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ISS – Lei Complementar N.º 116/2003 - Exportação e importação de serviços

fórum que discute a liberação das tarifas entre os países das Américas, e onde os Estados Unidos da América-EUA tentam a todo custo conseguir a liberalização do setor de serviços, a Lei Complementar em 01 de agosto de 2003, inovou ao inverter a situação que até então conhecíamos, qual seja de passar a desonerar as exportações de serviços e tributar as importações.

27/11/2003

 

ISS – Lei Complementar N.º 116/2003 - Exportação e importação de serviços

 

Douglas Mota*

 

Em tempos de discussão da formação da Área de Livre Comércio das Américas-ALCA, fórum que discute a liberação das tarifas entre os países das Américas, e onde os Estados Unidos da América-EUA tentam a todo custo conseguir a liberalização do setor de serviços, a Lei Complementar em 01 de agosto de 2003, inovou ao inverter a situação que até então conhecíamos, qual seja de passar a desonerar as exportações de serviços e tributar as importações.

 

Não se sabe se essa modificação antevê problemas para o setor quando da formação do bloco econômico, todavia, o certo é que tenta de alguma forma igualar a tributação de serviços.

 

1. Exportação de Serviços

 

No tocante às exportações de serviços, a Constituição Federal desde a sua edição1 previa que caberia à Lei Complementar desonerar do ISS as exportações de serviços, todavia, somente após quase 15 anos de sua promulgação é que o legislador complementar resolveu apreciar a questão, o que demonstra a preocupação quanto a esse assunto.

 

Contudo, apesar de agora a LC possibilitar o não recolhimento ISS nos casos de serviços prestados ao exterior, é possível afirmar que esse dispositivo não será facilmente aproveitado pelos contribuintes, como demonstra a redação do dispositivo:

“Art. 2º - O imposto não incide sobre:

 

I – as exportações de serviços para o exterior do País.

(...)

 

Parágrafo único: Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.”

Dessa forma verifica-se que é condição para o não recolhimento do ISS que o resultado do serviço não ocorra em solo brasileiro. Assim, é importante a definição do que viria a ser o resultado do trabalho.

 

Estaria dispensada do pagamento do ISS a empresa brasileira que desenvolvesse projeto de engenharia encomendando por tomador francês que deseja construir prédio em Paris, tendo em vista que o projeto causará efeitos fora do território brasileiro? Ao aceitar esse exemplo como enquadrado na desoneração do ISS estaríamos afirmando que o legislador ao referir-se a resultado estaria a imaginar que resultado é o efeito causado pelo serviço prestado.

 

Todavia, é importante considerar que o serviço de desenvolvimento do projeto se exaure em si, a execução desse trabalho não faz parte do serviço contratado, assim, não haveria possibilidade de que a execução seja considerada como o resultado do serviço. Contudo, é importante lembrar que o legislador é leigo2 no sentido técnico do direito, assim, seria plenamente compreensível se ele ao desejar desonerar as exportações de serviço que causem efeitos no exterior, acabou por incluir o termo resultado, que pode causar duplo entendimento.

 

Destarte, penso que o ideal seria que ao referir-se a resultado, devesse o legislador substituí-lo pelo termo efeitos, pois somente assim se atingiria verdadeiramente a exportação de serviços, pois ao contrário chegaríamos à conclusão absurda de que para não recolher o ISS terá o prestador de se deslocar até solo estrangeiro e lá desenvolver a atividade encomendada.

 

2. Importação de Serviços

 

Definiu a LC 116/03 que:

Art. 1º - O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

 

Parágrafo 1º - O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País.

 

Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:

 

I - do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1º do art. 1º desta Lei Complementar.

Verifica-se que a LC 116/03 acabou por criar um novo fato gerador do ISS, qual seja a importação de serviços. Assim, o legislador complementar aceitou a idéia de que a lei nacional possa gerar efeitos sobre um fato ocorrido fora dos limites territoriais brasileiros.

 

Dessa forma, nos parece duvidosa a constitucionalidade desse dispositivo, em razão do que dispõe a Constituição Federal acerca do ISS, vejamos:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

 

§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:

 

I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas;

 

II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.

Como se sabe o texto constitucional não cria tributos, mas sim confere a competência para que os entes federais os criem. Contudo, a Constituição Federal traça a regra matriz da incidência tributária, de forma que qualquer lei que venha de alguma forma a complementar o texto constitucional deverá observá-la.

 

Essa disposição vale também para o ISS, sendo que sua regra matriz de incidência indica, dentre todos os seus componentes, o aspecto espacial do ISS, ou seja, o limite territorial para o exercício da competência tributária, que no caso do imposto em questão seria o território do município onde ocorreu o fato que dá ensejo à incidência normativa.

 

Assim, resta dúvida se poderia ou não a LC 116/03 inovar e dessa forma criar um novo fato gerador do ISS. Para melhor análise da questão é importante a leitura do que dispõe a Constituição Federal:

 

Art. 146. Cabe à lei complementar:

I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

 

II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

 

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

 

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

 

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;

 

c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.

Percebe-se que a Constituição Federal prevê a possibilidade da edição de lei complementar para a fixação de norma geral no tocante a definição de fatos geradores de impostos. Ocorre que a leitura desapercebida desse texto poderia nos levar a conclusão que a LC 116/03 está em perfeita consonância com a CF, todavia, esse dispositivo não pode ser analisado de forma independente.

 

Primeiramente, a CF não conferiu poderes irrestritos ao legislador complementar, de forma que esse ao seu gosto possa inovar a editar regras3 criando normas gerais a serem aplicadas ao direito tributário. Deve o legislador complementar basear-se no que dispõe a CF e assim complementar o texto constitucional.

 

Em razão disso, penso que a LC 116/03 no tocante a importação de serviços não está em harmonia com a CF, tendo em vista que o texto constitucional não prevê, quando traça a regra matriz do tributo, a possibilidade da cobrança no caso de importação de serviços. Desse cabe aos contribuintes discutirem tal regra.

 

Passada a discussão quanto à inconstitucionalidade desse novo fato gerador, cabe a análise da regra criada, que promete ser bastante polêmica, tendo em vista que se estabeleceu a tributação dos serviços ‘provenientes’ do exterior do país ou cuja prestação tenha se iniciado no exterior. Na prática, é possível imaginar-se que serão considerados ‘provenientes’ do exterior todos os serviços prestados por empresas localizadas fora do país, cabendo, nesse caso, a responsabilidade pelo pagamento do imposto ao respectivo tomador ou intermediário, nos termos do art. 6º, §2º, I.

 

Contudo, ao contrário da regra criada para as exportações de serviços, não há a previsão expressa de que o serviço deverá causar resultado em solo brasileiro. Assim, ou o legislador teve a intenção de criar duas regras, uma valendo para as exportações, e outra para as importações, o que seria um absurdo em termos de justiça fiscal, ou a idéia é que haverá a tributação dos serviços importados somente quando esses aqui causem resultado, como é o caso das exportações. Frise-se que como ‘resultado’ entenda-se, ao meu ver, efeitos, como já mencionado anteriormente.

 

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1Inicialmente a disposição estava prevista no § 4º, II do artigo 156, todavia, após as modificações inseridas pela Emenda Constitucional n.º 37, de 12/6/02, essa previsão passou a constar do § 3º, II.

2“Os membros das Casas Legislativas, em países que se inclinam por um sistema democrático de governo, representam os vários segmentos da sociedade. Alguns são médicos, outros bancários, industriais, agricultores, engenheiros, advogados, dentistas, comerciantes, operários, o que confere um forte caráter de heterogeneidade, peculiar aos regimes que se queiram representativos. E podemos aduzir que tanto mais autêntica será a representatividade do Parlamento quanto maior for a presença, na composição de seus quadros, dos inúmeros setores da comunidade social.

Ponderações desse jaez nos permitem compreender o porquê dos erros, impropriedades, atécnicas, deficiências e ambigüidades que os textos legais cursivamente apresentam”(Paulo de Barros Carvalho – Curso de Direito Tributário).

3Para Roque Carraza – “Se a lei complementar tributária referida no art. 146 do Diploma Magno não apontar os nortes da Constituição, perderá, por completo, a razão jurídica de existir e, destarte, a ninguém poderá obrigar, muito menos aos legisladores das pessoas políticas, para os quais deve apenas dar orientação, e não fundamento de validade.

Assim, proclamamos, desde agora, que tal lei complementar só pode explicitar o que está implícito na Constituição. Não pode inovar, mas apenas, declarar. Para além destas angustas fronteiras, o legislador complementar estará arrogando-se atribuições que não lhe pertencem e, deste modo, desagregando princípios constitucionais que deve acatar, máxime os que concedem autonomia jurídica às pessoas políticas no que concerne à decretação a arrecadação dos tributos de sua competência. (Curso de Direito Constitucional Tributário – 13ª edição)

 

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* Advogado do escritório Stuber Advogados Associados

 

 

 

 

 

 

 

 

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