Conforme a pandemia migrava ao Brasil, surgiram alguns casos de pessoas que fingiram estar com o vírus para prejudicar terceiro ou para obter alguma vantagem pessoal. Tal situação é moralmente reprovável, naturalmente. Mas poderia ela trazer consequências penais para o autor? A resposta é positiva. Um exemplo de conduta tipificada como contravenção que pode advir desse contexto é a previsto no art. 41 do Decreto-Lei 3.688/41 (“provocar alarma, anunciando desastre ou perigo inexistente, ou praticar qualquer ato capaz de produzir pânico ou tumulto”). Isso em razão da grande cobertura midiática que há em torno do assunto, de modo que a alegação de que alguém está com o vírus quando sabidamente não está é capaz de causar pânico em razão de um perigo inexistente. Todos os outros que tiveram contato com o agente vão procurar tomar medidas extremas, em razão do alto poder de contágio que a doença possui. O mesmo pode se dizer daqueles que propagam informações falsas (as fake news) a respeito da doença, buscando com isso causar pânico ou tumulto. Para ambas as formas se exigem os requisitos de que o autor saiba que não está doente e que saiba que com suas atitudes vai causar um grande transtorno.
Outra figura aparentemente típica ao fingir o contágio é quando a pessoa vai ao pronto-socorro e solicita um atestado, alegando falsamente estar com os sintomas do vírus, ou faz inserir tal informação em qualquer documento, incidindo, então, no delito de falsidade ideológica previsto no art. 299 do Código Penal (“omitir, em documento público ou particular, declaração que dele deva constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”).
Uma terceira situação criminosa, relacionada à do cenário anterior, é do médico que, sabendo que o paciente não está com o vírus, ainda assim lhe faz um atestado falso, eximindo-o de suas responsabilidades durante o período recomendado de isolamento, conforme tipifica o art. 302 do Código Penal (“dar o médico, no exercício de sua profissão, atestado falso”). Como se vê, são infrações previstas antes da existência da pandemia, mas que dão conta de punir os responsáveis.
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*Victoria de Barros e Silva é advogada e membro do Escritório Professor René Dotti.