Revolução no Judiciário
Angelo Caldeira Ribeiro*
Desde que foi iniciada uma série de reformas no Código de Processo Civil no início da década de 90, acompanhada de duas reformas constitucionais e outras leis emendando também a legislação processual criminal e trabalhista, o Judiciário somente piorou. Na média, os processos demoram cada vez mais tempo para ser julgados. Uma execução que demora anos somente para citar o devedor ou processos penais que prescrevem antes da sentença condenatória do criminoso são cada vez mais comuns.
A maioria dos advogados, juízes e demais “operadores do direito” concorda que as reformas, em sua essência, melhoraram a legislação, mas nem de perto foram suficientes para enfrentar a enorme demanda reprimida de justiça que a população e as empresas têm no Brasil. Ou seja, a reforma foi apenas parcial. A esperança está na revolução eletrônica que revoluciona o mundo, desde a década de 70, e é considerada como uma das principais ferramentas do progresso e do crescimento econômico global. Os aumentos de transparência e eficiência são tão brutais que, hoje, a maioria das pessoas sequer consegue trabalhar em uma empresa sem um computador à sua frente.
O universo da Justiça, porém, mais refratário às mudanças, é também lerdo na incorporação das novas tecnologias. E não se trata de falta de recursos. O Brasil é um dos países que mais gasta com o Poder Judiciário em proporção ao PIB no mundo. Os gastos do governo federal para manter o Poder Judiciário são 4,8 vezes maiores do que a média de todos os países, de acordo com estudo feito pelo próprio Ministério da Justiça. O governo gastou, em média, R$ 28,5 bilhões por ano com o Judiciário entre 1995 e 2002, o que coloca o Brasil na liderança no ranking dos países que gastam as maiores parcelas de seus orçamentos com a Justiça, ou seja, 3,66% do total. Os salários dos juízes federais brasileiros estão entre os maiores do planeta – perdendo apenas para os do Canadá. O país ainda é o segundo gasto per capita com a administração do Judiciário: R$ 9,84 milhões a cada 100 mil habitantes. A campeã é a Itália, com R$ 10,76 milhões, enquanto a média mundial é de R$ 2,04 milhões gastos no Judiciário por 100 mil habitantes, de acordo com números do Banco Mundial.
Um batalhão de escreventes e de juízes é mobilizado para fazer o trabalho de colocar capa nos processos, carimbar, furar e numerar documentos, expedir ofícios, despachar e atender os advogados no balcão dos fóruns, entre outras ações, que nada têm nada a ver com a decisão judicial esperada pelos litigantes, mas que são necessárias para que o processo tenha a sua marcha. Estes trabalhos serão total ou quase totalmente eliminados com a implantação do processo eletrônico, que poderá ser adotado universalmente após a esperada aprovação do projeto de lei nº 5.828 de 2001, que já passou no Senado e precisa apenas voltar à Câmara dos Deputados para mais uma votação em caráter definitivo.
Muitos advogados também já estão se preparando para esta revolução, com a informatização da gestão e organização interna dos seus escritórios por meio da adoção de softwares que automatizam todos os seus procedimentos internos, desde a parte financeira e administrativa até o controle dos casos dos clientes. Além dos óbvios benefícios que a informatização traz, quem já estiver com os sistemas certos terá grande facilidade em lidar com os processos judiciais eletrônicos, melhorando sua posição no concorrido mercado jurídico.
Mas a esfera privada parece estar encontrando mais dificuldades para mudar que a pública. Em pesquisa realizada na cidade de São Paulo, 46% dos escritórios de advocacia afirmaram não possuir qualquer tipo de software de gestão e os 54% que dispõem de algum sistema acham em sua maioria que o programa que estão utilizando não atende às demandas minimamente necessárias. A máquina de escrever deu lugar ao computador, mas este ainda é subutilizado por falta de absorção de tecnologia voltada para a gestão tecnológica. A maneira como se conduz um processo judicial no Brasil permanece basicamente o mesmo desde as Ordenações Afonsinas, primeiro conjunto de Leis organizadas que Portugal promulgou no século XV. Depois de mais de 500 anos, chegou a hora da Justiça e dos advogados acompanharem o resto da sociedade e entrarem no século 21 para valer.
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* Advogado e fundador da Lawsoft Desenvolvimento de Sistemas
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