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A PEC 53 e os “Perdidos de Vistas”: Será que agora vai?

O presente artigo pretende apresentar o projeto de emenda constitucional 53/15, que possui como objetivo fixar prazo para os pedidos de vista nos processos em trâmite nos tribunais, e analisar o possível impacto dessa proposta no STF.

10/12/2019

O presente artigo pretende apresentar o projeto de emenda constitucional 53/15, que possui como objetivo fixar prazo para os pedidos de vista nos processos em trâmite nos tribunais, e analisar o possível impacto dessa proposta no Supremo Tribunal Federal, que atualmente, apesar da existência de norma em seu regimento interno estipulando um prazo de 10 dias (renováveis por igual período) para devolução de processos solicitados para vista, leva em média 1.095 dias para a devolução dos processos sob vista para o julgamento.

1.  Introdução: pedido de vista ou perdidos de vistas?

Recentemente, o plenário do Supremo Tribunal Federal foi palco de uma discussão entre os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, tendo como motivo o pedido de vista realizado por Mendes, mesmo depois de já ter proferido o seu voto. Lewandowski classificou a atitude de seu colega como inusitada, o que, por sua vez, desencadeou uma áspera discussão.

Inusitada ou não, o fato é que, de acordo com o III Relatório do Supremo em Números: “o Supremo e o tempo”, publicado pela a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, de 1988 a 2013, foram realizados mais de 2.987 pedidos de vista2 no Supremo, sendo que, desse total, 124 processos não haviam sido devolvidos até 31 de dezembro de 2013.

Constatou-se também uma média de duração dos processos ainda não devolvidos, que está no patamar de 1.095 dias e de 346 dias para os para os processos já devolvidos1.  É de se destacar a existência (dentro do universo de processos tratado pelo estudo) de vários processos com múltiplos pedidos de vista , seja do mesmo ministro, seja de ministros diferentes. Os gráficos abaixo3 demonstram um pouco dessa realidade, através da quantidade e da duração média de pedidos de vista no Supremo, por assunto e por ministro:

 

Este cenário é aplicável também ao Superior Tribunal de Justiça, onde, de acordo com levantamento feito pelo próprio Tribunal, anualmente, o total de pedidos de vista é maior do que a devolução dos processos para o julgamento. De 2008 a 2014, foram feitos seis mil pedidos de vistas, com uma média de mil processos por ano, com uma duração média do pedido e o julgamento do processo de 1.020 dias4.

A prerrogativa processual de solicitar vista no escopo do Supremo Tribunal Federal, ganha especial relevância em função de ser esse tribunal, a corte constitucional suprema do Judiciário Brasileiro, o que o faz julgar, eventualmente, assuntos de grande repercussão social. Outra questão que torna o pedido de vista peculiar no STF é a ausência de limitações para devolução do processo. Enquanto, as outras partes, como por exemplo, a Procuradoria-Geral da República e a Advocacia-geral da União, respondem aos ministros do STF, estes não respondem a ninguém.

2. Regimento interno para quê?

O regimento interno do STF prevê um prazo de devolução do processo de dez dias, com a possibilidade de prorrogação automática de mais dez dias, depois dessa prorrogação, todos os pedidos devem ser motivados e justificados5. Apesar da existência de norma no regimento interno do STF, não existe nenhuma sanção em caso de descumprimento do prazo estipulado.

A falta de uma sanção por descumprimento, conciliada com a ausência de uma instituição ou órgão capaz de fazer valer o prazo estipulado no regimento, leva a possibilidade de concentração de poder por determinado ministro, causando, por vezes, a retenção por tempo indeterminado de processos. Como exemplo desse cenário, merece destaque a ADIn 4.650, em que o pedido de vista do ministro Gilmar Mendes suspendeu o julgamento por mais de um ano, quando, no caso, já existia maioria de votos para a sustentação de inconstitucionalidade das doações empresariais para campanhas políticas.

Outro exemplo, é o RE 188083, que chegou no STF em 9 de fevereiro de 1995. Em 18 de maio de 2006, o ministro Eros Grau solicitou vista do processo, voltando para o julgamento apenas em 11 de novembro de 2014, sendo julgado em 05 de agosto de 2015. Nesse caso, o pedido de vista gerou uma lentidão de oito anos dentro de um universo de duas décadas de duração.

Como observa Diego Werneck e Ivar Hartmann6 :

(...) o mecanismo de vista parece ser um dos meios pelos quais a lentidão potencial se fará concreta neste o naquele caso. As vistas podem contribuir para aumentar em muitos anos, às vezes, décadas a duração de processos específicos.

Na visão dos autores, o III Relatório do Supremo em Números: “(...)o Supremo e o tempo(...)” “(...) revela um tribunal sem prazo para decidir e sem regras ou padrões claros que expliquem o momento específico deste ou daquele processo7”.

Falcão trata o descumprimento dos prazos processuais como um dos fatores ensejadores de insegurança jurídica. Para o autor, a insegurança jurídica é também provocada pela inexistência de responsabilização dos ministros, quando estes não cumprem o próprio regimento interno8. Conclui, portanto, que a “(...) banalização dos prazos legais acaba transferindo o pedido de vista em verdadeiro e antidemocrático poder individual de veto do ministro do Supremo”, permitindo ao “Supremo, como colegiado, e aos ministros individualmente, escolherem o que julgar, quem e como.9 

3.  A PEC 53/15 e o STF: quem limita quem?

A ausência de regras ou padrões claros sobre o pedido de vista, bem como, a falta de uma sanção para o descumprimento do prazo estipulado no regimento interno, levaram a propositura da proposta de emenda à constituição 53, de 2015, que acrescenta o inciso XVI10 ao artigo 93 da Constituição Federal11, para fixar prazo de vista de dez dias nos processos em trâmite nos tribunais.

Segundo a proposta, é facultado aos integrantes dos tribunais pedir vista dos autos de processo judicial em curso, devendo devolvê-los no prazo improrrogável de dez dias, contados da data em que os recebeu em seu gabinete para que se dê prosseguimento ao julgamento. Transcorrido o prazo, sem que tenham sido devolvidos os autos, todos os processos, pautados ou apresentados em mesa para julgamento no respectivo colegiado, com exceção de mandados de segurança e habeas corpus ficarão sobrestados até que seja retomado o exame do processo suspenso pelo pedido de vista.

Como um dos fundamentos da proposta, merece destaque a alegação de suposta violação do princípio da duração razoável do processo12, e o entendimento de que “a jurisdição não deve ser apenas prestada pelo Estado por conta do direito de ação, mas deve ser tempestiva e adequada, com o escopo de atingir a efetividade do direito postulado em cada demanda”13.

Recentemente14, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade da proposta. Durante a sessão, o deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA) lembrou que, em várias ocasiões, o Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a uma decisão sobre processos, inclusive com voto da maioria dos ministros, mas um pedido de vista impede a conclusão do julgamento. “Esse expediente pode ser usado para impedir uma decisão do Supremo, por exemplo, por um ministro que é contrário a uma medida”15.

No entanto, na mesma sessão, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO) afirmou que a PEC pode sim representar uma interferência em outro poder, no caso o judiciário, o que não seria permitido a uma PEC. “Já adianto meu voto contrário a essa medida”16

O Supremo Tribunal Federal está presente no cenário político nacional, tendo decidido controvérsias políticas relevantes, como, por exemplo, o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo17, a interrupção da gravidez de fetos com anencefalia18 e reconhecendo a constitucionalidade de políticas de ação afirmativa por critérios raciais19 em vestibulares20.

Por mais dissenso que estas decisões possam ter gerado (e ainda geram), fato é que, o entendimento do STF nesses casos permanece vigente e como a última palavra do Poder Judiciário sobre o tema. Essa prerrogativa de possuir a “última palavra” sobre controvérsias políticas relevantes levou a alguns juristas a classificar esse fenômeno como “Supremocracia”: “(...) caracterizado como um cenário no qual o poder de resolver em conflitos políticos e morais sai das esferas majoritárias e passa a se concentrar nas mãos do Supremo”21.

A literatura sobre o tema aponta uma mudança na presença política do STF, saindo da marginalidade para a centralidade, podendo ser explicada pela combinação de amplos poderes conferidos pela Constituição e crescentes demandas sociais e institucionais para que o STF utilize esse poder22.

Entretanto, como aponta Werneck e Ribeiro: 

O comportamento dos atores externos ao tribunal e os poderes que lhe foram conferidos pelo texto constitucional são fatores importantes, mas insuficientes para explicar o papel atual do STF na vida nacional. É preciso considerar o quanto interpretações constitucionais, expressas em votos de ministros do STF, foram decisivas para a expansão do poder do tribunal 23.

Como observa os autores, o eloquente reconhecimento do poder exercido pelo STF do seu próprio poder é manifestado pelo ministro José Celso de Mello, quando este observou que o tribunal é um poder constituinte permanente24, o que “(...) equivale a dizer que o STF é copartícipe, junto do constituinte de 1988, da tarefa de definir as estruturas constitucionais básicas do país- incluindo, portanto, o próprio poder do tribunal” 25. 

Concluem então pelo poder do STF em interpretar em última instância, o alcance de suas próprias competências; “(...) dotando a si próprio de uma decisiva margem de manobra para influenciar as condições da sua participação política”26.

São vários os exemplos que demonstram este aspecto expansionista de atuação do STF. O Tribunal modificou o seu entendimento consolidado em 1989 sobre o mandado de injunção. À época, no MI 10727, a maioria dos ministros28 entendeu que, no caso de omissão legislativa violadora de conteúdos constitucionais, a decisão do Supremo serviria apenas para notificar, oficialmente, o órgão competente da sua omissão. Como aponta Werneck e Ribeiro:

(...) o ministro Moreira Alves defendeu a tese de que qualquer outra interpretação deste instituto significaria conceder ao Supremo (i) poderes legislativos (caso se criasse a regra faltante, ainda que provisoriamente, até a manifestação do Congresso); ou (ii) o poder de sancionar o Congresso por não ter legislado29.

Esse entendimento mudou em 2007, quando o STF julgou diversos mandados de injunção coletivos sobre direito de greves de servidores públicos. Um caso emblemático, foi o MI 67030, que começou a ser julgado em 2003. Como aponta Werneck e Ribeiro:

Na época, o relator, ministro Maurício Corrêa, observou que “não pode o Poder Judiciário, nos limites da especificidade do Mandado de Injunção, garantir ao impetrante o direito de greve”, pois, se o fizesse, “substituir-se-ia ao legislador ordinário”. Em um voto de apenas duas páginas, o ministro Corrêa se limitou a declarar a omissão do Poder Legislativo, simplesmente reiterando a jurisprudência firmada no MI 107, quase 15 anos antes. Contudo, em razão de um longo pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, o julgamento do MI 670 só veio a continuar anos depois. Já em 2007, uma composição quase inteiramente renovada do tribunal decide se afastar do antigo leading case e considerar que o STF deveria, ao decidir o mandado de injunção, indicar quais regras seriam provisoriamente aplicáveis à greve dos servidores públicos, até que o Congresso se manifestasse sobre o tema.

Outro exemplo de expansão da atuação do Tribunal ocorreu na mudança de entendimento sobre a possibilidade de controle prévio de constitucionalidade de propostas de emenda à constituição, através de mandados de segurança impetrados por parlamentares. Em 1980, o STF fixou entendimento31 no sentido da impossibilidade de controle de constitucionalidade prévio, impossibilitando o Judiciário de analisar a compatibilidade do projeto de lei ou de emenda à constituição durante o processo legislativo. Entretanto, o ministro relator Moreira Alves criou um canal para o impedimento de propostas de emendas que contrariem as cláusulas pétreas, conferindo aos parlamentares o direito individual de participar de processos legislativos que respeitem as disposições constitucionais. Esse entendimento ficou claro no MS 21.64832 , onde a maioria dos ministros decidiram pela possibilidade de parlamentares impetrarem mandados de segurança em face de propostas de emendas à constituição que, supostamente, sejam violadoras de cláusulas pétreas.

A justificativa do STF pauta-se na necessidade de controlar o processo legislativo, devendo, este, respeitar os preceitos constitucionais. Para o Tribunal, não se trata da criação de um controle prévio de constitucionalidade, e sim, da preservação e garantia das cláusulas pétreas, podendo o STF entrar no mérito do projeto à emenda, desde que este seja passível de violação de normas constitucionais.

Diante dessa premissa expansionista de interpretação das normas de competência do Tribunal, algumas perguntas ganham especial relevância: i) será que a proposta de emenda à constituição 53/15 seria passível de controle do mérito pelo STF? ii) uma vez aprovada a proposta, o Tribunal aceitaria o novo prazo para devolução do processo?

Alguns possíveis argumentos podem ser levantados e, talvez, até utilizados pelos ministros, em um futuro não muito distante, para a não observância da proposta (uma vez aceita). A solicitação de vista de um processo, geralmente, decorre da complexidade do tema tratado pelo Tribunal, o que, em tese, demandaria do ministro um tempo maior para estudar o processo, bem como escutar a opinião de especialistas no assunto, realizações de audiências públicas, etc.

Um possível argumento, que inviabilizaria o prazo de 10 dias estipulado pela proposta à emenda constitucional, decorre do fato do STF ter assumido uma posição relevante no processo político decisório do País, julgando, portanto, casos de alta complexidade técnica e de grande repercussão social, o que, em tese, demandaria dos ministros um maior rigor e estudo sobre o tema, inclusive, com a participação dos setores responsáveis ou afetados pelas decisões.

Outro argumento passível de ser utilizado pelo Tribunal e já levantado na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania é com relação à separação de poderes33, ou melhor, ao desrespeito à separação. Neste ponto, seria cabível uma discussão sobre a interferência do Poder Legislativo na atuação, independente, do Poder Judiciário, o que, por sua vez, justificaria, por exemplo, a impetração de um mandado de segurança por um parlamentar em defesa das cláusulas pétreas, mais especificamente, no que diz respeito à separação de poderes (art. 60 § 4º inciso III) ou à declaração de inconstitucionalidade da medida (caso aprovada a proposta) pelos ministros por afronta a separação de poderes.

Como elemento central da discussão, estaria a autonomia do Poder Judiciário em poder decidir com independência e sem interferência de outros órgãos. Esse argumento pode ser reforçado com outros dispositivos constitucionais, como o fato de ser de competência privativa dos tribunais a elaboração dos seus regimentos internos, com a observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo, ainda, sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos34.

Neste sentido, e dentro de uma perspectiva de um constitucionalismo de realidade, essa autonomia decisória35 resulta no fato do poder legislativo não ser capaz de interferir diretamente nas decisões que estejam inseridas no âmbito de competência de do Poder Judiciário, como no caso da prerrogativa do tribunal em elaborar o seu regimento interno.

Como analisado por Falcão, “modelos constitucionais são prescritivos e não descritivos”, sendo prescritivos do “dever-ser, e não necessariamente descritivos do ser”. Logo, a prescrição clássica da separação de poderes “(...) é insuficiente para prever as estratégias formais e informais para superar as dificuldades de fazer com que o poder estatal seja alocado de acordo com as suas próprias preferências”36 .

A premissa adotada é de que a doutrina formalista da separação de poderes é pautada apenas para a descrição e fixação interpretativa das competências decisórias formalmente estabelecidas no texto constitucional, sendo insuficiente para compreender a complexidade das relações entre os Poderes do Estado.

O prazo estipulado na proposta de emenda, em tese, serve como um exemplo da complexidade das relações entre os Poderes do Estado. De um lado, está o Legislativo tentando impor uma limitação a atuação do Poder Estatal, e de outro, está o Judiciário que não quer internalizar os custos da decisão do Legislativo. Esse processo de internalização é que Falcão chama de repartição simétrica dos custos gerados pela atuação estatal, que, em última análise, “importa na possibilidade de que um poder veja implementadas suas decisões pelos outros dois37”.

A natureza das relações entre os poderes se transformam em verdadeiras arenas competitivas em busca de quem usará, e como, a coerção legítima do Estado.38 Para o autor, os poderes competem em três arenas interligadas: i) a da soberania externa e do uso da força interna; ii) a das políticas públicas; e iii) a da gestão administrativa de ambas. Trata-se, portanto, de um jogo de soma zero, em que um ganho de um jogador representa necessariamente a perda para outro jogador39.

Nessa concepção, a competição em torno da limitação trazida pela proposta de emenda à constituição é travada dentro da arena da soberania externa e do uso da força interna, ou seja, a desarmonia entre os poderes ocorre no campo da autonomia decisória, um poder não pode influenciar as decisões que estejam inseridas no âmbito de competência de outro poder e no campo da repartição simétrica dos custos, ou seja, na possibilidade de um poder ver suas decisões implementadas pelos outros. Em outras palavras, o legislativo em tese, não poderia influenciar decisões que estejam no campo da autonomia decisória do judiciário, como no caso da prerrogativa de elaborar o seu regimento interno e por consequência, o legislativo não poderá ver sua decisão implementada pelo judiciário (repartição simétrica dos custos).

No fim, a pergunta que fica é: Será que a PEC 53/15 entrará em vigor, ou se caso entre, será que o STF irá julgá-la inconstitucional? Quem limita o Supremo? 

4.  Conclusão 

Os dados obtidos através das pesquisas não mentem. De fato, em alguns casos, pedidos de vistas realizados por ministros do Supremo acarretam em vários problemas para os interessados e para a coletividade (a depender da matéria julgada), acarretando morosidade para o processo decisório e implicando em um desrespeito ao regimento interno do Tribunal que estipula um prazo para a devolução. Não é razoável que um pedido de vista dure duas décadas, sobrevivendo a aposentadoria de inistros.

A emenda constitucional 45/04 trouxe a preocupação do constituinte derivado em relação à duração razoável do processo, insculpindo o inciso LXXVIII40 ao artigo 5 º da Constituição, assegurando a todos, não só a duração razoável do processo, como também meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Neste sentido, é inegável e louvável a proposta de emenda à constituição 53/15, que assegura um meio pelo qual seja exercida a celeridade processual nos tribunais, em especial no Supremo, entretanto, ela chega com uma proposta de solução do problema da morosidade do julgamento dos processos, mas também cria outro problema, será que os ministros irão respeitá-la, ou até mesmo, deixarão ela entrar em vigor?

O desafio aqui dentro de uma perspectiva de constitucionalismo de realidade, fugindo, portanto, do formalismo doutrinário constitucional por muito tempo vigente é: Qual a compatibilidade de um estado de direito onde precisamos da pergunta quem limita quem? 

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1 III Relatório do Supremo em Números: “o Supremo e o tempo”, publicado pela a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, p. 93. Disponível em: clique aqui acesso em 20/11/16.

2 Como aponta o III Relatório do Supremo em Números, nem sempre o processo é parado por um único pedido de vista. No caso da ADI 1229, houveram vários pedidos sucessivos de ministros diferentes. A ação foi protocolada em 1995, recebendo o seu primeiro pedido de vista pelo ministro Sepúlveda Pertence no mesmo ano. Em agosto de 2007, o ministro Eros Grau solicitou vista e em 2010 o pedido foi feito pela ministra Carmen Lucia, sendo devolvido em 2011, tendo o seu pedido de liminar julgado em 2003, ou seja, depois de 18 anos depois do início do processo e com mais de 15 anos de vista. 

3 III Relatório do Supremo em Números: “o Supremo e o tempo” publicado pela a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, Op. cit., p. 97.

4 No STJ, os pedidos de vista levam quase 3 anos. De 2008 a 2014, seis mil processos foram interrompidos dessa forma no Tribunal. Disponível em: clique aqui. acesso em 20/11/16.

5 A possibilidade de solicitar vista está disposta no artigo 134 do Regimento Interno do STF, que assim dispõe: Art. 134. Se algum dos ministros pedir vista dos autos, deverá apresentá-los, para prosseguimento da votação, até a segunda sessão ordinária subsequente.

A prática de não respeitar o prazo de devolução do processo, estipulado no regimento interno com base no artigo 555 § único do antigo Código de Processo Civil, levou a edição pela então presidente min. Maurício Correa da resolução 278/03 que criou um mecanismo de controle do descumprimento do prazo do pedido de vista (art.1º § 2º).

O § 2º do art. 1º conferia a possibilidade do presidente do Tribunal ou da turma requisitar os autos e reabrir o julgamento do feito na segunda sessão ordinária subsequente, nos casos de descumprimento do prazo de devolução. Portanto, a partir de 2003, a solicitação de vista possuía um prazo de 10 dias (art. 1º caput da resolução), prorrogável automaticamente por mais dez dias e depois, mediante justificativa (§ 1º da resolução).

Em 2006, a então presidente min. Ellen Gracie editou a resolução 322/06, que revogou o § 2º da resolução 278/03, retirando a possibilidade do presidente do tribunal ou da turma de requisitar os autos daqueles processos, em que o pedido de vista tenha extrapolado o prazo de devolução e revogando a possibilidade de prorrogação mediante justificativa. 

6 ARGUELHES, Diego Werneck e HARTMANN, Ivar A. A irrelevância do regimento interno do STF. 

7 Id.

8 FALCÃO, Joaquim. O Supremo, a Incerteza Judicial e a Insegurança Jurídica. Journal of Democracy em português, vol. 5, número 2, outubro de 2016, p. 91.

9 Id.

10 Art. 1º O art. 93 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte inciso XVI: 

“Art. 93. .................................................................... ..................................................................................... XVI - aos integrantes dos Tribunais é facultado pedir vista dos autos de processo judicial em curso, devendo devolvê-los no prazo improrrogável de 10 (dez) dias, contados da data em que os recebeu em seu

Gabinete, para que se dê prosseguimento ao julgamento; transcorrido este prazo sem que tenham sido devolvidos os autos, todos os processos, pautados ou apresentados em mesa para julgamento no respectivo Colegiado, com exceção de mandados de segurança e habeas corpus ficarão sobrestados até que seja retomado o exame do processo suspenso pelo pedido de vista”. 

11 Autor deputado Glauber Braga PSB/RJ. 

12 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação

13 Câmara dos deputados. Proposta de Emenda à Constituição de 2015. Acrescenta o inciso ao art. 93 da Constituição Federal, para fixar prazo de vista nos processos em trâmite nos tribunais.  Disponível em: clique aqui acesso em: 21/11/16. 

14 Em 16/11/16

15 CCJ aprova PEC sobre prazo de vista de processos judiciais. Disponível em: clique aqui. acesso em 21/11/16 

16 Id.

17 ADPF 132 (decidida em 5/5/11)

18 ADPF 54 (decidida em 12/4/12) 

19 ADPF 186 (decidida em 26/4/12) 

20 ARGUELHES, Diego Werneck e RIBEIRO, Leandro Molhano. Criatura e/ou Criador: transformações do Supremo Tribunal Federal sob a Constituição de 1988. Disponível em: clique aqui.  acesso em 22/11/16 

21 VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista Direito GV, v. 4, n. 2, p. 441-464, 2008. 

22 Neste sentido ver: ARGUELHES, Diego Werneck e RIBEIRO, Leandro Molhano. Op. cit.

23 Id. 

24 Id.

25 Id.

26 Id.

27  MI 107-3/DF, rel. min. Moreira Alves p. julgado em 23/11/89.

28 Vale ressaltar que o ministro Sepúlveda Pertence considerou a possibilidade de criação de uma regra provisória aplicável para a parte que alegou a omissão legislativa. Segundo o ministro pertence: “A idéia é fértil, não há dúvida: acertada a existência de um direito constitucional dependente de regulamentação, o processo seria paralisado e ao Supremo Tribunal caberia apenas decidir aquela questão prejudicial definindo a norma, no caso concreto; norma, porém, que, para evitar a repetição e a contradição, se tornaria de eficácia erga omnes para a decisão, na justiça competente, de todos os casos similares” (Voto vencido na Questão de Ordem no MI 107-3/DF, p. julgado em 23/11/89 p. 70). 

29 ARGUELHES, Diego Werneck e RIBEIRO, Leandro Molhano. Op. cit.

30 MI 670/ES. Rel. min. Maurício Corrêa. Julgado em 25/10/07.

31 MS 20.257.Rel. min. Moreira Alves. Julgado em 8/10/80

32 MS 21.648. Rel. min. Octavio Gallotti. Julgado em 5/5/93

33 Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

34  Art. 96. Compete privativamente:

I - aos tribunais:a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;  

35 Neste sentido ver: FALCÃO, Joaquim. LENNERTZ, Marcelo.

36 Id.

37 Id.

38 Neste sentido ver: FALCÃO, Joaquim. LENNERTZ, Marcelo. Id.

39 Soma-Zero. Disponível em: clique aqui acesso em: 21/11/16.

40 LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

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ARGUELHES, Diego Werneck e HARTMANN, Ivar A. A irrelevância do regimento interno do STF.

ARGUELHES, Diego Werneck e RIBEIRO, Leandro Molhano. Criatura e/ou criador: transformações do Supremo Tribunal Federal sob a Constituição de 1988. Disponível em: clique aqui.  acesso em 22/11/16

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: clique aqui acesso em: 21/11/16.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Regimento Interno do STF. Atualizado até novembro de 2012. Brasília: STF. Disponível em: clique aqui acesso em: 21/11/16.

Câmara dos deputados. Proposta de Emenda à Constituição nº , de 2015. Acrescenta o inciso ao art. 93 da Constituição Federal, para fixar prazo de vista nos processos em trâmite nos tribunais.  Disponível em:clique aqui acesso em: 21/11/16

CCJ aprova PEC sobre prazo de vista de processos judiciais. Disponível em: clique aqui acesso em 21/11/16

FALCÃO, Joaquim. O Supremo, a Incerteza Judicial e a Insegurança Jurídica. Journal of Democracy em português, vol. 5, número 2, outubro de 2016. 

FALCÃO, Joaquim. LENNERTZ, Marcelo. Separação de Poderes: Harmonia ou Competição?

III Relatório do Supremo em Números: “o Supremo e o tempo”, publicado pela a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, p. 93. Disponível em: clique aqui acesso em 20/11/16. 

No STJ, os pedidos de vista levam quase 3 anos. De 2008 a 2014, seis mil processos foram interrompidos dessa forma no Tribunal. Disponível em: clique aqui. acesso em 20/11/16.

Soma-Zero. Disponível em: clique aqui acesso em: 21/11/16. 

VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista Direito GV, v. 4, n. 2, p. 441-464, 2008

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*Felipe Herdem Lima é mestre em Direito em Regulação, pós-graduado em Direito Empresarial e graduado pela FGV Direito Rio. Membro da Comissão de Direito Empresarial e professor da FGV Direito Rio.

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