A MP 881/19 – chamada de “MP da liberdade econômica” –, aprovada pelo Congresso Nacional a toque de caixa, traduz um emaranhado de reivindicações de diversos setores do mercado. O texto, vale observar, desvinculou-se quase que totalmente da proposta que um grupo de afamados juristas elaborou meses atrás, pouco antes de a MP ser editada pelo Executivo.
Basta lançar um olhar ligeiro para um dos vinte breves artigos do texto aprovado pelo Legislativo, para notar que o diploma é bastante amplo. O texto pretende regular a aplicação e interpretação do “direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho nas relações jurídicas que se encontrem no seu âmbito de aplicação e na ordenação pública, inclusive sobre o exercício das profissões, comércio, juntas comerciais, registros públicos, trânsito, transporte e proteção ao meio ambiente” (§1º, do art. 1º), sem falar dos rápidos toques de bola dados sobre a legislação de fundos de investimento, digitalização de documentos, horário e regime de trabalho, funcionamento de cartórios, entre outros temas.
Há, entretanto, no meio desse mosaico de temas, algumas boas coisas.
Um ótimo exemplo encontra-se no artigo 5º, que torna norma geral nacional a obrigação de realizar análise de impacto regulatório, previamente à “edição e alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários” dos serviços públicos. O assunto vale uma tese, mas a preocupação com a oitiva dos interesses privados no processo normativo (especialmente, mas não só, no caso das agências reguladoras) está absolutamente antenada com as tendências contemporâneas e, ouso dizer, é essencial, para evitar desatinos cotidianos dos gestores públicos.
Também louvável é a preocupação externada no art. 4º, com relação ao “abuso do poder regulatório”, em que pese as normas ali fixadas darem margem a muitas interpretações e possibilitarem um nível grande de insegurança em sua aplicação.
Aliás esse último ponto é o que mais me preocupa: a insegurança gerada pela aplicação das fragmentadas e imprecisas normas da nova lei. É bem possível que a lei venha estimular mais conflitos e insegurança jurídica do que gostaríamos.
Os brasileiros que acreditam firmemente na força motriz e nos benefícios socioeconômicos da livre iniciativa reclamam constantemente da necessidade de dotar nosso sistema de maior estabilidade e maior clareza, qualidades que não parecem tão evidentes no diploma legal nascente.
Ademais, a preocupação de conter o “abuso” deveria ser endereçada não somente ao regulador ou administrador, mas também aos controladores. Ministério público, tribunais de contas, fiscais em geral e o judiciário precisam encontrar limite a sua discricionariedade tanto quanto o “poder regulatório”.
Jogo jogado, agora nos resta torcer!
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