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Alterações propostas pelo projeto de lei 10.877/18 na lei de improbidade administrativa: Mudanças efetivas?

A proposta de alteração tem como fundamento adequar a lei 8.429/92 aos novos diplomas legislativos correlatos, bem como às construções hermenêuticas da jurisprudência, consolidadas em decisões dos tribunais superiores e ainda realizar mudanças que se mostraram necessárias ao longo do tempo no intuito de aperfeiçoá-la

10/3/2020

A lei 8.429/92 foi editada quatro anos após o art. 37, § 4º da Constituição Federal prevê a aplicação de sanções em razão da prática de atos de improbidade administrativa, tendo o diploma legal acima mencionado elencado os atos tipificados como de improbidade administrativa, descreveu a gradação das sanções aplicadas e dispôs sobre seu rito processual, prescrição e outras disposições gerais.

Transcorridos mais de 25 anos de sua publicação, foi criada uma comissão coordenada pelo ministro Mauro Campbell, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) responsável pela elaboração de uma proposta de alteração da lei 8.429/92, o qual foi concluída no segundo semestre de 2018 e se encontra, atualmente, em trâmite no Congresso Nacional.

A proposta de alteração tem como fundamento adequar a lei 8.429/92 aos novos diplomas legislativos correlatos, bem como às construções hermenêuticas da jurisprudência, consolidadas em decisões dos tribunais superiores e ainda realizar mudanças que se mostraram necessárias ao longo do tempo no intuito de aperfeiçoá-la. Paralelo a este projeto, começou a tramitar no Senado Federal em 2019 o projeto de lei 3.359/19 que também se destina a promover alterações na lei 8.429/92, o qual se encontra em análise na CCJ.

Algumas das principais alterações trazidas pelo projeto de lei 10.877/18 são a supressão da possibilidade de punição do ato de improbidade administrativa fundamento na culpa do agente, traz ainda novos parâmetros para a aplicação das sanções previstas no seu art. 12, alterando os prazos mínimos e máximos das sanções de suspensão dos direitos políticos e da proibição de contratar com o Poder Público, as quais passam a variar agora entre 04 (quatro) a 12 (doze) anos, bem como a inclusão da possibilidade da aplicação da pena de cassação de aposentadoria nos casos que preveem a possibilidade da perda da função pública, definindo que a referida sanção abrange todo vínculo com a Administração Pública, pondo fim à polêmica quanto à abrangência da referida sanção. Ainda com relação às sanções, há inclusão de previsão de que a multa poderá ser aumentada em até o triplo em razão da situação econômica do réu, podendo ser o ressarcimento do dano cumulado com as demais sanções previstas. Por fim, em relação às sanções, quando aos atos que causam menor ofensa aos bens jurídicos tutelados, além do ressarcimento do dano e da perda dos valores obtidos, a pena pode se limitar ao pagamento da multa. A indisponibilidade de bens passa a ficar condicionada à oitiva dos réus, podendo recair sobre bens de família, desde que ausentes outros bens.

Um ponto muito importante dizia respeito à supressão da vedação à realização de acordos na ação civil por ato de improbidade administrativa, porém em razão da aprovação da lei 13.964/19 (Lei Anticrime), que passou a prever a possibilidade de celebração de acordo de não-persecução civil e a ainda a utilização de outras modalidades de solução consensual na ação civil por ato de improbidade administrativa, a alteração restou prejudicada, mantendo-se apenas as disposições quanto a seu procedimento.

Outra inovação de grande relevância é a inclusão do § 3º ao art. 21, o qual dispõe que as sentenças cíveis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade administrativa quando decidirem pela inexistência da conduta ou pela negativa de autoria. Por fim, há previsão ainda de elevação dos prazos prescricionais, com disposição expressa acerca da imprescritibilidade da reparação do dano ao erário, incorporando posição jurisprudencial firmado pelo Supremo Tribunal Federal.

Nesse diapasão, podemos verificar que várias dessas modificações propostas buscam trazer mais efetividade na ação civil pública por ato de improbidade administrativa, como a possibilidade de suspensão do prazo de contestação caso haja interesse na celebração de acordo, alteração que coaduna com o moderno direito administrativo que cada vez mais abre espaço para a utilização dos meios de solução alternativa de conflitos, trilhada também no Código de Processo Civil de 2015.

O projeto também consolida e põe fim a divergências de interpretação que dava ensejo a várias dúvidas, como a divergência a respeito do campo de abrangência da sanção de perda da função pública, estabelecendo-se que alcança toda a Administração Pública, ocorrendo o mesmo na hipótese de aplicação da sanção de proibição de contratar com a Administração Pública onde se fixou como regra que alcança todos os entes, podendo, no entanto, ser limitada desde justificadamente.

Na trilha das garantais fundamentais, os incisos I à IV ao § 3º do art. 17, estabelecem como requisitos da petição inicial a individualização das condutas de cada réu, salvo impossibilidade de fazê-lo, como forma de preservar os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa.

Nesse sentido, o projeto de lei em trâmite buscou privilegiar o princípio da segurança jurídica, ao esclarecer vários pontos que geravam dúvidas na sua interpretação.

Outrossim, ao suprimir a tipificação do ato de improbidade administrativa em razão da prática de conduta culposa, como possibilita, atualmente, o art. 10 da lei 8.429/92, demonstrou-se a intenção em buscar punir o administrador desonesto, desleal no trato da coisa pública e não o gestor negligente ou menos preparado, já que há instrumentos específicos e menos gravosos destinados a esta finalidade.

No entanto, ainda que tenham sido previstas alterações a fim de assegurar a incorporação de critérios mais objetivos para caracterização dos atos de improbidade administrativos em razão da violação de princípios, uma das principais celeumas neste tipo de ação, isso porque a configuração do elemento anímico é extremamente dificultosa,  bem como a caracterização da violação do princípio, já que tais modificações buscam assegurar a segurança jurídica na gestão da coisa pública e evitar o ingresso com ações por ato de improbidade administrativa apenas em razão de divergência de entendimentos e interpretações legais, as referidas propostas ainda não se mostram suficientes para tanto, isso porque ainda permite uma margem de subjetividade para a imputação deste tipo de ato de improbidade administrativa, já que a definição de um princípio é aberta.

No mesmo sentido, podemos observar, em relação aos parâmetros para aplicação das sanções, que apesar de apresentar uma descrição mais detalhada no projeto de lei em discussão, ainda não traz critérios objetivos para tanto, a fim de possibilitar o exercício, de forma efetiva, das garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa.

Assim, numa uma visão geral, chegamos à conclusão de que as alterações na lei 8.429/92 propostas pelo projeto de lei 10.887/18, apesar de ainda apresentarem necessidade de adequações no sentido de descrever critérios mais objetivos para a imputação de atos de improbidade administrativa por violação a princípios, bem como para a mensuração das sanções, trazem diversos avanços tanto no âmbito da proteção aos direitos e garantias fundamentais, como, principalmente, no combate à corrupção, razão pela qual deve ser amplamente discutido em todos os setores, trazendo a legitimidade necessária à sua efetivação, uma vez que importará em benefícios para a coletividade, isso porque, sendo o combate à corrupção, de forma preventiva e repressiva, um dos objetivos da lei 8.429/92, a lição Emerson Garcia traz pertinente colocação sobre a importância da observância dos deveres de honestidade e boa-fé na Administração Pública junto à coletividade, vejamos “Do mesmo modo que as pessoas jurídicas de direito privado, as de direito público também gozam de determinado conceito junto à coletividade, do qual muito depende o equilíbrio social e a subsistência de várias negociações, especialmente em relação: a) aos organismos internacionais, em virtude dos constantes empréstimos realizados; b) aos investidores nacionais e estrangeiros, ante a freqüente emissão de títulos da dívida pública para a captação de receita; c) à iniciativa privada, para a formação de parcerias; d) às demais pessoas de direito público, o que facilitará a obtenção de empréstimos e a moratória de dívidas já existentes etc.”

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GARCIA, Emerson. Improbidade Administrativa. 9ª ed. Ed. SaraivaJur. 2017.

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*Acácia Regina Soares de Sá é juíza de Direito Substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Professora de Direito Constitucional e Administrativo da Escola de Magistratura do Distrito Federal – ESMA.

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