e não havendo mais solução, é cabível a revisão judicial do contrato quando as obrigações couberem a apenas uma das partes.
Por fim, caso as partes entendam que o melhor cenário é, de fato, o encerramento do contrato, respeitados os requisitos acima expostos, é possível resolvê-lo provando-se a ocorrência de onerosidade excessiva para uma parte, com extrema vantagem para a outra.
*Este artigo não deve ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico, sendo redigido apenas para fins de debate e informação.
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*Marco Antonio Moreira é advogado do Livelo S.A