Interessante decisão foi proferida pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região quando confirmou in totum a sentença que deferiu pedido de prorrogação de licença-gestante. No caso, a criança nasceu prematuramente, após 27 semanas e dois dias de gestação e necessitou cuidados especiais desde o seu nascimento. Daí que a genitora, pela vontade da lei, teria que compartilhar da convivência no primeiro período de vida de seu filho, garantindo sua saúde e bem-estar.
Foi clara e incisiva a desembargadora Federal Sigmaringa Seixas: "Ademais, a falta de previsão legal não impede o Poder Judiciário de garantir aos jurisdicionados os direitos constitucionais, no caso a convivência familiar do recém-nascido, tão importante neste estágio inicial de sua vida".1
Muitas vezes, principalmente o leigo em Direito, tem a lei como um referencial que atinge única e exclusivamente os dizeres contidos em seu texto. Nada mais equivocado nesta cerrada delimitação literal. Se assim fosse, atenderia os limites do vernáculo e não a pessoa a quem é dirigida. De acordo com esse pensamento, o Direito seria um exercício matemático, exato, compactado, onde nada mais pode ser acrescido ou excluído à norma legal.
A lei, no entanto, para cumprir sua tarefa social, deve ter elasticidade suficiente para abrigar situações que não foram contidas em seu texto originário, mas a ele são atreladas em razão do fio condutor interpretativo, estabelecendo verdadeira vis atractiva.
A interpretação da lei, calcada na ciência da Hermenêutica, é a arte de buscar no texto legal, por mais singelo que seja, o conteúdo difuso da vontade legislativa, que não foi incorporado nas palavras que formaram o texto. Faz-se, portanto, uma nova construção no interior do próprio texto, edificando-o para que possa, dentro dos parâmetros sociais almejados, extrair a melhor e a mais condizente voluntas legis.
Quanto maior for a ampliação da lei mais abrigará direitos e pretensões postulados pela sociedade, sua destinatária final. Daí falar-se que a lei, dentro dela própria, vem revestida de uma infindável gama de soluções em seu núcleo invisível que muitas vezes o mais experiente exegeta não consegue vislumbrar.
Mas, para tanto, há necessidade de que o pensamento interpretativo tenha como alicerce e ponto fulcral os princípios e direitos assegurados constitucionalmente. Desta forma, o intérprete conseguirá estender a lei para aproximá-la de um direito não previsto expressamente, mas existente na dogmática maior, dando a ele conteúdo razoável de aplicabilidade.
No instante em que se visualizou, no caso relatado inicialmente, a existência de um direito e sua delimitação temporal circunscrito ao período de licença-gestante, construiu-se a interpretação mais adequada à hipótese, qual seja a prorrogação da referida licença para além dos seis meses com a finalidade de conferir ao recém-nascido os cuidados especiais que necessitava por ter nascido prematuramente.
Ora, a interpretação feita é totalmente compatível com a responsabilidade que o Estado confere à família para cuidar integralmente da criança desde a sua primeira faixa etária e conferir a ela as melhores condições de bem-estar e saúde. Além do que o princípio da dignidade da pessoa humana, dogma constitucional intransponível, garante ao homem, em todas as fases da sua vida, desde a mais tenra infância até a idade mais avançada, o direito de viver com conteúdo e intensidade em todas elas.
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1 Servidora que teve parto prematuro consegue prorrogar licença-maternidade
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