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O projeto da nova disciplina jurídica de licitações e contratos públicos – Algumas das principais mudanças trazidas pelo PL 1292/95

O PL 1292/95 propõe a abertura dos procedimentos de manifestação de interesse (PMI) para o regime geral das licitações, conferindo à administração pública a possibilidade de utilizar projetos e estudos elaborados por particulares e que sejam de seu interesse para contratação de obras e/ou serviços.

7/4/2020

É provável que nos próximos meses, após o período de pandemia do covid-19 pelo qual o país atravessa, o PL 1292/951, que estabelece normas atinentes às licitações e aos contratos públicos, entre outras alterações legislativas, revogando a lei Federal 8.666/93, a lei Federal 10.520/02 ("lei do pregão") e alguns dispositivos da lei Federal 12.462/2011 ("Lei do RDC"), seja inserido na pauta de discussão do Senado Federal, após aprovação pela Câmara dos Deputados.

De início, entre as principais alterações trazidas pelo PL 1292/95, destacam-se (i) a inversão de fases como regra nos procedimentos licitatórios; (ii) o orçamento sigiloso da administração pública; (iii) obrigatoriedade de estabelecimento de programa de compliance para contratações de grande vulto; (iv) criação do Portal Nacional de Contratações Públicas – P.N.C.P; (v) criação da figura do agente de contratação; (vi) atualização dos valores de contratação direta; (vii) alteração dos percentuais de valores dos seguros e (viii) incorporação da modalidade conhecida como diálogo competitivo2.

Já conhecidos em outras modalidades de licitação, a inversão de fases e o orçamento sigiloso não são novidades nos procedimentos licitatórios do país, utilizados principalmente nos pregões e nos Regimes Diferenciados de Contratação (RDC). De acordo com o PL 1292/95, a inversão de fases será instituída como regra, mas há possibilidade de adoção do procedimento comum, tal como previsto hoje pela lei Federal 8.666/93, de acordo com a discricionariedade do administrador público.

De outro lado, o orçamento sigiloso é apresentado como facultativo, ou seja, caberá à administração pública decidir se confere publicidade ao orçamento estimado para determinada contratação, embora o edital tenha a obrigatoriedade de fornecer informações suficientes à elaboração das propostas pelos proponentes. Embora o PL faculte a decisão pela adoção do sigilo do orçamento, defende-se que a administração pública não estará isenta de observar o princípio da motivação de seus atos, justificando expressamente a escolha adotada para determinado certame.

Além disso, na esteira das principais operações e projetos de combate à corrupção no país, o PL 1292/95 contempla a necessidade de existência ou compromisso de implementação de programa de compliance nas empresas/organizações proponentes, adstrita às contratações de grande vulto. Em um cenário atual, após a revelação de inúmeros esquemas de corrupção envolvendo contratos administrativos e a participação de grandes empresas e agentes públicos, ao longo da última década, é bastante oportuna a previsão de implementação de políticas anticorrupção por parte de futuros particulares contratados, vindo ao encontro do objetivo da atual legislação atinente à matéria (lei de improbidade 8.429/92 e lei anticorrupção 12.846/13)

Em seguida, buscando acelerar os procedimentos de contratação e uniformizar as informações dos proponentes em nível nacional, o PL 1292/95 propõe a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas – P.N.C.P, apresentado como portal eletrônico oficial das contratações públicas do país, com representantes de diversos entes federativos, funcionando não somente como arquivo-geral dos documentos contratuais – com o objetivo de ampliar a transparência e a publicidade das contratações –, mas também como a grande central de cadastramento das empresas proponentes.

Outra mudança digna de registro é a substituição das comissões de licitação pelos agentes de contratação, que serão responsáveis pela condução dos procedimentos licitatórios, em conjunto com uma equipe de apoio. O PL 1292/95 prevê, ainda, que a comissão de licitação pode ser utilizada excepcionalmente, para contratação de bens e serviços especiais.

Não obstante, como era de anseio dos gestores, o PL 1292/95, reconhecendo as dificuldades diárias da administração pública, amplia os valores máximos que autorizam a contratação direta, isto é, sem a necessidade de procedimento licitatório prévio. Para contratação de serviços em geral, por exemplo, o teto será de R$50.000,00, enquanto obras de engenharia que custem até R$100.000,00 também poderão ser contratadas diretamente.

Grandes mudanças relacionadas às garantias contratuais também são verificadas e, com o objetivo de proporcionar à administração pública mais segurança e efetividade na execução dos contratos, o PL 1292/95 propõe percentuais securitários que podem alcançar 30% do valor da contratação, em caso de contratações de grande vulto, compreendidas como maiores de R$200.000.000,00 (duzentos milhões de reais). O ponto crítico, nesta mudança, é que o custo da garantia contratual poderá impactar diretamente nas propostas comerciais a serem apresentadas pelos licitantes, de modo que a maior segurança conferida à Administração contratante significará, talvez e em contrapartida, propostas menos vantajosas sob o aspecto econômico.

Já o art. 100, do PL 1292/95, propõe a previsão de cláusula contratual conhecida como step-in, abrindo possibilidade de a própria seguradora assumir a execução do contrato administrativo, caso o contratado esteja impossibilitado ou seja incapaz de concluir e entregar os serviços e obras.

Ainda, excluídas as modalidades convite e tomada de preços, o PL 1292/95 propõe a criação da modalidade "diálogo competitivo", através da qual, durante a realização do certame, os proponentes compartilham de sua expertise com relação ao objeto contratado e, após abertura de prazo pela Administração Pública, apresentam soluções inovadoras para execução do contrato.

Por fim, mas não menos importante, buscando conferir qualidade aos projetos apresentados e eficiência na execução do contrato, o PL 1292/95 propõe a abertura dos procedimentos de manifestação de interesse (PMI) para o regime geral das licitações, conferindo à administração pública a possibilidade de utilizar projetos e estudos elaborados por particulares e que sejam de seu interesse para contratação de obras e/ou serviços.

Desta forma, considerando o cenário positivo trazido nas alterações propostas pelo PL 1292/95, bem como os objetivos de desburocratizar os procedimentos e conferir celeridade, eficiência e transparência à execução dos contratos, aguarda-se, agora, a apreciação do texto pelo Senado Federal.

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1 Disponível aqui. Acesso em 28/3/2020.

2 NOHARA, Irene Patrícia. Oito principais mudanças com a nova lei de licitação e contratos. Acesso em 28/03/2020.

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*Marília de Oliveira Bassi é advogada associada e integrante da equipe de Direito Administrativo do escritório Giamundo Neto Advogados


 
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