A MP 881 – chamada de MP da Liberdade Econômica –, aprovada pelo Congresso Nacional e em vias de se tornar lei pela sanção presidencial, trouxe várias inovações importantes para o sentido geral de busca pela desburocratização que o Brasil tanto precisa.
Um dos pontos é o direito de toda pessoa física ou jurídica desenvolver atividade econômica de baixo risco sem a necessidade de quaisquer atos públicos de liberação, os conhecidos alvarás, licenças, autorizações, cadastros, inscrições, permissões e outros análogos que tanto dificultam a vida dos empreendedores brasileiros, expedidos por quem quer que seja.
As atividades de baixo risco são aquelas que não oferecem perigo de dano à sociedade no que se refere a incêndios, saúde e meio ambiente, considerando também critérios da legislação municipal, e que, em uma primeira regulamentação (resolução 51 do CGSIM, de 11 de junho de 2019) alcançam aproximadamente o número de 287, entre 1.331, ou o correspondente a 21% do total de atividades, segundo a famosa CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas).
Ao longo dos anos de implementação do processo integrado de abertura de empresas previsto na lei 11.598, de 2007, e na Lei Geral da MPE, órgãos e entidades envolvidos foram classificando como de baixo risco aqueles empreendimentos “sem interesse” para os respectivos campos de competência fiscalizatória.
Com isso, a maioria das 1.331 atividades passaram a se submeter a determinado rito de “licenciamento”, ainda que fosse a simples autodeclaração com efeito de liberação para o início de operações, inclusive com o uso da figura negativa do “alvará provisório” que se eternizava.
Em outras palavras, a ausência da pura e simples previsão de dispensa de autorizações ou licenças aumentou a burocracia, com efeitos perversos também no custo dos empreendedores. Ora, se há intervenção do ente para autorizar ou licenciar algo, se incentiva a cobrança indiscriminada de taxas pelo exercício do poder de polícia, ainda que chamadas de “cadastros” e “inscrições”.
O fato é que, no Brasil, como excelente texto de Hugo de Brito Machado Segundo, “regularizar é pagar”, sendo que a mera existência de órgão de fiscalização e a mera possibilidade de algum dia ela ser exercida não é suficiente para justificar a cobrança de taxa (“Regularizar é pagar: ideia que reflete a distorção das taxas de polícia no Brasil“, Consultor Jurídico, 26/6/19).
Realmente, essa situação está disseminada por todos os cantos, inclusive quanto aos carros, em relação aos quais os excessos de arrecadação, muitas vezes bilionários, são carreados aos tesouros estaduais, como se impostos fossem, de forma irregular e ilegal.
Como escreve Hugo, o Estado não pode usar o seu poder para limitar direitos ou liberdades se não for em benefício da segurança, da saúde e do bem estar públicos. Utilizando indevidamente esse poder, continua ele, estará apenas se locupletando dos particulares, “criando dificuldades para vender facilidades, ainda que aparentemente ‘dentro da lei'”.
Portanto, a MP da Liberdade Econômica trouxe ótima novidade nesses tempos bicudos ao dispensar os empreendedores menores que desempenham atividades mais simples de custos burocráticos e financeiros desnecessários.
Falta agora aprofundar a discussão sobre manter ou não a cobrança de taxas naqueles casos nos quais o “licenciamento” decorre do simples fornecimento de dados e de declarações dos interessados, quase um simples cadastro, com dispensa de vistorias prévias ao início das atividades.
Também deve ser analisado o valor dela, considerando a introdução em mais de 3.000 municípios do processo eletrônico (vide o Portal da REDESIM), com ampla economia de recursos face ao processo físico e presencial anterior.
Afinal, as taxas pelo exercício do poder de polícia não devem ser desvirtuadas para gerar receitas muito superiores ao custo dos serviços públicos específicos, como tem acontecido em larga medida.
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*José Constantino Bastos Jr. é advogado, ex-secretário nacional de racionalização e simplificação.